UM

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Jimin | 🐥

Eu sabia que com o acidente de carro minha vida nunca seria a mesma novamente. Até por que minha mãe não estava mais aqui comigo.

Mas que fosse mudar tanto a ponto de me fazer mudar de cidade e ainda mais, que eu fosse morar com meu pai. Aí já parecia loucura demais. Morar com uma pessoa que eu não conhecia, que me abandonou quando criança sem olhar para trás e viver na casa de sua nova família perfeita?

Isso nunca poderia ser uma boa ideia.

Mas de acordo com minha equipe médica, eu não tinha condições físicas ou psicológicas para viver sem auxílio de alguém próximo. Como se meu pai fosse alguém próximo. Alô! Ele me deixou para trás para viver sua vida perfeita em Seul, será que ninguém entendeu?
Acontece que todos julgavam que minha mentalidade estava muito fragilizada por causa do acidente, as sequelas e as perdas. Principalmente por causa do que aconteceu no centro de reabilitação.

Eu estava a quase dois anos internada após um ano em coma. Fazia milhares de cirurgias periódicamente para tentar "amenizar o estrago" no meu corpo, tentando fazê-lo ficar um pouco mais "normal". Eu não conseguia me mexer direito e os médicos diziam que era improvável que eu andasse novamente. Eu sentia tanta, mais tanta dor e não tinha minha mãe ali para me ajudar a suportar aquele momento. Eu não sabia quando eu ia sair dali, se eu fosse sair algum dia.

Foi assim que cai em um estágio muito elevado da depressão e tentei acabar com a minha vida.

A primeira vez foi no banho. Eu não conseguia me mexer direito então tinha que tomar banho com a ajuda de enfermeiras. Em uma dessas ocasiões a enfermeira saiu para bicar um de meus remédios no quarto e eu aproveitei a oportunidade de estar sozinha. Me afundei na banheira. No começo foi horrível, eu queria subir mas de novo mas não conseguia me mexer. Meu pulmão, garganta e nariz queimavam. Mas então eu começei a ficar com sono, muito sono. Eu sabia que estava morrendo e estava mais tranquilo. Aquilo ia acabar, eu não sentiria mais dor.

Mas então algo me puxou para cima e a dor veio a tona novamente. Com força total. A enfermeira havia me tirado de lá.

É claro que ela contou a minha equipe médica e a partir daí meu banho deveria ser acompanhado de duas enfermeiras.
Isso só piorou a situação. Eu me sentia sendo vigiado vinte quatro horas por dia. Não tinha paz. Todos me olhando com aqueles olhos cheios de piedade e pesar. Eu odiava aquilo. Até o dia que tive minha segunda chance.

Era hora do almoço. A enfermeira tinha posto minha comida na minha frente junto a bandeja com os talheres quando avisou que meu pai tinha voltado para me ver depois de ter ido a minha antiga cidade resolver os problemas e papeladas da minha mudança. Ela havia saído para conversar com ele -- provavelmente para contar a ele sobre minha tentativa de suicídio -- quando me vi enfim sozinha novamente. Na hora eu nem pensei muito, eu só vi a faca e bem...

Segundos depois haviam médicos e enfermeiras por todo o lado. Foi uma confusão, todos correndo e gritando. Mas eu só conseguia ver o meu pai. Aquele olhar. Eu nunca vou esquecer aquele olhar. Ele só ficou lá parado, me olhando com aqueles grandes olhos cor de mar, olhos iguais aos meus, o única verdadeiro traço que eu tinha dele.

Eu não sou mais um suicida. Eu não sou mais aquela pessoa. Agora eu estava bem, foi só uma fase ruim e me arrependo. Vejo agora que era errado e aquela não era a alternativa. Aquilo não era uma alternativa. O que minha mãe diria se estivesse aqui? Ela diria para eu continuar lutando, por mais difícil que fosse. Por que eu era forte, como os Park eram. E o olhar do meu pai nunca me abandonou também.

Mas desde então eu fui dado, graças ao meu pai, como mentalmente incapaz de cuidar de mim mesmo e tomar minhas próprias decisões. Por isso eu estou sendo obrigado a morar com ele e sua nova família perfeita da Barbie e deixar lara trás tudo o que eu começo e tinha, todos os amigos, memórias, casa, alegria e sonhos. Ótima maneira de começar um relacionamento.

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