Capítulo 3

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Capítulo 3

Daniel assistiu Samuel ficar menor e menor no espelho retrovisor. A figura logo se tornou pouco mais que um ponto à distância, apenas para desaparecer na linha de calor em um piscar de olhos.

"Hoje o dia foi feito para andar".

- Sim, certo - Daniel murmurou para o carro vazio e empurrou outro pendrive no aparelho. Era mais fácil não pensar com a batida alta vibrando no interior do veículo, mas o cara desconhecido com o chapéu surrado continuava voltando na sua cabeça.

Motoristas e caminhantes ...

- É isso que somos? - Disse Daniel, embora as palavras fossem comidas pela música assim que saíram de seus lábios. Ele abaixou o volume, mas é claro que não havia resposta para sua pergunta.

Daniel olhou para a estrada à frente; ainda em linha reta como uma flecha, sem voltas ou curvas para distraí-lo, apenas um monte de quilômetros e muito tempo para sua mente ficar dando voltas.

"Só pra ver no fim da festa, como é que sapo voa" ....

- Essa porra de música! - Daniel gritou. - Sai da porra da minha cabeça. - Mas a tradicional fábula infantil onde um sapo foi para uma festa de aves no céu escondido na viola do urubu continuou rodando em sua cabeça até que Daniel foi forçado a aumentar o som novamente.

***

No momento em que o sol baixou no horizonte, Daniel já havia tirado o carro da estrada. Ele dormiu em carros o suficiente e a perspectiva de uma noite no banco de trás não o perturbou, mas a solidão o fez. Era exatamente o que ele achava que queria quando saiu de casa, mas a realidade da expansão vazia forçou um arrepio nele.

Daniel ficou ao lado do carro e fez xixi na terra vermelha. Ele inicialmente deu alguns passos para uma árvore distante, mas sua respiração ficou mais curta a cada passo longe do carro até que seu peito ficou tão apertado que ele precisou parar e voltar para a relativa segurança do carro. O fluxo diminuiu e Daniel examinou a crescente escuridão. Percorrera os becos de Belo Horizonte à meia-noite e dormiu sob os viadutos da avenida, então por que a vastidão da mata rala com arbustos raquíticos o assustava? Ele balançou a cabeça e foi até a traseira do carro.

Uma caixa de papelão com arroz de carreteiro, pão e cereais matinais estava ao lado de um isopor cheio de garrafas de água. Os pacotes de gelo derreteram há muito tempo, mas as garrafas ainda estavam surpreendentemente frias. Daniel engoliu o suficiente para sentir-se cheio e fechou o porta-malas com um ruído alto. O som o surpreendeu, mas foi rapidamente engolido pela noite invasora, com apenas o grito de resposta de uma cacatua restante.

O plano que ele formulara na cozinha de seu irmão era simples. Apenas encontrar um lugar para fugir de todas as merdas do passado e pensar, pensar de verdade. Pelo menos esse era o plano. Mais fácil falar do que fazer, decidiu Daniel, pegando o diário da bolsa e sentando-se no capô do carro.

Sua caneta bateu na página. Ele fez uma careta para as linhas azuis vazias. Bateu mais um pouco. Desesperado, Daniel decidiu rabiscar palavras aleatórias do dia, na esperança de que elas despertassem algo mais construtivo. Ele revirou os ombros e exalou. Quilômetros de terra vermelha, céu grande, calor, caminhões, várias palavras percorreram seus pensamentos e ele escreveu três palavras em uma coluna no meio da página.

 Quilômetros de terra vermelha, céu grande, calor, caminhões, várias palavras percorreram seus pensamentos e ele escreveu três palavras em uma coluna no meio da página

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O Coração do Sertão (Projeto CampNaNoWriMo) - CompletaOnde histórias criam vida. Descubra agora