Capítulo II.II: 01/05/1967 - O novo mundo

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Na noite do dia seguinte, em minha mão direita estava uma mala com meus lençóis e roupas. Tomei muito cuidado para guardar aquela garrafa enrolada dentro de uma jaqueta preta.

Apesar de ter me visto fazendo isso, Treccia não me questionou sobre a bebida que antes estava ali. Ela sempre parecia tão distante, bem mais que Icarus. A garota apenas perguntou quanto tempo eu ficaria lá e respondi que não sabia, mas que eu esperava que fosse o suficiente... apesar de também não saber o que ou quando seria o suficiente.

Todos já me aguardavam fora de casa.

Mama segurava o bebê dormindo em seus braços, ele já possuía quanto anos? 2...3? Eu não sou bom com datas ou qualquer outra contagem de tempo. Para falar a verdade, vindo de mim nenhum número é confiável.

Desci as escadas de madeira e passando pela porta verde da entrada da casa, caminhei até a calçada aonde o carro acinzentado estava estacionado. Giuseppe se ofereceu para segurar a minhas coisas e concordei com a cabeça, tentado não olhar nos curativos em seu rosto. Voltando o olhar a minha mãe, ela estava conversando com a mulher branca dentro do carro, sua expressão era a de sempre, séria e neutra.

Aproximei-me do veículo e ela andou em minha direção parando a minha frente.

Ela me abraçou com o seu braço direito, pois o outro mantinha sua outra cria dormindo perto de seu coração. Sua respiração estava calma, beijou-me a testa e sorriu. Eu devolvi o último gesto de forma discreta, seria nesse momento que mães dizem "eu te amo" e os filhos retribuem? Não sei contar quantas vezes ela já me disse essa palavra, mas não foram muitas. Sempre me pareceu mais fácil dizer isso para uma namorada que para a minha própria mãe, não é como se eu não a amasse, ou ela quem não me amasse. Sendo sincero não sei dizer o motivo desse "bloqueio", talvez seja uma retribuição direta a ela, porém eu sei que... vou me arrepender de não ter dito isso mais vezes algum dia:

— Eu... te amo mãe. — Disse para logo depois desviar os olhos e guardar os lábios dentro de minha boca por alguns rápidos.

— Tome cuidado... quando quiser voltar, estaremos aqui... — Me foi entregue um novo abraço e sorriso, ela andava até a calçada. Suspirei, pois não eram palavras que eu esperava.

Giuseppe guardava minha mala no banco traseiro, andei até próximo a ele e estendi o punho direito. Me notando, ele sorriu e se voltou a minha frente para retribuir com o seu punho dominante, o canhoto.

— Se precisar eu vou lá te buscar, baby boy. — Revirei os olhos e ele fechou a porta e se distanciou até a calçada.

Abri a porta da frente e me sentei do lado da motorista, que já ligava o carro sem se quer retirar as mãos do volante.

Naquele momento nada mais me surpreendia, encostei o cotovelo direito em alguma qualquer parte da porta do veículo e levei a mão deste mesmo braço ao meu queixo. Aparentemente, meu gesto chamou atenção da voz feminina:

— Você é como ele... desapegado a família e ao conceito do que ela é... mas pelo menos, você parece se esforçar a tentar se importar. — Me disse de queixo empinado, olhos fixos e expressão neutra, o carro começava a se mover. — Ontem, sabe dizer se agiu por vingança? Por raiva? Por ter sido o seu irmão? Por ter sido seu amigo? Ou, por não aceitar passar por aquela humilhação de ser rebaixado por seres inferiores ao que você é? No caso de todas as opções, a que mais me interessa é a última, você sabe bem o que você é?

—... — Eu não iria responder aquilo. Durante a primeira conversa eu já havia notado muito bem que ela é bem mais incomum do que eu imaginava, suas falas parecem sempre possuírem um tom de controle, sabedoria... e apesar de parecerem provocações, também podendo ser, durante todo o tempo a sensação que sinto é que ela está me estudando. — Você me seguiu?

Mythology: A Guerra PrimordialOnde histórias criam vida. Descubra agora