Um Encontro Inesperado

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Ao leste de Wigrifin um senhor aparentemente abatido, estava acocorado a margem de um límpido riacho a beira da orla, onde lavava seu velho rosto da poeira da estrada. Após encher as mãos e beber um pouco da água deliciosamente fresca, ouviu alguns passos quebrar o silêncio da mata fechada, olhou com as vistas cansadas procurando ver quem estava à espreita, mas nada viu. Então ergueu-se lentamente apoiado em seu bastão e caminhou seguindo o barulho que diminuía cada vez mais. A poucos passos de uma grande árvore, Ramir foi surpreendido por uma figura alta e pujante, este girou seu chicote no ar e disse:

- Ora ora seu velho inútil, achou mesmo que poderia libertar meus escravos e fugir de mim? Vai perder uma das orelhas para mostrar aos outros escravos o que acontece com fugitivos – Ameaçou o homem.

O agressor então balançou seu chicote e atacou uma das pernas do velho Ramir, que caiu de joelhos gritando com a dor lancinante do enorme corte que se abriu em sua perna.

- Por favor, não me machuque, nunca mais farei isso, muito menos tentarei fugir de você Lorde Brandon, eu prometo. Me perdoe – Implorava aos choros o velho senhor.

Brandon estava tão concentrado em punir o velho que não pode perceber um jovem a suas costas. Este estava descalço e vestia uma roupa simples e bem gasta pelo tempo, era magricela e tinha cabelos negros como carvão. O menino assustado com a cena, interviu ao ver tamanha crueldade:

- Pare com isso – Gritou o garoto apontando um pequeno galho de árvore para Brandon.

- Ora ora parece que terei um novo escravo, acha que pode me ferir com um pedaço de árvore menino? Não seja tolo.

Brandon então virou-se para o menino enquanto Ramir suplicava para que o garoto corresse dali:

- Ei garoto, fuja daqui, corra, por favor fuja".

- Fique calmo senhor, irei te salvar. Sou um grande mago – Respondeu o menino com um sorriso conciso.

- Ora, um mago? Mas que medo, devo correr? hahahaha – Caçoou Brandon

- Deixe este senhor em paz e não lhe farei mal – Ameaçou o menino com a voz serena.

- Hum! Este homem é minha propriedade garoto e logo você também será, mas caso seja um mago de verdade, faça logo uma magia e salve suas vidas insignificantes. Vamos! – Duvidou Brandon.

O pequeno garoto se concentrou por alguns segundos e pronunciou "esfera mística" e uma pequena faísca de luz se fez na ponta do galho seco, que emergiu em uma pequena bola dourada, que brilhava como o sol. Ao se mover na direção de Brandon a esfera irradiava uma luz cintilante, este surpreendentemente assustado tentou desviar seu musculoso corpo em vão, a esfera foi mais rápida e atingiu em cheio seu rosto gerando uma pequena explosão, Brandon caiu inconsciente. O garoto correu até o velho Ramir e o ajudou a levantar-se dizendo:

- Vamos fugir daqui! Ele despertara a qualquer momento – Disse o menino dando a mão para seu novo amigo.

- Hã? o que aconteceu aqui? mas como pode, quem é você menino? Perguntou Ramir Boquiaberto, pois nunca havia visto algo assim antes.

- Eu não sou um garoto não, sou um homem, já tenho dezesseis anos. Me chamo Zalmon e você senhor? – Respondeu o menino com um sorriso no rosto.

- Entendo, você me parece ser um bom homem Zalmon, muito obrigado por salvar minha vida, me chamo Ramir – Respondeu o homem pousando uma das mãos sob o cabelo bagunçado do jovem.

Algumas horas depois o jovem Zalmon e seu novo amigo Ramir seguiam tranquilamente pela estrada e se depararam com uma mulher, que montava um belo cavalo branco e, em sua bainha havia uma magnifica espada que reluzia as mais diferentes cores. A mulher de olhos mestiços e cabelos negros vendo o ferimento na perna de Ramir disse:

- Precisa de ajuda senhor? se não estancar esse sangramento, logo não terá mais forças para caminhar.

- Hã? – Disse Zalmon deslumbrado com a beleza da jovem mulher.

- Se tiver algum pedaço de pano me ajudaria muito donzela, qual seu nome?

A mulher desceu de sua montaria, tirou um tecido grosso de sua mochila e caminhou até Ramir.
- Me chamo Florença, sente-se naquela pedra, vou limpar seu ferimento.

Enquanto a guerreira limpava o ferimento de Ramir, Zalmon a olhava com curiosidade. A moça agia de forma perspicaz e não parecia ser tão mais velha que ele, sua pele estava muito limpa e seu cabelo bem arrumado, sua bonita armadura em couro negro a deixava ainda mais elegante.

- Olá, eu sou Zalmon, eu e meu amigo Ramir estamos indo para Narfell, quer vir com a gente? – Disse o Jovem com o rosto corado.

Florença olhou para o jovem magricela a sua frente, reparou em seus pés descalços e sujos, suas vestes finas e gastas e disse:

- Você precisa de uma roupa quente, se não logo vai congelar nesta neve.

A guerreira foi até seu cavalo, pegou um cobertor de lã quente e entregou ao jovem que a agradeceu e se cobriu rapidamente confortando o tremor do seu corpo gelado.

- Não estou indo para Narfell. Minha casa não fica muito distante daqui. Se quiserem podem passar a noite lá, arrumarei alimento e roupas novas para que sigam viagem sem morrerem de frio.

Os dois aceitaram prontamente a oferta da guerreira, já haviam caminhado sem descanso por horas e o sol azulado já se escondia no horizonte trazendo a noite escura e fria.

Em meio a poucas árvores a frente podia-se ver uma pequena casa de madeira com o teto coberto por uma palha bastante grossa.

- Chegamos! – Disse a guerreira.

Na casa havia apenas um cômodo, o chão também era coberto por palha para amenizar a friagem. No canto tinha uma cama simples e no centro uma pequena lareira. Florença foi até um baú, onde guardou sua magnifica espada e retirou uma panela que levou ao fogo para cozinhar alguns legumes.

A barriga do pequeno Zalmon fazia mais barulho que a forte ventania que rugia furiosa fora da pequena cabana. Enquanto o ensopado não estava pronto os recém conhecidos contavam sobre suas vidas. Ramir narrou sua vida inteira, revelou que sua família foi escravizada quando ele tinha apenas cinco anos, a história do velho senhor despertou muita tristeza nos jovens, pois ele viveu por setenta longos anos sem liberdade nenhuma, vendo seus semelhantes sendo torturados e usados como animais para o trabalho escravo. O velho senhor de pele clara e cabelos brancos feito a neve contou que quando jovem, ajudava a maioria dos escravos a fugirem, principalmente as mulheres que eram mais vulneráveis ao assedio e ao estupro pelos seus donos, sem que ninguém pudesse defende-las.

- E por que você não tentou fugir antes? – Perguntou o jovem mago curioso.

- Por muitas vezes pensei em fugir, mas se eu fizesse isso, quem ajudaria aquelas pessoas que eu salvei? Tem coisas que só nós podemos fazer nessa terra. Cada ser humano tem sua importância nesse mundo. Ninguém é capaz de fazer o que você faz, não importa a situação em que possamos estar, todos temos nossos valores individuais. A maioria das vezes não é fácil, e quando as coisas estão difíceis, os amigos, a natureza e os animais foram feitos sob a medida certa para encantar nossos dias e preencher nossos corações angustiados. Todos nós temos uma missão nesse universo. As vezes não precisa ser grandioso, só precisa ser feito.

Ao final das palavras do velho Ramir, os jovens com os olhos lacrimejados estavam sem palavras, e apesar de tanta tristeza, aquela história havia os ensinado algo muito importante, sempre fazer o possível, mesmo que seja pouco, e nunca desistir.

- A comida já está cheirando bem, vamos comer crianças. – Falou o velho senhor quebrando a tensão do momento.

Após alguns minutos todos estavam de panças cheias, Zalmon cochilou em cima do prato, Florença estava deitada na cama com olhar fixo, parecia refletir sobre algo muito profundo. O velho Ramir que havia ganhado um cachimbo de sua nova amiga, ascendeu um fumo de ervas e sentou-se perto da lareira para se aquecer.

A noite chegou de mansinho e todos que estavam exaustos, permaneceram dormindo a noite toda.

Florença, a Cavaleira ErranteOnde histórias criam vida. Descubra agora