O caminho era relativamente longo, e o tempo parecia ser interminável. Notei que minhas mãos suavam. Passei no pedaço de pano que ainda cobria meu corpo.
Ok Lucy, você está parecendo uma mendiga. - falei mentalmente
Já se passavam dias desde o meu último banho digno, o que indicava que o cheiro também não estava lá essas coisas.
Afastei o pensamento, pois já estava me sentindo feia o suficiente, e resolvi não estragar a última gota de autoestima que havia sobrado. - na verdade, não sei se realmente existia essa última gota - Os guardas dirigiam lentamente, o que me fez pensar que talvez fosse proposital, para alongar a frustração que eles - achavam - que haviam causado em nós.
Os uniformes eram devidamente alinhados, e bonitos. Pareciam ser feitos no próprio corpo, e esculpidos pelos mais belos enfeites.
- Então cada pessoa que agredir algum guardinha por aí, terá a cabeça cortada? - a voz de Joy parecia ecoar no veículo - Quantas seriam por dia, umas 50? Ou 100?
Os guardas trocavam olhares curiosos, e as expressões continuavam de certa forma, rígidas. Sem um pingo de humor.
- Você não deveria ficar fazendo perguntas. - disse o soldado que espremia Joy no assento, sua postura era tão ereta, que senti uma pitada de inveja.
Ele era relativamente bonito. Tinha pele morena e olhos castanhos. O rosto angelical, o fazia perder um pouco a autoridade.
- Deveriam encontrar um motivo menos banal. Vocês também vão cortar minhas pernas se eu mandar todos aqui...
- Pelo amor de Deus, nem complete essa frase!
Corri os olhos até achar o nome transcrito no uniforme. Encontrei logo abaixo da gola, na lateral.
Steven.
- Um soco na boca para aprender. - Joy disse, dando de ombros. Depois de de um barulho que parecia ser um dente quebrando.
Meu corpo ficou paralisado, Joy o havia acertado novamente. Puxei seu rosto em direção á mim, tentando abraça-lá como forma de proteção. No fundo precisava dar risada, mas por fora precisava me controlar e esperar o acesso de raiva do soldado Steven, que nos fuzilava com o olhar.
Sua boca estava sangrando.
Cerrou os punhos, e olhou bem no centro dos olhos de Joy, senti como se o olhar fosse dirigido à mim. Então, alcançou seu queixo, e segurou-a de uma forma delicada, como se pudesse quebrar.
- Eu não bato em garotas.
- Pois eu não teria medo.
Jurei que pude ver suas bochechas corar, - de toda forma, - mantinha o olhar sério em sua direção, como se nada pudesse fazê-la se intimidar.
Fiquei pensando no que Joy havia falado: agredir uma autoridade, poderia levar a sentença de morte. Mas por que o rei teria que dar permissão? As autoridades não tinham autorização para fazer isso por si só? Eram dúvidas persistentes.
Qualquer pessoa que fizesse isso, seria levada ao rei. O rei teria tempo para todos estes, praticamente todos os dias? De qualquer forma, não fazia sentido. Ele deveria governar para mudar o rumo de Greta. Para que essas situações não se repetissem frequentemente. Não deveria abastecer seu tempo apenas matando seu próprio povo.
Conforme estávamos chegando, pude ouvir muito barulho. Como se uma multidão estivesse concentrada no palácio.
Será que através da muralha gigante, eu iria encontrá-lo? E se justamente hoje, ele tivesse que estar fora do aposento?
Senti um nó no estômago.
- Desçam. - ordenou o barbudo que dirigia o veículo.
- Quem vai morrer primeiro? Tirem par ou ímpar.
Olhei de relance para Steven, que tentava abafar o pouco de sangue que ainda caía de sua boca, com a manga da roupa. Não parecia muito animado como os outros.
Fomos jogadas para fora, e algemadas, como se realmente fossemos criminosas ou algo do tipo. Pensei em Carter. Ele me veria nesse estado? E se não fizesse nada, por ainda ter mágoas dirigidas a mim?
- Entrem, eu as levo em seguida. - disse Steven.
- Steven vamos todos juntos, você não vai conseguir segurar as duas. - alcancei com os olhos sua armadura, assim como Steven, seu nome estava abaixo da gola, na lateral. - Soldado Coren.
- Você está duvidando da minha capacidade, soldado?
Coren baixou a cabeça. Steven parecia ter alguma autoridade.
- Não estamos duvidando. Mas seria mais fácil se fossemos todos...
- Fiquem tranquilos. Agora irei acertar as contas com essa senhorita - indicou Joy com a cabeça -, de vez em quando eu quebro os protocolos para bater em algumas garotas.
Finalmente os outros cederam, andando em direção ás muralhas, trocando sorrisos maliciosos.
- Se precisar de ajuda, estamos a disposição. - disse Coren, sorrindo de lado.
Steven balançou a cabeça, agarrando os meus braços e os de Joy, que estavam algemados. Percebi que esperou os outros adentrarem as muralhas.
Rapidamente, Steven soltou meus braços, que já estavam doloridos.
- Se você tentar encostar sua mão em mim, pelo menos faça como um homem, e me solte. Vamos ver se você vai ter toda essa valentia. - Joy soltava fogo pelos olhos.
- Eu não vou fazer nada com vocês. Estão livres. - disse dando de ombros, soltando nossas algemas.
- Não temos para onde ir, soldado. - me intervi.
Senti um cutucão por cima do vestido.
- Lucy, está louca? Vamos embora daqui.
- Soldado, - Steven me olhava solidariamente - sei que está poupando nossas vidas, e que está demonstrando um grande ato de bondade, apesar de ter sido atingido. - Joy sorriu timidamente. - Mas eu conheço o príncipe, provavelmente até mais do que ele mesmo deva se conhecer. E não temos para onde ir, eu realmente, preciso de sua ajuda. Nós precisamos.
Ele parecia pensar, levando uma das mãos na altura do queixo:
- Não sei como poderia ajudá-las. Esse é o máximo que posso fazer. - Steven deu as costas para nós, e começou andar a passos largos.
- Steven, por favor. Nós precisamos da sua ajuda! Não sei onde estamos, não sei onde minha família está. Também não temos casa, nem alimentos. Se você puder, por favor, ao menos nos deixar tomar um banho e comer alguma coisa. - virou o rosto em nossa direção, e parou de andar, mantendo-se de costas - Só isso que lhe peço.
Virou o corpo, e andou em nossa direção. Nos olhando de um jeito um tanto curioso. Percebi que seu olhar se demorava em Joy.
- Ok. Mas tenho uma condição.
Joy revirou os olhos e se dirigiu á ele:
- Ah mas, o que você quer agora? - bufou de raiva.
- Que você me peça desculpas pelo soco. - apontou em direção a boca ainda ferida - Mão pesada.
Comecei rir freneticamente.
Ela esboçava um olhar irritado, como se um simples pedido de desculpas, fosse o maior sacrifício de sua vida.
- Joy, anda logo. - dei um tapa nas suas costas - Pede.
- Ok, eu... humm... bom, me desculpe. Eu não quis acertar você.
Abruptamente, Steven se pôs a andar em nossa frente. Dando as costas para Joy.
- Regular. Vamos.
Um alívio tomou conta do meu corpo.
- Obrigada amiga - apertei-a em um abraço -, você foi linda.
Seus olhos ainda estavam em chamas, pensei por um momento que Steven pudesse senti-los.
- Mas você sabe que eu realmente quis acertá-lo.
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Amor & Liberdade
RomanceA luta entre o amor e a liberdade. Poderia ela, unir os dois? De um lado, existe o seu passado, humilde e apaixonante. De outro lado, existe a vida na qual ainda está acorrentada. Mas em um audacioso dia, ela encontra uma carta, que mudará todo o ru...