8 - As Coisas Nunca Mais Serão As Mesmas

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"Eu não quero olhar para mais nada agora que te vi

(Eu não consigo mais desviar o olhar)

Eu não quero pensar em mais nada agora que pensei em você

(As coisas nunca mais serão as mesmas)

Eu tenho dormido há tanto tempo numa noite escura de 20 anos

(Agora estou totalmente acordada)

E agora vejo a luz do dia (luz do dia), vejo apenas a luz do dia (luz do dia)"

—Taylor Swift, "Daylight".


Sigo em direção ao quarto e quando chego, deito-me e adormeço.

Acordei com o alarme do celular, que já estava ficando sem bateria. Coloco no carregador, andando na ponta dos pés para não acordar o homem à cama. Adrian respira tão calmamente que me pergunto se ele está acordado, contando quantas respiradas dá. A tomada mais próxima fica perto da porta do quarto de hotel, era o terceiro que eu me hospedava e o primeiro que dividia a cama com Adrian. — Mesmo que tenhamos apenas dormido.

Espero alguns minutos antes de decidir não deitar, mesmo que a lembrança da maciez da cama seja convidativa. Não. Eu decido ligar para Paula.

O telefone dela está desligado.

Tento ligar para Gina, mas também não obtenho resposta. Olho as horas no canto superior da tela: 6:32h. Penso em ligar para minha mãe, entretanto, fazer isso me faria ficar no telefone por longos minutos caso ela venha a atender. Decido mandar apenas uma mensagem, dizendo onde estou — omitindo com quem — e digo que estou bem. Ela com certeza aceitaria apenas isso.

De repente lembro o que aconteceu ontem à noite. Dançamos e beijamos absoluta, as lembranças dos beijos estão vividas em minha memória. Sei também que chorei, que ri, que me sentia pessoa mais ignorante e cinco minutos depois a mais feliz enquanto pensava que a letra da música me movimentava. Tudo isso em uma noite, tantas emoções que parece impossível, mas eu já entendi que mais coisas ruins e boas podem acontecer em um só dia.

Todo o meu corpo pesa, deixo o celular no chão enquanto olho para mim mesma no espelho do banheiro, que está com a porta escancarada. Estou vestindo a mesma roupa e está fedendo. Estou sem sapatos e meu cabelo parece um ninho, mas tirando isso, estou feliz.

Volto para a cama e durmo mais algumas horas.

Desperto a tempo de ver Adrian sair do banheiro.

Ele percebe meus movimentos sonolentos e sorri e sinceramente, pergunto-me meio ranzinza, se ele sorri sempre.

Fico ereta depois de pôr um travesseiro nas costas.

— Bom dia!

Respondo levemente grogue. Ainda desejo voltar a dormir.

— O que acha de bolo de cenoura? Na saída de Yaschire tem uma padaria ótima.

Assinto, mas não levanto.

Adrian caminha até à cama e pula nela, caindo perto da minha cintura. Ele beija minha mão e pergunta, em um nível de um a dez, com quanta indisposição eu estou.

— Infinito. — Respondo.

Adrian ri e pega um travesseiro também. O coloca nas costas e ficamos na mesma posição durante dois minutos até que ele falasse algo de novo.

— Tive um sonho.

— Como foi?

— Acho que envolvia gatos. Não lembro bem, mas você estava nele.

Fico mais interessada e peço que ele continue.

— Estávamos dirigindo em alta velocidade, então começou a chover gatos! Eram fofos e eles ao que parecia, conseguia sorrir. Caiam sempre de pé, no meio da estrada!

Rio.

Adrian sorri, porém, não sorri com vontade. Sinto que tem algo que o preocupa algo maior que a possibilidade de sairmos para uma nova cidade hoje. Não pergunto o que o aflige, sua expressão muda antes que minha garganta encontre as palavras certas.

Ele levanta primeiro e diz:

— Não vamos chegar lá deitados.

Paramos na padaria que ele tinha mencionado.

Nem mesmo olhei para o nome do lugar, o cheiro de pão me capturou. Comi duas fatias de bolo de cenoura — sugestão de Adrian — e biscoitos salgados com suco.

Não percebi o que ele pediu, mas comeu depressa.

Quando saímos estávamos falando algo sobre o sonho dele, que ainda não havia ficado muito claro, quando vi Don.

— Oi. — Ele disse, parecia cansado. No extremo sentido da palavra.

— Oi.

Adrian olha para nós dois, quieto. Então sussurra no meu ouvido, dizendo que esperaria no carro. Ele saiu antes de dar um cumprimento de cabeça para Don, que só notou depois que Adrian virou de costas.

Lembro-me do que Gina disse na ligação, de como a voz dela estava sofrida e insegura. Talvez ele não saiba que ela me contou, então tento apenas perguntar se está tudo bem, mesmo que eu já saiba a resposta.

— Ela contou a você. — É resposta dele para o meu "Tudo bem?".

Um sorriso fraco surge no seu rosto e parece ainda mais terrível do que suas olheiras roxeadas e seu cabelo desgrenhado. Don é atraente, claro que sim, mas a exaustão poderia levar às pessoas a se tornarem múmias.

Toco no ombro dele.

Depois o abraço e ele suspira, como se fosse aquilo que esperasse ou que precisasse.

— Isso acaba com tudo. — diz — Eu queria ser pai, era algo em que eu pensava, eu até... Falava sobre isso com Gi, mas agora... — Don sorri em meu pescoço — Agora nem isso eu consigo.

Eu queria dizer que não era bem assim, que ele conseguiria fazer coisas boas ainda, que até poderia adotar um filho se preferisse. Mas eu não conseguia falar nada disso, me pareceria mentira qualquer palavra que ousasse falar. Li muitos livros de alto-ajuda. Decorei frases e conselhos que ficaram em negrito. Mas isso me cansou e aposto que ninguém quer ouvir um "Tenha fé", "Você pode tudo se persistir, confie em você, acha que está aqui apenas por acaso? Claro que não, porque você é humano e também erra, e erros são escadas para o sucesso". Esse era o tipo de coisa que eu não queria dizer para ninguém pela minha própria descrença, ainda penso que livros de autoajuda tenham evoluído. Talvez Don não acredite quando eu falar de modo robótico por mais que me esforce, não consigo ser esperançosa. O abraço amis forte para recompensá-lo.

Quando me afasto de Don, ele cobre os olhos com os dedos para não mostrar que está chorando. Em alguns segundos ele olha para Adrian, parado no banco do carona da caminhonete vermelha. Um sorriso brincalhão abre no rosto dele.

— Quem é o galã?

Ruborizo e isso causa risadas de Don e me sinto mais feliz do que envergonhada em vê-lo rir de mim.

— O nome dele é Adrian. Nos conhecemos em Dewan, não conte nada a Gina. Eu mesma contarei.

Don assente e pergunta se pretendo ir para casa.

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