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O toque original do IPhone 8 ecoava, mais uma vez, pelo espaço silencioso, contudo, envolvida pelos lençóis e cobertores, não movi nenhuma parte do meu corpo para o resgatar e aceitar a tentativa de contacto, cuja não era a primeira, nem a segunda, nem, muito menos, a última. Conhecia a pessoa por detrás dessa tentativa, pelo que não era necessário desviar os meus olhos daquele pedaço de papel para o visor do objeto eletrónico para conhecer o nome do contacto. Ainda que não tivesse a perceção certa do tempo que tinha passado, acreditava que tinham passado setenta e duas horas desde a última vez que tinha estado em contacto com Rúben e o tivera substituído pelo papel branco repleto de palavras e frases constituídas com como remetente um indivíduo a habitar no meu país de origem, cujo nome era me, totalmente, desconhecido. As tentativas de contacto por parte do amadorense tinham diminuído. No primeiro dia, portanto, no vigésimo-quinto dia do mês de dezembro, o toque do meu aparelho móvel era constante, visto que eu nunca aceitei a primeira tentativa, resultando em várias chamadas telefónicas por atender e mensagens por ver ao longo do dia, que se prolongaram para a manhã do segundo dia. Só a partir da tarde desse dia e no terceiro dia é que a intensidade de tentativas de contacto diminuiu. Censurava-me por ter deixado alcançar aquele ponto. Inconscientemente, estava a destruir a única coisa que me fez sorrir genuinamente desde o momento em que descobri a minha verdadeira nacionalidade e passado.

Todavia, a folha A4 segura nas minhas mãos levava-me a recordar os primeiros tempos da minha adolescência, precisamente, quando os meus pais optaram por revelar-me toda a verdade. A carta provinda de território francês revelava-me a identificação da minha progenitora e o seu desejo de me conhecer ao fim de vinte e três anos. Ainda não tomara a decisão de contar a situação aos meus pais e, muito menos, aos meus irmãos devido ao meu receio das suas reações, embora o meu estado de espírito fosse difícil de ocultar. No dia de Natal, todos os membros da minha família aperceberam-se da minha apatia e, no inicio da manhã, ainda questionaram-me acerca disso, no entanto, ao receber um simples encolher de ombros e, ocasionalmente, movimentar positivo da minha cabeça, desistiram das suas intenções de conhecerem a razão do meu estado, ainda que deduzisse que, pela sua expressão, Olívia acreditava envolver o defesa-central benfiquista.

Um longo suspiro escapou por entre os meus lábios. Num súbito ato de coragem, expulsei o conjunto de roupa de cama do meu corpo, ergui o meu corpo e abandonei a minha cama. Mergulhando os meus pés nos chinelos situados perto dos pés da cama, desloquei-me pelo meu espaço pessoal até adentrar na casa de banho a fim de ocupar o duche e desfrutar de um longo e relaxante banho. De frente para o espelho pendurado na parede, observei a minha fisionomia coberta pela toalha de banho, de novo, suspirei ao notar na cor vermelha por baixo dos meus olhos, rodei a torneira do lavatório e atirei água para o meu rosto, de modo a dissimular o meu ar de morta e adquirir uma cor mais viva. De volta ao interior do meu quarto, caminhei para o meu guarda-roupa, onde retirei uma camisola básica branca de mangas compridas e um vestido com um padrão de quadrados numa mistura entre o branco e o preto, e, de seguida, segui para a cómoda, onde, de uma das gavetas, retirei a minha roupa interior e um par de collants. Enverguei as opções escolhidas, logo a seguir, retornei para a casa de banho para tratar da secagem dos meus cabelos loiros escuros e do desembaraçar dos nós formados nos mesmos e, também, da aplicação dos cremes faciais e de uma maquilhagem leve para tentar ocultar as minhas olheiras. No momento em que envolvia o meu pulso direito com a pulseira de ouro oferecida pelo ex-capitão das equipas de formação do Sport Lisboa e Benfica, a porta do meu quarto foi aberta, subitamente, proporcionando-me a observação da figura da minha mãe que, certamente, procurava conhecer o meu estado, como, sempre, fez nos últimos dias em que estar encerrada no meu quarto parecia-me a melhor decisão.

- Vejo que decidiste remodelar o teu quarto. - Num tom divertido, a empresária no setor automóvel admirou a limpeza total ao espaço que me dizia respeito feita por mim, após concluir a aplicação da maquilhagem no meu rosto, e se mostrava mais asseado, substituindo aquele espaço imundo em que vivi durante três dias.

touch and go | ruben dias [slow updates]Onde histórias criam vida. Descubra agora