Capítulo 5 - Ousadia

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Antes de entrar na sala de aula, Sicheng acomodou o robô em um banco no térreo e lhe deu algumas recomendações. Ele não deveria falar com ninguém, cumprimentar ninguém, responder ninguém. "Não se mova um centímetro sequer, você entendeu?" foram as palavras dele. Ele só não imaginou que o companheiro pudesse ser tão obediente. Ao sair da sala, Yuta estava exatamente como Sicheng o havia deixado. Ele realmente não havia se movido um mísero centímetro, pois o adesivo colado bem do lado de seu bolso mostrava exatamente os mesmos detalhes. Nem um centímetro a mais, nem um a menos. Além disso, o robô também estava na mesma posição.

Quando Sicheng aparece na sua frente o máximo que ele movimenta são os olhos.

– Você é idiota?

Yuta gira as pupilas até fitarem o chão e pisca algumas vezes. – Você disse para eu não me mover.

O chinês deixa escapar um suspiro e senta-se ao seu lado.

– Você não pode levar tudo o que eu digo ao pé da letra. Se eu disser para você sumir, você sumiria? Como seria capaz disso? – ele revira os olhos. – Tudo bem. Vamos esclarecer algumas coisas aqui. Nós não começamos muito bem, não é? – Sicheng morde o lábio inferior fazendo com que o superior se curve em um formato de bico, idêntico ao de uma criança. Era um hábito realizar tal movimento quando ele estava pensando seriamente sobre algo. Yuta não pôde evitar focar seus olhos naquela parte do corpo do chinês e manter-se focado ali.

– Olha, apesar de estar comigo agora, não é como se você fosse um cachorro obediente que faz tudo o que mando. Apesar de seu modo de agir se assemelhar bastante a um. – ele abafa uma gargalhada. – Desculpe. O que estou querendo dizer é que você é independente. Assim como eu. É chato ter alguém do lado que não pense por si só ou aja por si só. Então... faça o que quiser fazer, está bem?

– O que eu quiser?

Sicheng assente sério.

O robô o encara durante alguns segundos, descendo em seguida o olhar até pousá-lo nos lábios do chinês. Ele abre alguns milímetros dos próprios lábios enquanto se aproxima do outro e os fecha apenas quando ele encontra o que deseja. Seus olhos são fechados e ele pôde ouvir algo pulsando fortemente como se marteladas estivessem sendo depositadas em alguma parede de uma sala próxima. Se ele fosse humano ousaria dizer que era seu coração batendo mais forte. No entanto, ele não tinha um. Mas alguém ali perto tinha.

Sicheng recua separando-se do beijo.

– O que- O que você está fazendo?!

– Você disse que eu poderia fazer o que quisesse.

Sicheng olha ao redor. Ele baixa a cabeça ao notar alguns olhares curiosos voltados para eles.

– Você não deve... – ele diz em um tom tão baixo que Yuta teve que curvar-se para tentar entender.

O chinês levanta e movimenta a cabeça sinalizando para o robô segui-lo. Quando decide que o lugar onde estavam parece seguro, ele suspira profundamente antes de desabafar:

– Existem coisas que você deve fazer e coisas que não deve. Isso é uma regra para humanos e você precisa urgente aprender a agir como um. Não se pode sair por aí beijando qualquer um.

– Eu não desejo beijar qualquer um. Apenas você.

As bochechas de Sicheng ficam tão quentes que ele poderia facilmente fingir uma febre.

– Você... você não entende. As coisas não são simples assim. Não podem ser simples assim...

– E por que não? – Yuta pergunta bastante curioso. Ele não estava provocando o outro, apenas não compreendia. Por ser um namorado-robô, sentimentos humanos básicos como timidez obviamente não foram instalados em seu sistema. Isso o impediria de realizar sua verdadeira função. Portanto, tudo o que ele quisesse perguntar, perguntaria. Tudo o que pudesse fazer, se lhe fosse permitido, faria.

"E por que não?" Sicheng repete em pensamento. As coisas simples são simples e ponto. Por que não haveriam de ser? Por que não poderiam continuar sendo? Ele nunca se questionaria sobre isso não fosse Yuta.

Obviamente ele manteria em segredo eterno que aquele fora seu primeiro beijo.

••••

Nos últimos dias Yuta parecia bastante concentrado em seus "estudos". Após ter ganhado um celular de Sicheng, que o presenteou alegando ser um investimento necessário, ele passava horas e horas em suas pesquisas sobre comportamentos humanos. Vez ou outra procurava Sicheng quando não conseguia compreender algo.

Nem todos os namorados-robôs eram assim. Muitos deles dispensavam tais pesquisas pois já continham essas informações em seus sistemas. Entretanto, Yuta não era um modelo caro. Depois de ser testado algumas vezes ele até mesmo foi liberado para transitar como sendo uma amostra, pois não haveria prejuízos caso sofresse algum dano.

Sicheng estava estudando na sala uma tarde quando Yuta aparece o chamando com um leve tom de tristeza em sua voz.

– Winko...

O chinês desvia o olhar dos livros e o deposita no robô.

Yuta se aproxima do garoto e senta-se ao seu lado.

– Lembra das luzinhas que você me falou? As que vivem o mesmo tempo que eu?

– Os vaga-lumes.

Yuta assente.

– Eu fui pesquisar sobre eles. Não conseguia entender como essas criaturas podem viver tão pouco sendo tão bonitas... Eu... eu achei uma coisa. – Ele mostra o celular.

Sicheng nem precisa ler o título pois reconheceria aquela imagem em qualquer lugar, afinal, era uma de suas animações favoritas.

– "O túmulo dos vaga-lumes."

– Eu achei que era sobre como esses insetos morriam. Eu não achei que... Eu me sinto um pouco estranho.

– Você assistiu tudo?

Yuta assente.

– Eu apenas não entendo. Por que guerras existem?

Como ele poderia explicar? Não era uma pergunta simples. Entretanto, o garoto fechou os livros e retirou os óculos. Ele pensou um pouco escolhendo cuidadosamente as palavras com as quais deveria iniciar e, pacientemente, tal qual estivesse contando uma história, relatou em detalhes tudo o que havia aprendido para o robô. Algumas vezes, quando Yuta ficava cabisbaixo, ele hesitava em continuar. Yuta era um ser dócil, sempre sorridente. Descobrir como o mundo e as pessoas que ele tanto aprecia não são sempre tão maravilhosos estava criando uma espécie de reação decepcionante no robô. Era uma cena que afetava Sicheng. Mesmo que se recusasse a confessar, ele adorava a personalidade naturalmente cativante e sempre alegre de Yuta. Ao vê-lo triste, ele sentiu seu coração quebrar um pouco.

[Continua...]

ღღღ

Nota: Quando Yuta menciona sobre os vaga-lumes viverem o mesmo tempo que ele está se referindo aos 3 anos mencionados em "Boyfriend Material". Eu achei necessário incluir essa informação aqui para quem não leu a história original.

Dito isto, o que vocês estão achando? ><

Osaka Boy | yuwinOnde histórias criam vida. Descubra agora