ILUSÃO

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Não costumo receber visitas

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Não costumo receber visitas.

Não tenho contato com a minha família desde que mamãe me expulsou de casa, e nunca tive muitos amigos. Na verdade, só tinha um. Um amigo.

Não gosto de me sentir dependente, não gosto de perder as coisas, então decidi cortar laços com esse meu amigo de uma vez por todas antes que ele me machucasse. Mas ainda lembro dele, todos os dias. Seu nome era Tobias.

Eu sabia que hoje seria diferente, entretanto, sabia que eu receberia uma visita de meus pais. Com isso, fiz três xícaras de chá; eu odiava chá, mas sabia que mamãe mal conseguia suportar cheiro de café, então decidi lhe agradar. Às onze horas, ouvi batidinhas na porta. Quando fui atender, vi apenas papai parado ali na frente, vestido de vermelho, minha cor favorita.

Ele entrou, sentou, e nós conversamos como velhos amigos que nunca foram separados.

Quando você está feliz, o tempo passa rápido demais.

Olhei para o relógio e já estava de noite, minha casa bagunçada com os cacos dos pratos no chão, e meu pai havia ido embora. Jogamos a tarde toda um jogo que ele adorava; arremesso de vidros. Ele morria de felicidade sempre que eu sugeria essa brincadeira.

Ele, como muitas outras pessoas, era uma criança afetada pela maldição do tempo. Sua pele estava apodrecendo cada vez mais, enrugando, mas sua mente continuava a mesma de quando era jovem.

Era uma criança presa em um corpo que não lhe pertencia. Velho demais, sujo demais. Morto demais.

Minha mãe teve que me explicar o que era a morte quando eu vi um passarinho sendo atingido por uma pedra e caindo imóvel no chão. Ela disse que a morte era um deus sorrateiro e silencioso que comandava o destino das pessoas. Aquela foi minha primeira paixão.

Um descanso eterno, controlado apenas pelo tempo e pelas circunstâncias. A morte era o único deus que vinha quando nós chamávamos.

Precisei tirar os chás da mesa, pois eles estavam começando a cheirar mal. Pensei que a morte poderia tê-los alcançado também.

O tempo estraga tudo o que toca, e infelizmente, ele sempre está tocando tudo.

Vi meu pai novamente um mês depois disso. Ele estava mais velho, e ainda vestia seu terno vermelho vibrante. Ele odiava vermelho, gostava mais de azul. Dizia que vermelho era a cor da morte, e azul era a cor do paraíso. Eu achava que vermelho representava o amor. E todos nós fazemos sacrifícios por quem amamos. Até mesmo vestir a cor que mais odiamos.

Sentamos em uma praça, quase vazia, exceto pelo sorveteiro que parecia morar lá. Rimos tanto quando eu lembrei do dia em que enchi meu pai de amor. Ele se orgulha de mim. Quando eu era pequeno e cabia em seus braços, ele me jogava no ar e falava que eu era a melhor coisa que havia lhe acontecido.

Eu amava aquilo. Amava meu pai. Sentia falta de mamãe, desejava que ela fosse me visitar mais vezes, mas sempre estava ocupada. Nunca havia tempo o suficiente.

Nunca havia amor o suficiente.

Quando fui comprar um sorvete para meu vellho pai, o sorveteiro me perguntou por que eu estava rindo sozinho.

Percebi tarde demais que estava tão acostumado com a solidão, que decidi dar uma volta com ela.

Percebi tarde demais que meu pai não estava comigo.

Percebi tarde demais que meu pai não estava comigo

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