Capítulo Onze

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Victor Decker:

Passou-se meia-hora e nos encontramos reunidos próximo a um antigo armazém, que agora se erguia como uma silhueta sombria contra o crepúsculo.

— Detesto esses malditos feéricos ainda mais agora — Caroline desabafou, lágrimas brotando em seus olhos. — Eles destruíram o meu apartamento, sabe como vai ser complicado explicar isso para o senhorio?

Bruno tentou consolá-la, enquanto eu observava a cena, preocupado com a situação. Pauline, no entanto, olhou na nossa direção e discretamente se afastou, levantando suspeitas.

— Eles foram eficazes em eliminar os cavaleiros rapidamente — ela comentou com uma voz carregada de mistério.

— É exatamente isso o que me preocupa. Algo saiu dos estilhaços de vidro e arrastou os cavaleiros para dentro do espelho — falei, e Puck soltou uma risada desconcertante.

— Essa foi a luta mais bizarra que já presenciei em toda a minha existência — Puck declarou, seu olhar faiscando com uma luz travessa.

— Temos que manter isso em segredo por um tempo e ocultar a existência do cetro — insisti, sentindo a urgência crescer.

Pauline, com uma delicadeza surpreendente, se manifestou: — Eu conheço um lugar, mas acho que não será muito acolhedor para nós.

— É melhor do que não ter para onde ir — concordei, virando-me para encarar Grimalkin, que havia aparecido silenciosamente ao meu lado.

— Devo ir o mais rápido possível — declarei, sentindo o peso da responsabilidade sobre os meus ombros.

Pauline, com determinação, perguntou:

— Para onde estamos indo?

Caroline se ergueu, sua expressão endurecida.

— Ela está certa. Não permitirei que o perigo nos alcance novamente, nem que destruam mais coisas minhas.

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Ficamos hospedados na acolhedora casa de Pauline e Bruno, e uma coisa que me surpreendeu profundamente foi notar a escassez de fotografias em que seus pais estavam reunidos com eles. Enquanto os outros estavam ocupados vasculhando suas coisas, aproveitei a oportunidade para examinar o computador de Bruno. Foi então que me deparei com um site em minha pesquisa sobre informações da minha cidade natal. Percebi que já se passaram quatro longos meses desde que fui arrastado para Nevernever, e uma dolorosa compreensão me atingiu de repente. Minha mente se encheu de pensamentos sobre meus pais e como eles devem ter reagido à minha misteriosa ausência. Eles certamente teriam estranhado o que aconteceu comigo.

Entendi que quando alguém se envolve com os feéricos, a mágica de Nevernever age impiedosamente para distorcer as memórias de seus entes queridos. Imaginar o que meus pais tiveram que suportar, como eles devem ter se sentido enganados e perdidos em relação ao paradeiro de seu filho, era angustiante. E não era apenas minha família; pensei em todos os humanos que foram iludidos pelas cortes das fadas, separados de suas famílias e destinados a servir a caprichos sobrenaturais. Era uma reflexão sombria sobre as impiedosas maquinações do mundo feérico e os terríveis custos que os mortais pagavam por cruzar seu caminho.

A tela do meu computador piscou, e diante dos meus olhos surgiram imagens perturbadoras. Um coelho branco, tão magro que parecia um esqueleto, flores grotescas ostentando braços, pernas e bocas de onde escorria sangue, e uma morsa com algo que se projetava de sua metade inferior, assemelhando-se a raízes de árvores. Era como se a turma do País das Maravilhas tivesse sido submetida a uma dose tóxica de radiação, mas o que mais me intrigava era o símbolo de uma chave, idêntico ao que os cavaleiros deixaram para trás.

Anjo das sombras | Livro 3: O País Das MaravilhasOnde histórias criam vida. Descubra agora