Segundo tempo

Capítulo 49

Yoongi estava com frio.

Sentado sozinho na cozinha da casa de Jungkook, ele tinha a sensação que o inverno tinha invadido os cômodos do mais novo, engolindo-os, feito morada onde antes costumava ser um lar de risos, cores e calor.

Talvez o aquecedor da casa estivesse desligado ou sua febre estava voltando, o músico quis se convencer. No entanto, sua pele não estava quente — a gripe agora era só uma irritação chata na garganta e uma dor surda na parte de trás da cabeça — e, da cadeira em que estava sentado, conseguia enxergar o registro do aquecedor ligado. Yoongi não conseguia entender porque o frio estava ali, arranhando seus braços, soprando em sua nuca, segurando suas mãos com força e puxando-o para algum lugar escuro que o músico não conhecia.

Estava frio quando chegou na casa de Jungkook com Namjoon e Seokjin. Ficava cada vez mais frio a cada minuto passado em espera, cada conversa banal que seus amigos tentavam levantar, a cada palavra que não fazia sentido para o Min porque tudo o que sua mente conseguia captar, processar e entender era: Jungkook, Jungkook, Jungkook. Estava insuportavelmente gélido quando seus olhos encontraram o mais novo na porta da cozinha, o seu olhar cansado e atordoado, sua expressão angustiada, suas lágrimas repentinas. Yoongi se sentiu preso a um iceberg quando o Jeon gritou com ele, quando despejou toda a sua dor acumulada nos ombros do músico, quando caíram no desespero um do outro bem ali, no meio da sua cozinha. E mesmo que Jungkook tenha o perdoado, que o calor abstinente do seu corpo tenha sido pressionado contra a epiderme do mais velho, Yoongi ainda não conseguia deixar de sentir frio.

Não conseguia esquecer o surto do namorado. Apagar da memória suas lágrimas e angústia. Parar de se culpar por toda a exaustão do Jeon, por seu esgotamento total. Porque era culpa dele, no fim das contas. Era culpa dele o afastamento, o abandono e o esforço descomunal de Jungkook em esconder tudo para bater na porta do seu apartamento antes da reunião. E talvez fosse por isso que ele sentisse tanto frio. Culpa era algo gelado, corrosivo. Quanto mais culpa sentia, mais calor era roubado do seu corpo.

Yoongi se encolheu. Estava sozinho porque seus amigos já tinham ido embora há alguns minutos. Quando Jungkook e ele deixaram a cozinha, o grupo estava os aguardando na sala, engajados em uma conversa superficial. Calaram-se quando viram o casal e o silêncio durou por poucos minutos, até Taehyung perguntar como a conferência tinha sido. Jungkook narrou tudo o que aconteceu em uma voz robótica, cansada, ainda preso ao lado de Yoongi, segurando sua mão como se tivesse medo que o mais velho fosse ir embora mais uma vez. Ao terminar o relato, concluindo com as palavras da sua advogada de que estava tudo bem e que tinha acabado agora, ninguém perguntou mais nada. Era visível o quão cansado o atleta estava e ninguém queria sobrecarregá-lo, então resolveram dar o assunto como encerrado por ora.

Namjoon garantiu em um tom tranquilo que as coisas ficariam bem agora e Seokjin o apoiou. Hoseok disse que estava orgulhoso do mais novo e o ofereceu um sorriso seguro, protetor. Jimin e Taehyung o abraçaram. O ruivo brincou, dizendo que o Jeon estava o devendo para o resto da vida, e o Kim perguntou se ele estava com fome porque os hyungs tinham os proibido de comer até que o atleta chegasse e ele estava faminto. Jungkook riu, uma risada fraca e baixa, para as palavras dos dois, o que quebrou o clima tenso que pairava entre o grupo.

Pediram complementos por um aplicativo porque Seokjin ficou desconfiado que o jajangmyun que Yoongi fizera não seria o suficiente e comeram entre conversas banais e risadas leves. Jungkook comeu pouco e Yoongi menos ainda, mas os amigos resolveram não comentar nada, apenas observando em silêncio a forma como estavam grudados um no outro, ombros encostados com a proximidade das cadeiras e o braço de Jungkook jogado nas costas da cadeira do mais velho como se tentasse prendê-lo ali. Não era uma aproximação comum de casais, no entanto. Havia medo entre os dois, uma apreensão perceptível, ambos temendo a próxima rasteira repentina da vida, agarrando-se um ao outro como forma de garantir que se caíssem, caíram juntos.