Super Cool Sugar Bombs: agora com apenas 20% açúcar e uma proposta de emprego

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Blanket miou, mas soou como um sonho, distante o suficiente para ser ignorado. E miou outra vez, e outra vez, e mais uma vez. Sonho ou não, o som gradativamente tornou-se irritante aos ouvidos de Phillip, e ao sentir o tecido do travesseiro contra sua bochecha e os fios de cabelo sobre seu rosto, soube que estava de volta ao mundo real, onde seu gato real não calava a porra boca. Ele suspirou ao tentar abrir os olhos; eles ainda pesavam, e uma dor de cabeça o recordou na noite passada. Não era ressaca, porque Pip precisava de bem mais que alguns goles de vinho para acordar naquele estado, era simplesmente exaustão.
O sol empatou sua visão dolorosamente, as córneas doeram. Virou o rosto para a extensão de sombra, fora do alcance da entrada da janela. Pip sentiu calor, e Blanket miou outra vez. O gato estava parado em frente a janela, e então andou para a escada de incêndio, onde voltou a se alimentar de um animal morto: um rato. O rosto de Pip se contorceu em uma expressão de nojo e horror. Levou aquilo como um ataque pessoal e uma recordação de comprar comida para o gato.
- Eu vou comprar comida pra você, mas eu juro que aqui você não entra pelos próximos quatro dias. - Murmurou.
Tentando ignorar a cena grotesca, rolou para fora da cama, que resultou numa queda indolor em seu corpo adormecido. Um "ai" sem emoção escapou de seus lábios, enquanto ele lentamente adormecia de novo no carpete frio.
O despertador tocou e Pip arregalou os olhos em um susto.
- Tô acordado.

Como o parcialmente devoto britânico que era, chá sempre foi uma preferência acima do café. Pip podia tomar qualquer tipo de chá que o mercado pudessem criar para dar novidade aos seus consumidores - mesmo que não agradassem a maioria -, por mais duvidosos que fossem alguns sabores, ainda eram mais agradáveis que café para Pip.
- Mas se tivesse um chá sabor café? Não parece ser muito saboroso.- Tweek perguntou uma vez, há um mês ou uma semana atrás, Pip não saberia dizer.
- Na verdade existe, e é bom até. - Pip riu, enquanto Tweek fazia questão de transparecer seu desgosto pela opinião do outro.
Pip misturou uma pequena colher de açúcar na xícara de chá quente com a companhia de uma pílula para dor de cabeça e vodca, então bebericou um pouco do chá de maçã. Caminhou até a porta e deixou o apartamento com a xícara nas mãos e um casaco por cima do pijama. Desceu pelo elevador de décadas, segurando firme em seu copo.
Era uma sensação nova e estranha, essa de nunca saber de nada. Até naquela manhã de segunda quando pisou no prédio em que trabalhava, ele sabia como seu dia seria, quais tarefas faria, as burocracias rotineiras, sabia que Tweek o chamaria pra sair à noite com Butters e Scott porque ele sempre procurava por uma fuga da realidade, sabia que Tweek negaria que tem algo errado. Assim como sabia em qual loja ir no caminho de volta pra casa para comprar qualquer besteira para comer, sabia a programação da tevê e o que escolheria, e então dormiria.
E agora, ele não tinha muita certeza de nada.
Quando as portas do elevador se abriram ele caminhou para fora do prédio, se direcionou para uma lojinha de conveniências logo ao lado, compartilhando a mesma parede com a construção. Não era bem do feitio de Phillip Pirrup sair com um visual tão despreocupado na rua, o que imediatamente chamou atenção do atendente da loja, que o observou com os olhos curiosos ao passar pela porta e soar o sininho na entrada.
Era um estabelecimento pequeno com cores vibrantes em todos os lugares, desde a pintura das paredes até cartazes de propagandas pregados nestas. O lugar tinha uma temperatura razoável comparado ao dia lá fora. Dead Man's Party tocava nas caixas de som enquanto Pip se dirigia lentamente até a sessão de comidas enlatadas para animais. Seus passos solitários e lerdos ecoando pelo local, a atenção do balconista adolescente captando cada movimento incerto do homem loiro e esquisito, o suficiente para ser suspeito.
Pip parou em frente a prateleira de comida para gatos enquanto as câmeras de segurança o assistiam. Ele juntou os pés e pôs a mão em frente ao torso, as sandálias fazendo sutis barulhos contra o chão antes de se acomodarem. Franziu o nariz ao analisar as marcas e os sabores dos enlatados, puxando uma mexa do seu cabelo para trás. Blanket era um gato mimado demais para a vida medíocre que lavava, às vezes fazendo Pip se arrepender de atender seus hábitos expansivos. Ele olhou entre a lata de embalagem amarela com a estampa de um gato branco se alimentando da ração que parecia ser deliciosa e suculenta até mesmo para um humano, com um belíssimo e chamativo slogan, e outra mais barata, coberto por um azul escuro; neste, um gato agitado, com um chapéu de mago, uma capa e uma varinha prensa entre as patas animava a embalagem, o nome da produto resumido apenas e simplesmente como "ração", em letras coloridas para distrair o comprador da falta de criatividade e baixa qualidade do produto. Pip estreitou os olhos.
Ele checou sua conta depois do trabalho para se conscientizar sobre o que faria com aqueles 906,75 dólares que lhe restaram. Tweek comentou sobre a indenização, mas sabia que não seria muita coisa. O aluguel ainda não tinha sido pago e as compras ainda não tinham sido feitas e por um breve momento Pip se perguntou se era realmente importante satisfazer as vontades mesquinhas de um gato cínico que provavelmente nem gostava dele. Com um suspiro pesado, ele pegou duas das latas de ração - cuja esse não era o nome da marca – e colocou sobre o braço.
Os olhos azuis correram para prateleira de baixo.
Curiosamente, ela estava vazia, exceto por um único produto que a enfeitava; uma caixa azul com "Jesus Pessoal" escrito sobre sem mais nenhum tipo se informação, sem rótulos, sem nada. Olhou para a caixa e engoliu seco, piscando. Ela parecia bem menor que na TV e estava inclinada para o lado, de modo que seu perfil seguisse direto na direção de Pip. Ele deu um passo para trás, arqueando as sobrancelhas em uma confusão.
Ele balançou a cabeça, sem saber exatamente para o quê ou o porquê, mas continuou andando até o balcão, as latas pressionadas contra a estampa de algum personagem da Corrida Maluca em seu pijama. A calça folgada batia no calcanhar e, por um momento, temeu que pisasse sobre ela. Com passos apressados, chegou até o balcão e largou as latas sobre a superfície de madeira, enquanto o atendente com a sua altura, de pele negra e cabelos crespos o estudava com olhos atentos, como se Pip fosse de outro planeta.
Pip sorriu gentilmente, tentando parecer menos esquisito. O atendente respondeu com um meio sorriso incerto, mas trabalhou em colocar as duas latas em uma sacola enquanto dizia "são 10,50". Pip buscava pelo dinheiro que se escondido em seu bolso.
- Tá um puta calor hoje, né? - O atendente disse, repentinamente, enquanto aguardava Pip achar seu dinheiro. - É como se estivéssemos cada vez mais próximos do inferno. - Concluiu com convicção, era uma reflexão tanto para ele mesmo quanto para Pip que, embora estranhando o comentário, assentiu vagarosamente.
- É, eu acho. - Ele entregou uma nota de dez e algumas moedas. - Eu não me importaria, na verdade, se o inferno chegasse e queimássemos até a morte... - Pip riu uma risada sinistra e desajeitada, sem entender o que havia acabado de dizer. Sentiu-se um idiota, mas o atendente riu uma gargalhada lenta e tão estranha quanto a dele. O clima pesou, mas só ele sentiu.
- É, - fungou - legal. - Concluiu, e Pip franziu o cenho. Ele tinha uma expressão intrigante, natural e um pouco aéreo. O rapaz o entregou a sacola e outras poucas moedas enquanto Pip agradecia e dava meia volta, saindo da loja pensando sobre o breve episódio incomum.
No estacionamento da loja, o celular de Pip vibrou no bolso, e o loiro desastrosamente enfiou a mão no casaco para puxa-lo com dificuldade, enquanto cessava seus passos até que parasse no meio do estacionamento. Olhou para a tela em busca de um nome, e com dificuldade pela claridade, viu o nome de Tweek na tela.

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