My Girlfriend Human

Voltando ao seu mundo

(Aos olhos da Luz)

       Eu tento falar algo, mas nada saí. Busco mentalmente varias informações para que isso seja possível, porém, não consigo negar que de fato conheço esse animal. Uma sensação estranha de felicidade surge repentinamente em meu peito, por que? É apenas uma coruja.

"Você sabe que é muito mais que isso"

       -Acho que estou ficando louca- Rio pra mim mesma como se estivesse esperando uma resposta da pequena criatura em minha frente.

       Coruberto me olha como se estivesse esperando alguma coisa também. Depois de um tempo em silêncio ele pega com suas patas o meu livro da Azura recém posto no lixo.

       -Ei!- Grito tentando recuperar o livro de volta.

        A coruja é rápida, desvia de mim com facilidade e volta para a floresta de onde surgiu.

       Não sei por que faço isso, mas minha primeira reação é ir atrás dele. Não para recuperar meu livro, talvez seja pela sensação de déjà-vu que a situação me causa, como se já tivesse passado por isso antes. Ou talvez seja porque sinto que estou fazendo algo certo, que eu preciso fazer isso. É como se meu interior gritasse para que eu o seguisse.

       Atravesso a floresta, está escuro, então uso a lanterna do celular. Perco de vista Coruberto algumas vezes, mas olho com calma e encontro ele parado me olhando, ainda com o livro em sua pata, logo em seguida ele levanta vôo e segue seu caminho. Como se estivesse me esperando. Me guiando até algum lugar.

       Conforme ando sinto minhas memórias ficando cada vez mais nítidas. É como se reassistisse um filme que não lembrava mais e, ao longo do filme você vai se lembrando de fragmentos da história.

       Chegamos enfim, em uma casa tão velha quanto a minha, a pequena coruja some no breu assim que atravessa a porta. Fico meio relutante sobre se entro ou não, afinal é uma casa escura e assustadora no meio de uma floresta escura e assustadora. Por que eu-o segui mesmo? É melhor voltar, está tarde e...

       Estou prestes a dar meia volta quando um clarão repentino surge de dentro da casa. Fico hipnotizada a ela, é como se meus pés se movessem sozinhos para a origem daquela claridade. Me aproxímo e então, sou sugada por ela.

~~~~~~~~~~~~~~~~*~~~~~~~~~~~~~~~~

       Estou em outro lugar, uma outra casa. Como isso é possível?

       É um cômodo familiar, quase como um depósito, mas se organizar dá um ótimo quarto. Consigo facilmente visualizar na cabeça um saco de dormir azul no centro do local.

       Localizo Coruberto passando pela porta ainda com meu livro em suas patas. De repente a porta que eu atravessei se fecha e dobra até virar uma espécie de mala. Observo a mala/porta por mais um tempinho e depois continuo minha perseguissão pela coruja, ou pelo livro, não sei ainda.

       Deço as escadas. Começo a ouvir movimento no andar abaixo e dimínuo o passo até parar completamente.

       Droga, por que eu larguei aquele guarda chuva?

       Me agacho na esperança de não ser vista. Consigo enxergar de leve uma mulher sentada num sofá com um cachorro em cima dela. Não, não é um cachorro, é um...

       -Oh, você voltou!- exclama a mulher sentada, se endireitando para receber a coruja.

       -Como vai a nossa garota humana? Ainda sem se lembrar de nós?- Coruberto entrega o livro a ela.

       -Opa, isso é um bom sinal né?-

       -Ainda esperando a Luz voltar, irmãzinha?- A voz vem da cozinha, surgindo aos poucos uma mulher meio pálida e com cabelos negros, trazendo duas xícaras em suas mãos.

       Lilith... flashs surgem em minha mente com esse nome. Uma maldição, uma traição....

       -Eu não espero, ela vai voltar- A mulher do sofá larga meu livro na mesa, retira o animal do seu colo, colocando-o delicadamente em seu lado. Ela se levanta e pega a segunda xícara da mão de Lilith. Revelando melhor o seu rosto.

       Sem que eu perceba, lágrimas atravessam minhas bochechas, caindo suavemente na escada fria de madeira que estou abaixada. É um choro silêncioso porém, muito dolorido por dentro.

       Eda...

       Meu coração bate mais rápido com esse nome e tantas memórias boas reaparecem.

       A bruxa que salvou a minha vida diversas vezes, me ensinou mágia, deixou eu morar com ela e me fez uma capa... ela foi uma segunda mãe pra mim e eu a esqueci...

       -Como? Ela até esqueceu da gente.-

       -Luz prometeu, e eu a conheço o suficiente pra saber que vai cumprir!- Eda olha seriamente pra sua irmã.

       Lilith suspira, vendo que é impossível ganhar uma discussão com a mulher coruja.

       -Se você diz...-

       Coruberto está inquieto enquanto as duas conversam, como se quisesse falar alguma coisa urgente. Como nenhuma das duas presta atenção, ele se estressa e voa até onde eu estou, pousando em minha cabeça.

       -Ai!- A pequena criatura bica minha cabeça, revelando meu esconderijo. Quando percebo que falei alto demais levo as mãos a minha boca, mas já era tarde demais...

       -Quem está aí?- pergunta Lilith num tom sério.

       Coruberto volta para Eda, que rápidamente encaixa ele em cima do seu cajado, se preparando para caso seja necessário se defender.

       Merda, merda, merda, o que eu faço? Oi volteei e ouvi toda a conversa de vocês sobre mim. Espero que não se encomodem... isso parece terrível...

       Meus pensamentos são cortados quando uma força invisível me ergue e leva escada abaixo, chegando aos pés das irmãs. As duas me olham surpresas.

       Não sei o que fazer ou dizer, então minha única reação é dar um sorriso amarelo na direção delas.

       -Luz?-

(Fim do capítulo, Feliz Halloween pra todos!)