O sol raiava forte e o dia era quente, mesmo tendo amanhecido a pouco tempo. As manhãs de verão eram sempre assim, mas esse ano estava mais quente do que o normal. O galo cantou cedo anunciando o alvorecer de um novo dia. Todas as pessoas começaram a levantar, colocarem suas roupas e irem fazer suas tarefas diárias. A vida naquela pequena vila era simples e dura, com muito trabalho para ser feito, mas todos estavam acostumado com isso. Da janela do quarto era possível já ouvir as pessoas falando, ainda com as vozes embargadas de sono, ou com a boca cheia de pão duro e chá morno.
Vándor levantou quando sua mãe veio retira-lo da cama a força. O garoto de pele morena, acobreada, cabelos curtos e densos, queria dormir por pelo menos mais cinco minutos, e todo os dias falava a mesma coisa com sua mãe, e todos os dias recebia a mesma resposta. Seu pai já estava de pé, tomando seu dejejum. A noite anterior havia chovido, portanto a janela de madeira estava fechada, porém só servia para manter o ambiente escuro e abafado.
Ilka era uma mulher madura, mas que aparentava ter pouca idade. Com os cabelos longos e castanhos, seus olhos eram verdes e combinavam de uma maneira estranha no seu rosto sempre sério. Apesar das feições duras pelo trabalho no campo, era sempre gentil e hospitaleira com quem quer se estivesse ali, seja de passagem, sejam parentes, amigos, comerciantes. Em casa era ela quem cuidava da arrumação, preparava comida e cuidava do filho.
Durante muito tempo, Ilka e Fredek tentaram ter filhos, porem sem sucesso. Segundo o curandeiro da região, Ilka não era capaz de ter filhos o que deixou ambos bastante afetados. Porém, Ilka visitou uma velha senhora, que morava reclusa na floresta, diziam as más línguas que ela era uma bruxa que raptava crianças para seus rituais macabros, porem a camponesa nunca acreditou nas crendices e sempre a tratou bem, quando vinha negociar.
- Você sempre foi uma mulher gentil, Ilka, e merece a benção da deusa da Lua. – Disse a senhora com a voz tênue. Seu rosto era marcado por linhas de expressão e a pele bastante enrugada. Não era mais baixa que Ilka, porem andava sempre encurvada, com o apoio de uma bengala velha de carvalho escuro. – Beba esse chá. – A senhora entregou-lhe uma xicara com um chá verde escuro de cheiro abominável. Enquanto falava palavras incompreensíveis:
Asato ma sad gamaya
tamaso ma jyotir gamaya
mrtyor mamrtam gamayaO gosto da bebida era tão ruim quanto seu cheiro, e ao tomar, Ilka imediatamente sentiu seu estomago embrulhar.
- Boa menina. Vá agora, com a benção da Lua sob sua cabeça. Leve contigo minha gratidão por tantos anos de gentileza incondicional. Seu marido é um homem de sorte, e seu futuro filho terá mais sorte ainda, por ter você como mãe.
- Levanta Vándor, está na hora. O sol já nasceu! – Disse ela ao abrir a grande janela de madeira velha. O garoto reclamou e virou para o lado, tentando esconder-se da claridade. Ela puxou-lhe o lençol que usava para se cobrir, e o guardou no baú que mantinha ao lado da cama.
Sem ter mais opções, o garoto levantou-se, espreguiçou e ainda de olhos fechados, foi em direção a bacia com água que estava do lado de fora da casa para lavar o rosto. Em seguida sentou-se ao lado de seu pai, um homem forte, grande, com os braços largos do trabalho no campo. Seu rosto era também sempre sério e observador. O cabelo curto e preto, assim como a barba, dava-lhe uma aparência mais velha do que realmente tinha. Sua pele era vermelha de sol, as mãos grandes e calejadas do trabalho como ferreiro. Fredek era talvez o único num raio de quilômetros que sabia trabalhar numa forja e por isso sempre havia bastante trabalho. Passava o dia fazendo ferramentas, pregos, enxadas e pás. Raras as vezes que precisou fazer qualquer coisa diferente disso. Apesar de jovem, Vándor farias vezes passava o dia com seu pai, ajudando-o e aprendendo. Fredek tinha certeza que seu filho iria seguir seus passos, por isso era sempre rígido com ele, ensinando-o como lidar com forja. O garoto, claro, não queria fazer isso, pois era trabalhoso de mais.
- Hoje teremos uma grande remessa de pregos para ser feita ao Barão. Aparentemente ele está reformando a ponte do leste e precisa desse material para ontem. – Sua voz era rígida e profunda, também bastante cansada.
- Por que então ele não pediu isso antes? Daria tempo de fazer com mais calma. – Reclamou a garoto. Seu pai apenas o olhou com cara feia e deu-lhe um peteleco na cabeça.
- Quando acabar de comer, quero que pegue Istem e vá ao mercador comprar ferro. Os que eu tenho aqui não são suficientes para a demanda. Depois disso vá buscar lenha para a forja.Fredek levantou-se, entregou uma pequena bolsa de couro simples com algumas moedas e entregou para o garoto. Apesar de jovem, ter vivido apenas 11 primaveras, Vándor era bastante inteligente e seu pai confiava trabalhos como esse ao garoto, mesmo sabendo que era perigoso uma criança andar com dinheiro por aí, sozinha.
O garoto, por outro lado, adorava quando tinha que ir ao centro da vila, fazer compras, pois era a única oportunidade que tinha de ver gente, pode sair um pouco de sua casa e arredores e conhecer mais o mundo. Seu sonho era viajar por aí conhecendo todos os segredos que o mundo esconde. O lugar já estava movimentando quando o garoto chegou com sua carroça pequena puxada por apenas uma mula cansada e velha. Ele calmamente parou perto da loja, um estabelecimento simples, bastante empoeirado e que no chão já havia bastante marcas de pegadas, pois a terra ainda estava enlameada pela chuva. O dono, um homem alto, forte, muito musculoso varria a fachada, tentando ao máximo tirar o barro dali.
- Bom dia senhor!
- Bom dia senhorzinho. – Respondeu o homem com sua ironia conhecida, claro que Vándor era jovem demais para entender. – O que vai querer hoje?
- O de sempre. – E com isso entregou as moedas para o homem. Depois de conta-las, entrou em sua loja e chamou seu ajudante. O garoto sempre gostou daquele lugar, pois era onde podia ver algum tipo de armamento. Ali principalmente era vendido utensílios, como facas colheres e afins. Contudo também era possível ver espadas curtas, cotas de malha e alguns escudos. Não era muita coisa, talvez a qualidade nem fosse das melhores, mas Vándor adorava olhar aquele equipamento e sonhar um dia usar aquilo.- Acorda pra vida garoto. – Disse o dono empurrando o queixo do garoto para cima. – Sua carroça já está carregada. Dê meus comprimentos ao seu pai.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Masmorras & Dragões
FantasyTodo herói tem sua origem. Num mundo onde magia é algo real, pessoas comuns tentam viver suas vidas de maneira pacifica e tranquila. Vándor, por outro lado, só queria saber de conhecer o mundo e todos os seus segredos, visitando os cantos mais remo...