Chefe substituto

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  Um inseto comprido e peludo, com varias patas e três antenas caminhando numa folha, não, haviam mais folhas, alguns gravetos também. Eram sustentados por pedaços de um tipo de bambu avermelhado com listras amarelas. Era um teto, um teto de folhas e gravetos sustentado por pedaços de bambu vermelho com listras amarelas... e um inseto, foi a primeira coisa que os olhos de Joaquim observaram ao serem abertos.
  Se sentia aconchegado, deitado sobre uma rede feita de um tecido macio que esquentava seu corpo. Era bom. A sensação era semelhante à que sentia quando sua mãe o abraçava; o que será que ela estava fazendo naquele momento? Será que está bem? Devia estar preocupada com ele. O garoto sentiu um aperto em seu coração, quanto mais pensava nela, mais forte era o aperto. Mas logo os pensamentos foram se diluindo, algumas duvidas brotaram em sua mente: “Onde estou?” “Como vim parar aqui?”. Não demorou para que ele recordasse o que havia acontecido, as cenas vieram todas de uma vez em sua cabeça, o pronunciamento de Piatã, a confusão, o nativo louco; ele havia dito algo, mas ainda não se lembrava com clareza.
  Os pensamentos confusos de Joaquim foram interrompidos por uma voz suave e feminina.
  —Você acordou!
  A voz era de uma curandeira jovem, de cabelos longos e avermelhados. Ela se aproximava com um simpático sorriso em seu rosto.
  —Como se sente, mensageiro?
  Antes que pudesse se aproximar mais, Joaquim pulou da rede, tomando distancia da nativa e a encarando com as sobrancelhas serrilhadas, pavor no olhar e punhos fechados.
  —Fique longe de mim! —exclamou o garoto.
  A reação de Joaquim fez a curandeira se assustar e parar de avançar, ela ficou confusa, mas logo voltou a se aproximar, dessa vez de maneira mais cautelosa.
  —Qual o problema, mensageiro? —perguntou com uma voz ainda mais suave e afetuosa.
  —EU MANDEI FICAR LONGE! —Joaquim gritou, agarrando um frasco de vidro que estava em cima de um toco de árvore usado como mesa e o arremessando na direção da Nativa.
  O frasco acertou em cheio a curandeira que ergueu seus braços para proteger-se, mas ainda assim foi ferida pelos estilhaços. O liquido que estava dentro do frasco escorria pelos cortes, os fazendo arder ainda mais, parecia conter acidez. A curandeira correu até um canto da oca onde havia um cano de bambu, ela puxou uma alavanca que estava ao lado, o que fez água sair pelo cano e assim ela pode lavar seus ferimentos, lavava de maneira desesperada, sua expressão deixava nítida a dor que estava sentindo.
  Joaquim a observava um tanto preocupado, mas sem demonstrar. Ele não queria feri-la, mas alertou para que se afastasse e mesmo assim ela continuou se aproximando, ela não parecia uma ameaça, mas por que confiaria nela? Ela era igual aos outros e depois de ver o que fizeram com aquele caçador... em quem ele poderia confiar? A ansiedade tomava conta de sua mente, seu coração batia mais rapidamente, o corpo tremia, as penas bambeavam e lágrimas umedeciam seus olhos.
  Desviando o olhar para a saída, Joaquim viu alguém se aproximando, alguém grande e forte, parecia um monstro, quem era aquele que mesmo mal podendo identificá-lo, o intimidava apenas com sua presença? Assim que a figura adentrou a oca, os olhos de Joaquim se arregalaram, e por um breve momento, sentiu seu corpo parar de tremer como se estivesse congelado, mas seu coração passou a bater ainda mais forte.
  —Saudações.
  A curandeira virou-se num susto e respondeu sem jeito.
  —Saudações, grande Piatã.
  Em silêncio, Piatã analisou a cena, seus olhos encontraram os cacos de vidro no chão, então foram direto de encontro à curandeira, onde notou os ferimentos e a maneira como tentava cobri-los com as mãos e por fim, levou seu olhar frio até Joaquim, um pequeno garoto assustado que mal conseguia cerrar os punhos, o medo em seu olhar gritava, pobre criatura frágil, para um ser divino, era decepcionante.
  —O que houve aqui? —perguntou Piatã, ainda fitando friamente Joaquim.
  —Nada —respondeu a curandeira —, nada com o que deva se preocupar, grande Piatã.
  Piatã encarou a curandeira, levantou sutilmente o braço e apontou para seus ferimentos.
  —Está ferida.
  —Foi apenas um acidente, como disse, nada com o que deva se preocupar.
  Piatã a encarou serrilhando os olhos.
  —Certo —disse o caçador, abaixando o braço e desviando seu olhar para Joaquim, que continuava apenas o encarando com os olhos arregalados e sem se mover —, como está o mensageiro? Melhor?
  —Ele está bem, grande Piatã, apenas um pouco agitado.
  —Ótimo, preciso que me acompanhe.
  Joaquim continuou em silencio e imóvel, ainda encarando Piatã que esperava por uma resposta.
  —Algum problema, mensageiro? —perguntou Piatã.
  —Fica longe de mim —disse Joaquim, em um tom baixo, quase como um sussurro, enquanto rangia os dentes.
  —O que disse? —Piatã.
  —MANDEI FICAR LONGE DE MIM! —Joaquim gritou.
  Piatã o encarou em silêncio, sem desfazer sua expressão séria em nenhum segundo sequer.
  —Como desejar —respondeu o caçador —, apenas me acompanhe.
  —EU NÃO VOU À LUGAR ALGUM! —Joaquim voltou a gritar.
  Piatã encarou Joaquim serrilhando os olhos, olhou para a curandeira, que imediatamente virou a cabeça, desviando o olhar para o chão e então voltou a olhar para o garoto.
  —São ordens do chefe Tabajara. —disse Piatã, numa tentativa de convencer o menino.
  —EU NÃO VOU! EU SÓ SAIO SE FOR PRA VOLTAR PRA MINHA CASA!
  Piatã respirou fundo, passou a língua entre os dentes, coçou atrás de suas grandes e pontudas orelhas direitas com a mão esquerda e voltou a olhar para a curandeira.
  —Pode nos deixar a sós? —pediu o nativo.
  —C-claro. —concordou a curandeira, que logo em seguida saiu da oca em passos rápidos.
  Piatã voltou a fitar Joaquim que o encarava de volta com uma expressão de raiva, mas o medo persistia em seu olhar.
  Sutilmente Piatã começou a se aproximar do garoto, enquanto Joaquim dava pequenos passos para trás, tentando manter a distância.
  —FALEI PRA FICAR LONGE DE MIM!
  Mesmo com os gritos de Joaquim, Piatã continuou se aproximando. Joaquim continuou se afastando, mas percebendo que Piatã iria continuar, parou, cerrou os pulsos, tomou impulso e foi para cima do nativo, desferindo um soco de direita em seu abdome, mas o couro que o cobria, seu físico e a pouca força de Joaquim, evitaram que o caçador sentisse qualquer coisa. Mesmo assim, o ataque do garoto o fez parar e como consequência, a criança sentiu dor em seu punho, deixando transparecer em sua expressão. O menino recolheu sua mão direita e começou a acaricia-la com a esquerda tentando fazer com que a dor passasse.
  Piatã continuou apenas o encarando por alguns segundos, até um pequeno, quase que imperceptível, sorriso brotar no canto de sua boca e então dizer:
  —Você me agrediu.
  Joaquim voltou a olhar para Piatã com o mesmo olhar assustado, mas dessa vez o garoto deixou uma lágrima escapar e escorrer por seu rosto.
  —Curioso —prosseguiu Piatã —, como pode um ser divino ser tão fraco e frágil? Talvez esteja se contendo por se achar superior a mim, mas não é isso que aparenta estar ocorrendo aqui. Bom, confesso que agora estou curioso para descobrir.
  Joaquim continuou apenas encarando Piatã, assustado como uma pequena presa prestes a ser pega por um predador, e como qualquer presa, seu instinto gritava dentro de si ordenando que fujisse, mas seu corpo continuava imóvel.
  —Eu não sei como isso funciona em sua terra, mas aqui, caso alguém lhe bata, você tem o direito de bater de volta. É justo, não concorda?
  Joaquim permaneceu em silencio.
  —Ora, já ia me esquecendo, o chefe Tabajara ordenou que eu viesse busca-lo para levar-te até onde está instalado. Eu não posso desobedecer uma ordem do chefe, mas você é um ser divino, um mensageiro dos deuses, esta acima de todos e isso inclui nosso chefe, ou seja, tua palavra se sobressai a dele, caso prefira que fiquemos aqui para resolvermos este nosso desentendimento, basta falar, porém, se preferir, pode me acompanhar até a instalação do chefe e então deixamos isso para outro momento mais conveniente. Como será?
  Após fazer sua escolha, Joaquim acompanhou Piatã até a instalação onde Tabajara se encontrava. Se manteve em silêncio por todo o caminho, até chegar na instalação, onde avistou Tabajara deitado sobre uma rede, com um curativo feito de plantas em sua barriga, conversava descontraidamente com a curandeira que o acompanhava até notar a presença de Joaquim e Piatã, que entravam na oca.
  —Saudações, meu chefe. —Piatã foi o primeiro a cumprimentar.
  Percebendo que o líder e o mensageiro haviam chegado, a curandeira se retirou da instalação.
  —Saudações, meu líder, saudações, grande mensageiro Joaquim.
  Joaquim hesitou antes de responder; respirou, engoliu seco e então cumprimentou de volta.
  —Oi.
  —Santa Árvore Dourada —disse o chefe —, mil perdões por permitir que presenciasse aquele ocorrido. Como já havia dito, os demônios não nos deixarão descansar, mas graças aos deuses conseguimos detê-lo e impedir que algo pior acontecesse.
  —Aquele homem... então ele era mesmo um demônio? —Joaquim questionou em um tom baixo.
  —Bom, não há como um homem ser um demônio, Peri era um homem, mas aquilo não era mais Peri, era apenas um maldito demônio covarde que tomou posse de seu corpo. —Tabajara respondeu.
  —Por isso vocês o mataram?
  —Como? Não, meu mensageiro, nós não tiramos vidas, nós o purificamos, tiramos seu espirito de seu corpo e os entregamos aos deuses, para que fosse limpo e livre da espurcícia do demônio.
  —Entendi —Joaquim não havia acreditado em nenhuma palavra dita pelo chefe.
  —Como podemos ajudar, meu chefe? —perguntou Piatã, que apenas observava Tabajara e Joaquim conversando até então.
  —Ah, sim —Tabajara respondeu se sentando na rede, com dificuldade, graças a dor que ainda sentia em sua ferida —, como podem ver, aquele maldito demônio ainda conseguiu fazer um estrago, não se preocupem, ficarei bem graças à ajuda de nossas maravilhosas curandeiras e a tua também, meu líder, muito obrigado.
  —Estou aqui por ti, meu chefe.
  —Enfim, sem delongamento algum, terei que ficar algum tempo afastado de minhas atividades como chefe da aldeia caso queira me recuperar rapidamente, por isso, peço a ti, meu grande líder, que auxilie o grande mensageiro enquanto ele administra nossa aldeia em meu lugar, até que eu me recupere.
  O pedido do chefe surpreendeu Piatã e Joaquim.
  —Como?! —Piatã indignou-se.
  —O que? —Joaquim estava boquiaberto e confuso —Você quer que eu seja o chefe?
  —Sim, meu mensageiro, quem seria melhor do que o próprio mensageiro dos deuses, uma entidade divina, para coordenar nossa aldeia, ainda mais em tempos difíceis e com demônios nos atentando, essa é a melhor opção que me vem em mente.
  —Mas meu chefe —Piatã se indignava a cada palavra que o chefe proferia —, o mensageiro mal chegou em nossa aldeia, ainda não conhece tudo sobre este lugar, nosso povo, nossa rotina, costumes... tem certeza que esta é a melhor opção?
  —Sim, meu líder, estou ciente de tudo isso, por isso solicitei que o auxiliasse.
  —Mas chefe...
  —Sem “mas", Piatã, esta é minha ordem, cabe a você cumpri-la. E você mensageiro? Tem mais alguma dúvida?
  —É que... —Joaquim estava pensativo — eu acho que não vou ficar por muito tempo, então não sei se é uma boa ideia.
  —Como não, grande mensageiro? Todo esse ocorrido só mostra mais como tua presença aqui faz parte do plano perfeito de nossos deuses, eles previram tudo isso e para isso lhe mandaram, nosso povo precisa de ti, grande mensageiro Joaquim!
  Joaquim pensou por mais alguns segundos, então levantou seu olhar até Piatã, que o olhava apreensivo, aquela situação o incomodava, estava perplexo, então, notando isso, Joaquim sorriu.
  —Tudo bem —respondeu o garoto —, eu vou ser o chefe da vila até você ficar bem.
  Os olhos de Piatã se arregalavam enquanto o sorriso de Tabajara crescia.
  —Maravilhoso, meu mensageiro! Que assim seja, entrego nossa aldeia em tuas mãos!
  —Você não vai se arrepender, chefe Tabajara. —Joaquim respondeu enquanto olhava para Piatã com um sorriso malicioso em seus lábios.
  Joaquim e Piatã despediram-se de Tabajara e se retiraram da instalação. Do lado de fora, avistaram Niara, que estava sentada no chão brincando com insetos.
  —Oi, Niara. —Joaquim a cumprimentou.
  Percebendo o presença de Joaquim e Piatã, Niara se levantou rapidamente e estampou um grande sorriso no rosto.
  —Saudações, líder Piatã, saudações, Juquim!
  —O que faz aqui, pequena Niara? —questionou Piatã —Já esta tarde, deveria estar em casa.
  —É que o Juquim vai dormir lá na minha casa, mas ele não sabe onde é minha casa, então eu fiquei esperando ele acordar do lado de fora da instalação dele por um tempão, ai fiquei com fome e fui pegar algumas frutas numa árvore ali perto, era uma árvore bem ruim de subir, mas eu consegui, porque sou muito boa subindo em árvores. Ai peguei umas frutas, comi e levei algumas pro Juquim também, mas quando cheguei na instalação dele pra ver se ele já tinha acordado, não tinha mais ninguém lá, ai eu perguntei pra um guarda onde ele tava e ele disse que não sabia, ai perguntei pra outro e ele não sabia também ai vi o Sr.Amonati e ele disse que viu vocês vindo pra cá, ai eu cheguei aqui e fiquei esperando vocês saírem enquanto brincava com esses bichinhos aq... ah, perdi os bichinhos.
  —Entendi —Piatã respondeu —, então podem ir agora, como já disse, esta tarde.
  —Vamos sim, grande Piatã. —Niara segurou Joaquim pelo braço —Vem Juquim.
  Antes de ir com Niara, Joaquim parou e olhou para Piatã.
  —Ei, Piatã! —Joaquim o chamou.
  Piatã, que já se dirigia para outro lugar, olha para trás na direção de Joaquim.
  —Boa noite pra você! —Joaquim diz num tom de deboche e uma expressão sarcástica no rosto.
  Sem responder, Piatã serrilha as sobrancelhas, da as costas e volta a caminhar.
  —Vamos logo, Juquim! —Niara apressava o garoto puxando-o pelo braço.
  —To indo —Joaquim respondeu enquanto seguia Niara.
  —Você ta melhor? —a menina perguntou.
  —Sim —ele respondeu.
  —Que bom, eu tomei o maior susto, achei que você tinha morrido, fiquei bem preocupada, imagina só, mal nos tornamos amigos e você já morre, eu ia ficar bem triste.
  —Não somos amigos, nos conhecemos a muito pouco tempo pra isso.
  —E quando é que vamos ser amigos, então?
  —Não sei... talvez quando sentirmos que somos amigos.
  —Eu sinto que somos amigos, Juquim.
  —Mas eu não, então não somos.
  Niara se calou por um minuto, estampando uma expressão triste enquanto olhava para baixo, a resposta de Joaquim claramente havia a chateado.
  —Entendi. —ela respondeu baixo.
  Percebendo a mudança repentina de humor de Niara, Joaquim a olhou serrilhando as sobrancelhas, percebeu que a havia magoado, então mudou de assunto.
  —Eu sou o chefe da vila agora.
  —O que?! —Niara exclamou surpresa, parando de caminhar.
  —Disse que sou o chefe da vila... —Joaquim repetiu, também parando de andar —pelo menos por um tempo.
  —Você ta falando sério, Juquim? —Niara perguntou enquanto se aproximou mais de Joaquim e o apertou pelos braços —Ou só não ta muito bem ainda e ta alucinando? Quer que eu chame uma curandeira?
  —Eu estou bem e estou falando a verdade, foi por isso que o chefe chamou eu e o Piatã.
  —Santa Árvore Dourada! —exclamou alegre a nativa, soltando o garoto e puxando os próprios cabelos —Isso é muito legal, Juquim!
  —É... acho que é. —Joaquim respondeu indiferente.
  —Espera, isso significa que você vai ficar muito ocupado e não vamos ter muito tempo pra passarmos juntos... mas também significa que vai ficar mais tempo aqui, certo?
  —Não sei, não pretendo deixar minha mãe sozinha por muito tempo, vou ficar preocupado com ela e ela vai ficar preocupada comigo.
  —É verdade... —Niara respondeu pensativa —Ei! Falando em mãe, vamos logo pra minha casa pra eu apresentar meus pais pra você!
  Niara saiu correndo animada na frente de Joaquim, mas logo notou que o garoto não estava a acompanhando, ele continuou parado, apenas a encarando, o que a fez parar.
  —Algum problema, Juquim?
  —Você disse que os seus pais... eles foram purificados, não foram?
  —Foram sim.
  —E ainda moram com você?
  —Sim... não são mais como antes... mas já me acostumei, vamos logo pra você ver eles!
  Joaquim continuou hesitando, tinha medo do que encontraria ao chegar na casa de Niara, mesmo assim, engoliu seco, respirou fundo e seguiu a garota.
  A casa não ficava tão longe, era uma pequena oca próxima á uma das saídas da aldeia, totalmente enfeitada por diversos tipos de flores e plantas e rodeada por um grande jardim.
  Entrando na casa, podia-se ver ainda mais flores cobrindo por completo as paredes, havia uma pequena rede num canto com um grande baú do lado e em outro canto havia um cano e uma alavanca, semelhantes aos que Joaquim havia visto na instalação onde havia acordado.
    Passando seus olhos por cada detalhe da casa, Joaquim notou dois objetos brilhantes em meio a imensidão de flores das paredes.
  —O que achou da minha casa, Juquim? Foi eu que decorei, deu um trabalhão, mas valeu bastante a pena, não concorda?
  —Tem muita flor. —Joaquim respondeu, sem tirar seus olhos das pedras brilhantes.
  —Eu sei! Eu amo flores, são bem bonitas, não são?
  —Não gosto muito de flores.
  —Sério? Que pena, eu amo, amo muitão mesmo, um tantão assim. —Niara abria seus braços, esforçando-se para esticá-los o máximo que podia.
  —E aquelas coisas ali? —Joaquim perguntou apontando para as pedras.
  —É mesmo! —exclamou a menina, após olhar para o que Joaquim estava apontando, então saiu correndo em direção das pedras, as arrancou da parede e voltou correndo para perto de Joaquim, mostrando os objetos para o garoto; dois cristais com uma leve iluminação interna e com um pequeno círculo vermelho desenhado, parecia ser sangue. —Esses são meus pais, Juquim.
  —Seus pais? —Joaquim questionou com estranheza.
  —Sim, depois que alguém é purificado e o chefe consegue recuperar seus espíritos, podemos escolher novos corpos pras pessoas que foram purificadas, pelo menos até a Grande Árvore Dourada os trouxer de volta, eu escolhi esses cristais que minha mãe encontrou em uma viagem, eles ficaram bonitos, não ficaram?
  Joaquim ficou em silencio, olhou os cristais por mais um momento e então levantou o olhar para Niara, a encarando com pena; pobre garota ingênua, como podia acreditar naquilo?
  —Tudo bem, Juquim? —perguntou ao notar a expressão diferente do garoto.
  Joaquim forçou um pequeno sorriso.
  —Ficaram muito bonitos, sim.

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