P R E L Ú D I O

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 Havia no Universo cinco camadas de mundo, sendo a última — ou mesmo a primeira — denominada Asiyah, o Mundo da Ação.

Este lugar não guardava a vida dos mais fortes ou mais inteligente, nem mesmo os mais bonitos, mas tinha algo de especial, algo inegável: Asiyah era o ponto de partida, o destino, e a ponte entre ambos, sendo uma só camada suportando dois espaços eternamente entrelaçados. Naturalmente, tratava-se de um terreno fértil para o nascimento e desenvolvimento de seres distintos, os chamados Ishim, os sábios de olhos abertos, que podiam transitar pela Ocultação, entre a Asiyah Ruchni, onde andavam os espíritos, e a Asiyah Gashmi, terra dos corpos de carne e osso.

Não era, no entanto, grande coisa aos olhos dos seres que viviam nas camadas superiores. Para aqueles que flutuavam livres pelo universo sem qualquer impedimento corpóreo, encontrar um Filho do Homem que podia vê-los e interagir com eles, era como olhar para uma criança sonhadora vestida de soldado em um desfile militar.

Contudo, nem todos pensavam assim.

Acima de onde habitavam os espíritos, viviam os Bene Elohim, criaturas de forma impressionante, dotados de atributos inegáveis, como força, inteligência e graciosidade. Estes seres seriam conhecidos por nós, de forma geral, como anjos e sua morada era a camada Yetzirah, o Mundo da Formação. Estes anjos em muito se assemelhavam aos Filhos do Homem, porém, diferentemente dos mesmos, estes eram avançados em ciência e tecnologia e, por serem os mesmos desde o início dos tempos, não tinham a necessidade de se unir em pares, tampouco sentiam tal ímpeto, e se tratavam como companheiros.

Destes destacava-se um grupo celeto, criado mesmo antes da aurora humana, que montava guarda nas fronteiras entre Yetzirah e Asiyah. Eles eram chamados de Vigilantes e serviam como recurso efetivo em combate, sendo então liderados por Samyaza.

Os Vigilantes dificilmente precisavam deixar seus postos, mesmo a última vez que isso aconteceu fora tanto tempo antes que a terra onde viviam os humanos era completamente diferente. Todavia, hora ou outra isso teve que acontecer, e quando os anjos finalmente trespassaram a Ocultação, entre as fendas que desenhavam o Oriente Médio, ficaram maravilhados com tudo que viram.

Os guerreiros, impressionados, decidiram passar mais algum tempo naquela Terra.

Naquele tempo os humanos ainda estavam em sua tímida alvorada social, e os homens que ali viviam eram poucos e carentes de perspicácia intelectual, mas eram curiosos e suas almas eram vigorosas. Eles viviam em paz entre si, até onde se era possível, e não carregavam consigo grandes ambições. Por este motivo, até aquele momento, este mundo era pacífico e calmo e os anjos puderam passear por lá sem grandes problemas.

Após esse momento, os Vigilantes voltaram a visitar Asiyah algumas vezes. Até que um dia, reunindo-se os vinte líderes sob o comando de Samyaza no topo de um monte altíssimo, um deles — só o próprio saberia qual, ou talvez nem mesmo ele depois de tanto tempo — declarou que não voltaria mais a Yetzirah, que viveria ali, como um humano. Houve uma grande discussão, a ideia não só era absurda como pecaminosa, não havia como um ser do mundo deles, que sequer tinha um corpo físico, simplesmente viver ali, ia contra as regras originais.

Mas a discussão não durou muito, pois com a ideia dita em voz alta, todos se deram conta de que compartilhavam do mesmo desejo. Por mais que temerosos às consequências, no fundo, todos eles estavam cansados da monotonia de uma existência contínua, sem início, meio ou fim, sem propósito pessoal ou vontades individuais.

Um pequeno grupo se precipitou e um deles disse:

— Vamos ficar aqui, está decidido. Vamos nascer de ventres humanos, crescer entre os seus grupos, ter nossas próprias famílias. E quando nossa pele for fina e os ossos e músculos frágeis, nós aceitaremos a morte com satisfação.

A Ordem Grigoriana (Os Vigilantes #1)Onde histórias criam vida. Descubra agora