Casa do doutor Martin Hardy, Atlanta, Geórgia, agosto de 2030.
O que eu gostaria mesmo de saber era como as pessoas conseguiam lidar com a vida adulta. Tanta correria, tanta responsabilidade, tantas decisões importantes. A verdade era que eu não sabia o que fazer.
Decidir o que eu realmente queria não era uma escolha fácil - pelo menos não para mim. Eu estava completamente perdida num mundo onde todos pareciam já saber para que existiam.
A tentativa frustrada da doutora Sarah Twain de fazer uma geração perfeita havia falhado, o que me fazia perceber o tamanho da liberdade que eu tinha de ser o que quiser e da minha própria maneira. Eu só precisava descobrir como.
"Acredite em mim. Estou me perdendo, tentando competir com todo mundo ao invés de ser apenas eu. Não sei para onde ir. Estive presa nesta rotina. Eu preciso mudar o meu jeito ao invés de ser fraca".
Eu sussurrava baixinho a letra daquela canção tão antiga que tocava nos alto-falantes do meu quarto. Era incrível como ela mexia comigo. A música refletia uma realidade que era a minha: indecisão.
Desde que Sarah foi presa, tudo o que eu consegui fazer foi me formar. Eu nunca tinha ido à escola antes. A parte complicada foi que ninguém sabia em que série me colocar. Pediram que eu fizesse uma prova para medir os meus conhecimentos. Terminou que só estudei um semestre e recebi um certificado digital. Em outras palavras, não gostei da escola.
Aaron não se surpreendeu em me ver sair do colégio tão rápido, disse que eu era um gênio em ascensão. Ele ainda continuava a me fazer rir mesmo depois de três anos de namoro. O filho de Astrid tentava não deixar o relacionamento cair na monotonia, sempre me levando para lugares inusitados, mas dessa vez, ele era quem ia na garupa da moto. No verão, me ensinara a pilotar a Papa-Léguas.
Depois de muita insistência, Martin me deu uma moto – pequena e inferior a de Aaron. Em troca do presente, eu deveria prestar serviços ao Departamento de Transmutação Genética, cuidando em dar continuidade ao trabalho da minha mãe com os nano-robôs. Meu refúgio, desde então, era o Cento de Auxílio a Meta-Humanos, o único lugar onde me sentia em casa e com pessoas que, em partes, eram como eu.
A música que eu estava ouvindo já havia se repetido umas dez vezes quando percebi alguém ao lado da minha cama. O susto me fez sair do transe em que me encontrava e gritar. Meu coração disparou descompassado enquanto eu contemplava furiosamente o pequeno invasor de cabelos espetados.
— Você sempre demora tanto para se levantar! — ele disse com sua voz fina e infantil. — Tem noção de quantas vezes você repetiu essa música? Eu até já aprendi. Olha só... — começou a passear pelo quarto balançando os braços como se fosse voar. — Não sei para onde ir. Estive presa nesta rotina. Eu preciso mudar o meu jeito ao invés de ser fraca... Eu sou Chloe Williams e estou perdida no tempo... — completou com a voz boba e o rosto franzido.
Pode me dizer como você entrou aqui? — perguntei.
— Ah! Então é assim que você recebe o seu irmãozinho? — indagou se jogando na minha cama. — Pensei que você fosse mais educada...
— Shiu! Estou raciocinando...
— De novo? Irmã Chloe você sempre pensa demais... — afirmou revirando os olhos.
Entrou aqui ontem à noite não foi? — encarei-o com o cenho franzido. Esperei. O garoto ligeiro abaixou a cabeça e enfim concordou.
— Ah, Chloe... — murmurou. — Você sabe que eu não gosto de dormir no CAM. Tem um esqueleto muito sinistro lá que fica me encarando toda a noite.
— Não precisa olhá-lo de volta. Eu já te disse, basta fechar os olhos. — seus olhos vivos e suplicantes encontraram os meus. Eu sabia o que ele queria. — Tudo bem, menino Flash, pode deitar!
Ben, conhecido como Trem-Bala, se jogou para trás e apoiou a cabeça no travesseiro. Entremente se ajeitava, suas pálpebras recaíram sobre os olhos, pareciam cansados.
Benjamin era órfão, perdeu os pais num acidente de uma usina nuclear. O garoto foi exposto a uma quantidade suficiente de gás radioativo que poderia matá-lo, como aconteceu com seus pais. Porém, deu a ele uma habilidade fora do comum: velocidade.
O garoto velocista foi quem fez eu me sentir em casa no CAM. Sua insubordinação me fazia ver nele um semelhante. Quando eu olhava para ele, era como olhar para um espelho refletindo uma versão masculina minha. Aprendi a amar aquele menino.
— Você está olhando para o nada com aquele olhar vazio outra vez. — Ben quebrou o silêncio.
— Não é nada — afirmei sem muita convicção. — Agora me diz o que o pessoal do CAM vai dizer quando sentir sua falta.
— Eles não me viram sair, eu sou rápido! — me deu uma piscadela.
Outra voz ecoou no quarto e dessa vez não era humana.
Chloe Williams! — era Kassandra, a assistente pessoal da casa, sua voz saía nos alto-falantes. — Aaron Hall quer saber se pode entrar no quarto.
Vi quando Ben se assustou do meu lado e arregalou os olhos para mim.
— Ele veio me buscar! — exclamou e correu para debaixo da minha cama, onde vinha se escondendo.
Sem opções, fui obrigada a autorizar a entrada.
— Abrir porta! — falei e logo o vi.
Aaron abriu um enorme sorriso quando me viu, todo o seu rosto se iluminou. Ele tinha uma luz própria e eu não me cansava de olhá-lo. Seus cabelos estavam molhados e enquanto se aproximava, concluí que ele deveria ter saído do banho a pouco. Aaron tinha trocado o perfume, mas ainda continuava com o mesmo cheiro fresco de quando nos conhecemos.
— Bom dia, minha linda! — cumprimentou e se aproximou para me beijar. — Vou te beijar na bochecha só porque você diz que eu não sou obrigado a sentir o seu hálito matinal.
Eu ri e ele tocou os seus lábios quentes no meu rosto. Em outra ocasião eu não titubearia em deixá-lo me beijar.
— E então... vai me dizer o motivo da sua visita tão cedo? — perguntei.
— Então quer dizer que não posso simplesmente vim ver a minha namorada pela manhã? — ele juntou as sobrancelhas numa expressão de dúvida e depois sorriu.
— Eu não disse isso. É claro que você pode vir me ver, mas é que você sempre está no trabalho a uma hora dessas. — disse e segurei sua mão. Aaron estava sentado na beirada da cama. — Eu estou falando com um cara muito importante da Larson's Tecnology.
— Claro que sim! Foi você que me ensinou — ajeitou a postura convencido. — Agora falando sério, o doutor Stewart me disse que o Trem-Bala saiu dos trilhos. Se é que me entende! — ele riu. — Imaginei que dos seus lugares de fuga, o preferido seria aqui no seu quarto. Não o viu por aí? — olhei-o com desconfiança.
— De nada sei...
— Muito bem, é assim que você quer jogar, não é? — Aaron perguntou e se levantou, indo em direção ao closet.
Depois de vasculhar o cantinho das minhas roupas, eu sabia que Aaron não demoraria para olhar embaixo da cama. Ele se aproximou e se abaixou. Seus olhos encontraram o menino.
— Eu achei você! — Aaron exclamou. — Agora sai daí e vem aqui me dar um abraço.
Relutante, Ben saiu de sob a cama e correu para abraçar o meu namorado. Com um movimentar de dedos, eu ergui o garoto no ar, seus pés deixaram o chão. Aaron acabou envolvendo o vento com os braços enquanto o menino veloz caía na gargalhada pairando sobre sua cabeça.
— Você me paga, Garota X! — Aaron jurou e então eu soltei o Ben, que caiu em seus braços.
Esse foi o primeiro capítulo e em breve: novidades.
Não se esqueçam de deixar a estrelinha!
Beijos no coração de vocês!
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Garota X: O Gene da Cura
Подростковая литератураTrês anos após ter fugido do Departamento de Transmutação Genética, Chloe Williams nunca pensou que sua vida se tornaria tão monótona e confusa. Ela conheceu o mundo e se tornou livre, mas não sabe o que fazer com tamanha liberdade. Manter um legado...