Capítulo VII

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Tisha virou-se na cama, ficou de bruços e escondeu sua cabeça no travesseiro numa tentativa de lutar contra a sensação de despertar; ela tinha a impressão de estar envolvida numa deliciosa e morna nuvem de contentamento e não queria, de maneira alguma, quebrar a magia daquele momento. E dormiu, envolvida pelo prazer.
De maneira intensa, sua mente lembrou-se dos acontecimentos da noite anterior, quando Roarke tinha conseguido despertar a chama latente da paixão existente dentro dela, mas se afastou, antes que ela pudesse satisfazer os ímpetos que esta chama lhe impunha. Tisha não sabia dizer se estava contente ou não com o rumo tomado pelos incidentes da noite anterior. Começou a observar os raios de sol que se infiltravam pelas cortinas da janela. Após muito pensar, chegou à conclusão de que estava satisfeita, sim. Não restava a menor dúvida, tinha conseguido perturbar fisicamente a placidez de Roarke. Mas uma nova dúvida surgiu em sua mente: teria conseguido perturbá-lo por ser simplesmente uma mulher jovem e atraente ou por ser um ser humano registrado e individualizado pelo nome Patrícia Caldwell?
Um pequeno suspiro escapou quando se deparou com esta pergunta impossível de ser respondida. No momento, não tinha a mínima vontade de tentar avaliar e compreender todos os porquês e todos os portanto. Haveria tempo suficiente para fazer isto mais tarde. Por enquanto, a única coisa que queria fazer era encontrar Roarke, para ver se com a luz radiante do dia ensolarado haveria alguma modificação nas suas reações em relação a ele e vice-versa.
Um pouco relutante, levantou-se da cama e dirigiu-se para o banheiro, e vestiu as suas roupas.
Cantarolando uma música alegre, ela saiu rapidamente do quarto, os olhos e os ouvidos atentos para perceber qualquer sinal que lhe indicasse onde estava Roarke. Uma lâmpada acesa na entrada do escritório chamou sua atenção e ela se aproximou, tomando cuidado para não fazer muito barulho. Quando olhou para dentro, viu que Roarke estava debruçado sobre sua prancheta de desenho, a cabeça apoiada sobre os braços e um cobertor jogado sobre os ombros. A canção morreu na sua garganta quando ela entrou no escritório.
— Bom dia — disse Tisha, com um sorriso.
— Você acha que o dia está tão bom assim? — murmurou ele, espreguiçando-se.
— Pelo menos não está chovendo — respondeu com certa hesitação na voz.
— Eu imagino que você não deve ter feito café — resmungou ele.
— Eu acabei de levantar.
— Bem, então vá fazer café agora.
Sua sensação de felicidade estourou como uma frágil bolha de sabão. A não ser para um rápido olhar de reconhecimento, ele nem sequer tinha olhado para ela!
— Eu vou fazer café porque estou com vontade de tomar uma xícara — declarou ela. — Se você quiser tomar um pouco também, terá de ir até a cozinha.
Irritada com a falta de educação dele, ela saiu do escritório. Alguns minutos mais tarde, após ter aberto e fechado quase todos os armários da cozinha, encontrara a cafeteira, que ela encheu de água, acrescentou o pó e ligou na corrente; agora estava sentada numa cadeira, rígida como uma tábua, esperando que o café ficasse pronto.
Quando Roarke entrou na cozinha, a cafeteira estava justamente acabando o seu trabalho automático.
— O café está pronto — anunciou ela, levantando-se para pegar uma xícara para si.
— Você quer suco, torradas, ou qualquer outra coisa? — perguntou ele.
— Não, muito obrigada — respondeu com frieza.
— Bem, então, pelo menos faça o favor de não me morder.
— É muito fácil evitar que isto aconteça: basta me tratar com um pouquinho de educação. Se você passou a noite toda acordado trabalhando ao invés de dormir, não venha descontar o seu mau humor em mim!
— Acontece que o sofá é muito pequeno. Eu gostaria de ver como é que você dormiria nestas circunstâncias.
— Não é culpa minha — respondeu ela, levantando os ombros.
— Pelo que me consta, você estava dormindo na única cama disponível — observou ele, recostando-se negligentemente no balcão da cozinha, enquanto sorvia seu café em pequenos goles.
— Você poderia…
— Eu poderia ter feito… o quê? — perguntou ele, com muita calma.
— Você poderia ter dormido na cama e eu teria dormido no sofá — concluiu ela.
— Ou, então, eu poderia ter dormido na cama, ao seu lado — disse Roarke, agora bem próximo dela.
— Eu não quis dizer isto.
As mãos dele desceram até a cintura dela e a puxaram para perto de si. — Mas eu poderia ter ficado com você, não poderia?
Um arrepio de desejo percorreu o corpo de Tisha quando sentiu sua voz rouca e insinuante. Incapaz de emitir qualquer som, ela respondeu à pergunta dele com um gesto afirmativo de cabeça.
— E se eu tivesse feito isto — continuou Roarke — hoje de manhã você estaria planejando alguma maneira de segurar-me para a eternidade.
Foi como se, de repente, alguém tivesse colocado uma pedra de gelo sobre o seu coração. — Então, foi por causa disto que você não ficou comigo ontem à noite? — perguntou ela, num movimento que deixava bem claro o seu orgulho ferido. — Você teve medo que eu me transformasse numa mulher possessiva? Só por causa disto?
— Não faça de conta que tem tanta experiência assim, quando nós dois sabemos perfeitamente que a sua experiência não é tão vasta assim — respondeu ele.
— Uma vez que você dá tanto valor assim a uma mulher experimentada — disse ela sarcasticamente —, por que foi que você se deu ao trabalho de me beijar? Ou será que você estava apenas querendo se certificar de que não esqueceu ainda como é que se fazem estas coisas?
— Não. Não foi por causa disto. Quando uma mulher se desmancha diante de um homem, as reações dele são puramente instintivas. E, apesar da sua língua ser um bocado ferina, cabecinha de fogo, você é uma mulher que desperta o desejo nos homens.
— Pelo menos, isto quer dizer que você não me considera como sendo o supra-sumo do lixo — replicou ela.
— Eu não considero você como sendo o supra-sumo do lixo. A verdade é exatamente o oposto disto.
— Você está começando a falar muito e a não dizer coisa alguma. Não consigo compreender o que está pensando. Primeiro você diz que eu sou ingênua demais para você e logo em seguida insinua que sente muito desejo por mim. Será que você é incapaz de resolver o que é que quer mesmo?
— Eu sou capaz de resolver isto, sim — disse ele. — Mas e você? O que é que você sente em relação a mim?
— No momento eu o odeio com todas as minhas forças — replicou ela irritada, tentando afastar-se.
Roarke fez-lhe uma carícia sugestiva com as mãos sobre os lábios dela.
— Pois é, mas ontem à noite você teria permitido que chegássemos às últimas consequências.
Um suspiro longo escapou, no mesmo instante que a sua raiva se dissolveu completamente. Ela estava muito confusa por dentro. Seus olhos refletiam todo o tumulto interior quando procurou o rosto dele.
— É uma loucura, você não acha? — murmurou ela. — Eu odeio você e ao mesmo tempo… — e não conseguiu pronunciar o resto da frase.
— Cuidado — advertiu Roarke. Automaticamente suas mãos começaram a exercer uma pressão maior sobre ela, puxando-a para junto de si, até que os músculos firmes de suas coxas entraram em contato com o corpo feminino e suave dela. — Tudo o que você disser agora posso querer cobrar mais tarde.
Tisha não tinha certeza do que teria admitido se ela tivesse terminado a frase. Aquele amor não podia acontecer tão depressa assim; o amor também não permitiria que ela sentisse um antagonismo tão intenso em relação a ele.
— Seja lá como for, Roarke — disse ela, com muita suavidade na voz —, nós somos uma combinação de fatores altamente voláteis.
— Eu não poderia concordar mais com você.
O sorriso que ela percebeu estampado no rosto dele serviu para ampliar ainda mais a sensação deliciosa das mãos dele acariciando suas costas, puxando-a para perto dele, enquanto sua boca começava a se apossar dos seus lábios. O contato era ternamente possessivo, carinhosamente íntimo e sua duração foi curta demais. Mas o calor dos seus braços continuou exercendo um fascínio todo especial sobre ela, enquanto ele a beijava no pescoço.
— Bom dia, Tisha. Eu tenho a impressão de que não lhe respondi isto quando você entrou no escritório, não é?
— Pois é você não respondeu. — Tisha sorriu de encontro ao peito dele, já não se preocupava mais com suas reações ambivalentes em relação a ele. Deixou a cabeça pender para trás para poder encará-lo. — Você sempre fica tão mal-humorado quando acorda de manhã?
— Só quando na véspera sou obrigado a correr atrás de uma garota seminua dentro do meu próprio quarto — respondeu ele, sorrindo largamente.
Ouviu-se um estalido do trinco da porta e Tisha percebeu que Roarke ficou rígido ao lado dela. Impelida pela curiosidade, virou a cabeça para trás e olhou em direção à porta que estabelecia uma conexão entre a cozinha e a garagem. O choque a deixou paralisada durante alguns segundos.
— Papai! — exclamou ela, não acreditando no que via, ao mesmo tempo em que se desvencilhava dos braços de Roarke com certo sentimento de culpa. Ela percebeu a intensa raiva estampada no rosto de seu pai, mas ele não tirava os olhos do homem ao lado dela. — O que é que você está fazendo aqui?
Seu pai lhe lançou um olhar de profundo descontentamento e Tisha teve certeza absoluta dos pensamentos que estavam cruzando a mente dele. Sentiu que uma onda de vergonha inundou suas faces, enrubescendo-a.
— Papai, não é nada do que você está pensando — disse ela rapidamente. — Eu tive de passar a noite aqui porque havia uma árvore caída bloqueando a estrada e… e eu não podia ir a pé até a casa de Blanche em meio àquela tempestade toda.
— É engraçado — murmurou ele, com uma expressão irônica. — Eu vim de carro até aqui e não encontrei árvore caída alguma bloqueando a passagem.
Era impossível não ver o desafio estampado nos seus olhos fixos em Roarke, que enfrentava abertamente a evidente hostilidade do pai dela.
— A Prefeitura informou que mandaria uma equipe para remover a árvore, hoje de manhã, bem cedo. A equipe deve… deve ter vindo bem cedo mesmo — respondeu Tisha, mostrando certo nervosismo.
Blanche apareceu na porta, seus olhos repletos de simpatia procurando imediatamente por Tisha. — Eu sinto muito, meu bem. Ele chegou pela manhã. Eu não pude impedir que viesse até aqui. — Suas mãos ergueram-se num gesto que deixava bem claro que ela tinha tentado tudo, mas sem conseguir coisa alguma.
— Seu nome é Roarke Madison, não é? — perguntou Richard, e Roarke confirmou isto com um gesto de cabeça. — Patrícia, eu quero que você vá imediatamente com Blanche para casa.
— Papai, pare com isto! — exclamou ela. — Você está se comportando como se tivesse nascido no século passado. Só falta mesmo um revólver na cinta! Não aconteceu coisa alguma ontem à noite. Roarke, explique tudo para ele!
— Ah, sei! — exclamou seu pai, numa atitude de desafio. — Eu tenho certeza de que aquela pequena cena íntima que presenciei quando entrei aqui nada mais era do que uma demonstração do afeto puro, sincero e fraterno que você sente em relação à minha filha.
— Não foi nenhuma cena íntima! — protestou Tisha, batendo o pé no chão. — Ele estava simplesmente me abraçando.
— Eu já lhe disse para ir com Blanche para casa! — Havia um tom de ameaça na voz de seu pai.
— Não! — declarou ela, colocando-se firmemente no caminho dele. — Eu não vou sair daqui, enquanto você não resolver aceitar as nossas explicações.
— Eu não preciso das suas explicações! Eu vi muito bem o que estava acontecendo quando entrei aqui nesta cozinha!
— Pelo amor de Deus, papai! Eu sou sua filha. Você não quer ouvir o que eu tenho a dizer? — Tons de desespero e de frustração introduziram-se na sua voz. — Ou será que você está agindo assim, justamente porque eu sou sua filha? Porque sabe exatamente o que você teria feito nestas mesmas circunstâncias?
— Isto não passa de uma grande asneira! — explodiu ele. — E não tente desviar a minha atenção outra vez.
— Não estou querendo desviar a sua atenção. O que eu estou tentando fazer é outra coisa: é evitar que você se comporte de uma maneira tola!
Richard a encarou demoradamente durante um minuto, resistindo ao pedido implícito nos olhos repletos de lágrimas de sua filha. Seu olhar desviou-se, fixando-se agora em Roarke, que continuava em silêncio acompanhando os insólitos acontecimentos.
— O senhor Madison e eu vamos ter uma conversa em particular — declarou o pai de Tisha, esforçando-se para controlar a voz. — E quero que você, agora, vá para casa com Blanche.
— Não posso fazer isto. A bateria do meu carro está descarregada — replicou Tisha com teimosia.
— Neste caso, você pode ir com o meu carro — disse ele, mal-humorado.
— Eu é que faço o papel de vítima nesta farsa toda, não é? E isto, certamente, me dá algum direito de participar desta conversa em particular entre vocês, ou será que estou enganada?
— As mulheres são incapazes de discutir qualquer coisa de maneira inteligente, quando isso diz respeito às emoções. Você já está começando a ficar histérica agora — declarou ele num tom que não admitia réplica de espécie alguma.
— Ah! — Parecia que este som de irritação fora arrancado à força de sua garganta. — Você é que é incapaz de discutir qualquer coisa de maneira objetiva e inteligente! Você não estava presente aqui, ontem à noite, mas, no entanto, está firmemente convencido de que sabe tudo o que aconteceu entre nós, tim-tim por tim-tim.
— Eu não estou disposto a continuar tolerando a sua insolência! — explodiu o pai de Tisha. — Retire-se imediatamente desta casa!
— Eu não vou permitir que você fique aqui com Roarke! — exclamou ela, erguendo sua voz para alcançar o mesmo nível atingido pelo seu pai.
Ela ouviu um leve movimento atrás de si, logo seguido por uma mão que lhe tocava a cintura. — Eu sou perfeitamente capaz de resolver sozinho os meus problemas, cabecinha de fogo — declarou Roarke num tom de voz divertido.
— Pois eu estava começando a pensar que você é o tipo de homem que gosta de se esconder atrás das saias de uma mulher — disse Richard num tom ofensivo.
— Eu compreendo as suas preocupações em relação aos acontecimentos da noite passada, senhor Caldwell — replicou Roarke com uma calma impressionante. Seu olhar fixou-se rapidamente em Tisha, procurando transmitir-lhe um pouco mais de segurança. — E também concordo plenamente que será bastante difícil discutir a situação de uma maneira lógica, objetiva e inteligente enquanto a sua filha ficar junto de nós, tendo os seus ataques temperamentais regulares.
Ela ficou boquiaberta de espanto, sentindo-se traída pelas palavras dele:
— Eu não vou sair daqui!
— Ora, vamos — disse-lhe ele, empurrando-a um pouco. — Leve Blanche para casa. Tenho certeza de que seu pai e eu conseguiremos chegar a um acordo.
— Eu não vou.
— Você vai fazer exatamente o que o seu pai mandou — declarou Roarke com voz calma e firme ao mesmo tempo.
— E se eu não obedecer, o que é que você vai fazer? Vai me agarrar e me levar à força até o carro? — Sua voz foi perdendo a força, quando a expressão que ele tinha no olhar lhe trouxe à memória a lembrança do acontecimento da noite anterior quando ele, sem fazer muitas cerimônias, a tinha carregado debaixo do braço para dentro de casa.
— Se for necessário… — murmurou ele.
Tisha tinha sido derrotada e sabia disto. Um olhar em direção ao seu pai foi o suficiente para perceber uma expressão de respeito nos seus olhos em relação ao tom autoritário contido na voz de Roarke. Ele provavelmente iria aplaudir se Roarke utilizasse a força bruta para carregá-la para fora de casa, caso isto fosse necessário.
O veneno de suas palavras foi endereçado igualmente aos dois homens: — Pois eu acho que vocês são nojentos e repulsivos com estes seus ares de superioridade masculina! Vou embora, sim, mas vou porque não aguento continuar olhando para vocês sem ter vontade de vomitar!
Lágrimas amargas queimavam os seus olhos quando ela saiu da cozinha, seguida silenciosamente pela tia. Diante do carro do pai fez uma pequena pausa, mas depois se dirigiu resolutamente para o outro lado.
— Blanche, você pode dirigir o carro? — perguntou Tisha esforçando-se por recuperar o controle sobre seus nervos. — Estou tão furiosa que acabaria batendo em alguma coisa.
Seus dentes estavam começando a deixar marcas nas juntas dos seus dedos quando sua tia deu partida no motor e lentamente fez a manobra. Sentidas lágrimas de frustração e raiva começaram a lhe escorrer pelas faces.
— Eu nunca me senti tão humilhada em toda a minha vida. Mas por que é que papai tinha de aparecer justo naquele instante? Por que é que ele está sempre disposto a acreditar no pior?
— Ele sentiu falta de você, Tisha. Ele veio até aqui com a intenção de passar o dia junto com você — disse Blanche.
— Pois, neste caso, eu teria preferido que não viesse. Não o quero ver na minha frente! Nunca mais! — declarou ela, furiosa. Seus ombros caíram, num gesto de derrota. — Eu não tinha a intenção de dizer isto. Ele é meu pai e eu gosto muito dele. Mas por que é que ele não consegue ter confiança em mim?
— Não é em você que ele não tem confiança. É no Roarke. Sejamos objetivas: se Roarke fosse um velho de sessenta anos, barrigudo e careca, seu pai nunca teria chegado às conclusões que chegou. E se, como você mesma diz, ele entrou na cozinha e encontrou você nos braços de Roarke, parece-me bastante normal que tenha chegado à conclusão óbvia. Você não pode se esquecer de que o seu pai é um homem que provavelmente conseguia acabar com as objeções levantadas por uma porção de mulheres. O mais lógico é que ele tenha imaginado que Roarke fez a mesma coisa com você.
Tisha se sentiu inundada por uma onda de vergonha. Somente ela - e Roarke também, é claro - sabia o quão perto da verdade seu pai chegara com as suas acusações. Sem dúvida alguma, sua culpa tinha sido o motivo principal para negar as implicações dele de uma maneira tão veemente e, possivelmente, menos acreditável.
— Ah, se aquela árvore não tivesse caído ontem à noite. Ou se pelo menos, a equipe da Prefeitura não tivesse vindo retirá-la logo de madrugada — falou Tisha.
— E se eu não tivesse mandado você vir até aqui ontem à noite com aquele pacote — lembrou-se Blanche. — Fui eu que insisti na necessidade de entregá-lo ontem mesmo ao Roarke.
— Oh, Blanche, mas eu não estou culpando você — assegurou Tisha, rapidamente.
— Eu sei que não — disse Blanche com um sorriso, estacionando o carro diante de sua casa.
Dentro de casa, Blanche preparou uma xícara de café para sua sobrinha e outra para ela mesma e as levou até a mesa da cozinha, onde as duas se instalaram; em silêncio e preocupadas.
— Depois de tudo o que aconteceu, imagino que papai não vai permitir que continue morando aqui com você. Provavelmente vai me obrigar a fazer as malas, e me levar para casa, onde poderá me controlar atrás de cadeados. Se eu pensava que ele intimidava os meus namorados antes, isto não será nada em comparação com o que vai começar a fazer a partir de agora — disse ela, balançando a cabeça de maneira resignada.
— Você não precisa ir embora daqui — assegurou-lhe Blanche com firmeza. — Não importa o que o meu irmão diga você sempre será bem-vinda na minha casa.
— Obrigada — respondeu-lhe Tisha, com um sorriso, os olhos fixos na janela. — O que é que você imagina que ele vai fazer com Roarke?
— Eu duvido que ele será capaz de fazer alguma coisa a Roarke — comentou sua tia, num tom seco.
— Eu gostaria tanto de saber o que é que está acontecendo lá em cima.
— Nós vamos ficar sabendo de tudo logo mais — disse Blanche. Foi apenas uma hora depois, mais ou menos, que elas ouviram o barulho do carro de Tisha chegando à casa. Ela trocou um olhar de simpatia com Blanche, preparando-se intimamente para enfrentar a fúria do seu pai. Quando ele entrou na cozinha, porém, havia um enorme sorriso de satisfação estampado no seu rosto. Ele estava esfregando as mãos como se tivesse acabado de resolver muito bem alguma missão difícil e complicada.
— Vocês deixaram um pouco de café para mim? — perguntou ele, bem-humorado.
Tisha tinha esperado qualquer coisa, mas não este estado de espírito bem-humorado. Cada vez mais intrigada, começaram a aparecer rugas na sua testa, enquanto ela observava como seu pai pegava uma xícara de café e depois a levou até à mesa onde estavam acomodadas.
— Você é uma moça de muita sorte — disse-lhe ele, enquanto se ajeitava numa cadeira na outra extremidade da mesa. O sol iluminava os fios brancos dos seus cabelos nas têmporas, dando-lhe um aspecto diferente.
— O que é que você quer dizer com isto? — perguntou Tisha, intrigada.
— Seu amigo, o senhor Madison, concordou em fazer a melhor coisa possível a ser feita com você — anunciou ele, tomando um gole de café.
— O que é que você quer dizer com isto? A melhor coisa a ser feita comigo?
— Ele concordou em se casar com você, é lógico!
— Meu Deus do céu! — Ela ficou paralisada, não acreditando no que ouvia. — Você não pode de maneira nenhuma estar falando sério!
— Você pode estar certa de que eu nunca falei com mais seriedade em toda a minha vida — declarou ele. — Nós vamos providenciar os papéis necessários para a licença de casamento ainda esta semana.
— Não! — exclamou Tisha. — Não, não, não e não! Eu não vou me casar com ele! — Ela levantou-se de um salto.
— É lógico que você vai se casar com ele!
— Mas eu nem conheço este homem direito — protestou ela, cada, vez mais desesperada. — Aliás, para dizer a verdade, eu nem sequer gosto dele!
— Você deveria ter pensado nestes detalhes antes de concordar em passar uma noite com ele.
— Eu passei a noite na casa dele, mas não com ele. Ele deve lhe ter explicado isto. Ou será que não explicou? — Uma nova sensação e receio começou a lhe apertar a garganta, enquanto esperava pela resposta do seu pai.
— Para dizer a verdade, não houve motivos para discutir o que aconteceu ontem à noite nos mínimos detalhes — respondeu ele, erguendo os ombros num gesto complacente. — Assim que eu descobri que as intenções dele em relação a você eram honrosas, não havia mais necessidade de se discutir até que ponto vai a intimidade entre vocês dois!
— Então as intenções dele são honrosas! Você está querendo dizer com isto que Roarke quer se casar comigo?
— Eu o convenci de que deveria fazer isto e também que quanto mais depressa acontecer tanto melhor será para todos.
— Richard, quer dizer que você o ameaçou com um processo? — perguntou Blanche irritada.
— Eu não cheguei a formular isto de uma maneira declarada. Mas ele é um homem bastante inteligente. Ele compreendeu que o meu dever é o de proteger a reputação da minha filha. E, obviamente, ele também tem de se proteger contra a possibilidade de um escândalo.
— Você está me forçando a me casar com ele! Todos sabem que eu não o amo!
— Ele é um homem muito distinto com uma excelente carreira profissional. Parece que também dispõe de alguns bons recursos financeiros, pelo que pude perceber. Você poderia cair nas mãos de algum sujeito muito pior. Kevin, por exemplo, nunca seria capaz de aprender a lidar direito com você, mas eu acredito que Madison será capaz de manter você sempre na linha — declarou o pai dela. Havia um lampejo estranho nos seus olhos quando ele a encarou. — Quando eu entrei naquela cozinha, você estava muito à vontade nos braços dele e era óbvio que vocês tinham acabado de se beijar. É possível que não esteja apaixonada por ele agora, mas com um homem deste tipo, tenho certeza de que isto é apenas uma questão de tempo para acontecer.
— Nunca! — exclamou ela, sem saber o que fazer. — Eu não vou me casar com ele!
— Este assunto já foi resolvido e nós não vamos perder tempo discutindo o que já está solucionado. E agora, se vocês duas me permitirem, preciso começar a tomar algumas providências para poder ficar livre durante esta semana. Esta é a grande vantagem quando a gente não precisa prestar contas a um patrão. Em casos de emergência, a gente sempre pode legar todo o trabalho para os empregados da gente.
— Eu ainda não acredito — murmurou Tisha, sentando-se na cadeira outra vez, depois que seu pai saiu da cozinha. — Como é que Roarke pôde concordar com uma coisa destas?
— Estou tão surpresa quanto você, meu bem — confessou com certa ironia, Blanche.
— Sinto como se estivesse no meio de um pesadelo e como se bastasse eu me beliscar com bastante força para acordar outra vez e colocar um ponto final nesta situação maluca. Graças a Deus, existe uma porção de formalidades pelas quais a gente precisa passar antes de receber permissão para se casar. Papai seria capaz de forçar um casamento instantâneo! Eu sempre soube que ele é tremendamente antiquado em muitas coisas, mas nunca sequer cheguei a sonhar que ele fosse capaz de tomar este tipo de atitude.
— Obviamente, Roarke parece ter concordado com este… casamento. Eu sei que você o atrai bastante do ponto de vista físico. Eu estava pensando… não seria possível que você tivesse se apaixonado por ele?
— Eu? Apaixonada pelo Roarke? — Apesar de toda a indignação que Tisha colocou em sua voz, havia alguns elementos de incerteza na sua negativa. — Nunca! — acrescentou ela com firmeza, em parte por ter medo de examinar as suas emoções. Rapidamente, levantou-se. — Preciso conversar com papai. De alguma maneira, eu vou ter de fazer com que ele compreenda que não vou me casar com Roarke.

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