- Capítulo 4

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Sabina Hidalgo
22 de setembro

O vento fresco do outono soprava, fazendo os meus cabelos voarem, as folhas das árvores caírem mais e mais e as flores daquele campo se abanarem numa dança silenciosa que me acalmava.

Este lugar me acalmava mais que objetos, palavras ou olhares, abraços ou beijos. Era apenas neste lugar que eu me encontrava, que eu conseguia soltar a respiração que nem havia notado que estava a conter. Era neste lugar que eu encontrava a paz e a segurança que eu precisa nos meus maus dias. Sempre foi assim.

Quando tirava uma nota baixa e meus pais se chateavam, eu vinha para aqui. Quando uma paixão boba não era recíproca, eu vinha para aqui. Quando as minhas inseguranças vinham à tona tão de repente, eu vinha para aqui. Quando estava com tanta ansiedade que nem respirar conseguia, eu vinha para aqui. E agora, tenho cancro e o meu ex-namorado me decide abandonar na pior fase da minha vida, eu vim para aqui.

Lembro-me, como se tivesse sido ontem, com os meus 10 anos de idade, eu havia tido um péssimo dia, então, logo que cheguei a casa corri para o meu quarto, peguei num livro e numa pequena quantia de dinheiro que eu guardava, e apanhei o primeiro autocarro que parasse o mais próximo possível deste lugar, e então me deitava entre as flores alaranjadas, com um sorriso no rosto como se nada de mal havia acontecido, e lia o meu livro em paz.

Nunca contei a ninguém deste lugar. Sempre que desaparecia de repente para vir aqui e as pessoas ficavam perguntando onde eu tinha estado eu sempre inventava uma desculpa esfarrapada, mas nunca na vida partilhei este meu grande segredo para ninguém. Tinha medo que, ao descobrirem-no, estragariam a paz que aqui encontro.

Algumas lágrimas silenciosas escorriam pelo rosto sem que eu percebesse. Tratei de as secar rapidamente, me deitando logo de seguida entre as flores e abri o livro que estava a ler no momento.

"Um conto de duas cidades" de Charles Dickens, um livro já à muito tempo na minha lista de livros que preciso ler. Um livro antigo e com uma grande história inspirada e escrita durante a revolução francesa, e por ser tão antigo, hoje em dia é mais difícil de o encontrar. Quando na semana passada entrei numa livraria - maior do que as que costumo ir - e me deparo com este, um grito de alegria quase me escapou.

Estava focada no que estava a ler enquanto sentia uma leve brisa no meu rosto e cabelos, algumas folhas e pétalas de flores me cobrindo pouco a pouco. Estava tão focada que quando ouvi uma voz atrás de mim quase pude sentir meu coração saltar-me do peito para fora.

- É meio sinistro encontrar alguém deitada no meio destas flores todas enquanto a noite se aproxima. - disse a voz rouca e grave que me deu a entender que era um homem que me falava.

Apresso-me a levantar, tirando todas as folhas e flores que, até agora, cobriam o meu corpo, fecho meu livro marcando a página onde estava, e então me viro para ver o rosto do homem que interrompeu minha paz.

Ao fazer isso deparo-me logo com duas íris esverdeadas, que lembravam duas pequenas esmeraldas, e um sorriso ladino e simpático. Analiso por poucos segundos o rosto, e então volto minha atenção para os seus olhos. E que lindos olhos.

Sinto-me em um transe, o que nunca antes havia acontecido. Reparo seu sorriso se abrir um pouco, mostrando os seus dentes direitos e brancos, o seu sorriso de simpático torna-se num sorriso de diversão, e então me lembro que estou à algum tempo a observá-lo sem dizer absolutamente nada.

- Garota misteriosa, muito prazer, Noah Urrea. - ele diz, se divertindo com o facto de minhas bochechas terem corado fazendo-me parecer um pimento, em quanto se aproximava de mim, sem desviar os olhos dos meus, me fazendo ficar um pouco mais corada.

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