Décimo Primeiro

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- Meu Deus! Não podíamos acreditar nisso! Nossa Sakura em um acidente de avião!

- Deve ter sido horrível.

Sakura ergueu o olhar do travesseiro da cama de hospital para as duas mulheres bem vestidas e desejou que desaparecessem em uma nuvem de fumaça. Tão logo a bandeja de desjejum fora retirada do quarto por uma eficiente e agitada enfermeira, as duas amigas entraram.

Exalando perfumes exóticos e aguçada curiosidade, disseram-lhe que queriam ser as primeiras a exprimirem suas condolências. Sakura suspeitou de que o que realmente queriam era serem as primeiras a ouvir os deliciosos detalhes do que alguém rotulara como "travessura canadense".

- Não posso dizer que foi muito divertido - disse Sakura com voz cansada. Acordara muito antes do café da manhã ser servido. Acostumara-se a despertar com a luz do sol. Graças à pílula tranquilizante conseguira adormecer profundamente. A falta de ânimo que sentia se devia mais à melancolia do que a fadiga. Seu astral estava extremamente baixo e os esforços das amigas para erguê-lo surtiam efeito contrário.

- Assim que sair daqui, nós a levaremos direto para Seattle para uma completa recauchutagem no salão. Cabelos, pele, massagem. Veja suas pobres unhas! - Uma delas lhe ergueu a mão flácida, estalando a língua. - Estão horríveis!

Sakura sorriu abatida, recordando como se aborrecera quando Naruto lhe cortara as unhas com a faca de caça.

- Não tinha como tratá-las em uma manicure. - O comentário era para ser sarcástico, mas as amigas a olhavam com compaixão. - Estava muito ocupada tentando sobreviver.

Uma delas sacudiu os cachos loiros intencionalmente enrolados, fazendo com que o lenço Gucci em seu pescoço deslizasse. Os doze ou mais braceletes em seu pulso tilintaram como guizos nos pescoços das renas do Papai Noel.

- É tão corajosa, Sakura! Acho que preferia morrer a passar por tudo que passou.

Sakura estava a ponto de responder, quando se lembrou que não muito tempo atrás teria feito o mesmo comentário superficial.

- Sempre pensei assim, também. Ficaria surpresa em descobrir como são fortes os instintos de sobrevivência. Em uma situação como aquela, são eles que nos comandam.

Mas as amigas não estavam interessadas em filosofia. Queriam ouvir as futilidades. Os detalhes sórdidos. Uma delas se encontrava ao pé da cama e a outra sentada na cadeira ao lado do leito, como o corpo inclinado para a frente. Pareciam urubus prontos para lhe separar a carne dos ossos tão logo sucumbisse.

A história sobre o acidente e os eventos que se seguiram estampava a primeira página do jornal aquela manhã. O autor da matéria, errando apenas alguns pequenos aspectos, detalhou a provação por que havia passado Naruto e Sakura. A reportagem era séria e de cunho jornalístico. Porém, o público tinha tendência de ler as entrelinhas. Queriam saber o que foi omitido. Incluindo as amigas de Sakura, os leitores queriam os fatos esmiuçados.

- Foi muito tenebroso assim? Quando o sol se punha não era terrivelmente escuro?

- Tínhamos várias lanternas na cabana.

- Não, estou me referindo ao lado de fora. Antes de irem para a cabana, quando tiveram que dormir na floresta.

Sakura suspirou, exausta.

- Sim, era escuro. Mas tínhamos uma fogueira.

- O que vocês comiam?

- Na maioria das vezes, coelhos.

- Coelhos? Oh, eu morreria.

- Eu não morri - disparou Sakura. - E você também não morreria. - Por que estava fazendo aquilo? As amigas pareciam magoadas e confusas, sem entenderem o motivo de sua agressividade. Por que não dizia algo agradável, com fato de a carne de coelho ser servida nos melhores restaurantes de Vancouver? Seguindo aquela linha de pensamento, não pôde evitar de pensar em Naruto. Uma pontada aguda de saudade a invadiu. - Estou muito cansada. - Disse, sentindo a necessidade de chorar e não ter de explicar por quê.

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