A noite do dia das bruxas não costuma ser uma boa data para os brasileiros que gostam do terror. A tradição americana chama muita atenção das crianças fantasiadas com as histórias de seus desenhos favoritos, onde juvenis almas bem vestidas, no infortúnio do destino, caçam doces na noite que podem dormir mais tarde que deveriam. Porém, a segurança das pegadinhas (e de outros perigos noturnos) interessa mais ao jovem Victor que se arriscar em festas fantasia por aí.
Acompanhando um velho amigo de sua falecida mãe para pegar uma suposta herança, os dois cruzam a cinzenta e silenciosa cidade de São Paulo, passando pelos mais diversos becos apertados e lugares escuros, quase como assombrados. A sujeira e os ratos criavam um ar bodoso demais para um local seguro e confiável, já que definitivamente não parecia limpo. Entretanto, o velho Jorge não parecia se incomodar ou sequer se importar com tudo ao seu redor. Andava como sempre, balançando sua bengala como se estivesse em casa, cansado e meio solitário, como sempre foi.
— Tio, tem certeza que é por aqui? — Disse o jovem ao senhor que generosamente se ofereceu para lhe acompanhar.
— Não se preocupe, meu filho! Além do mais, você pediu um lugar seguro, não foi? — Sussurrou ao sobrinho como se fosse um segredo impróprio para os moradores de rua em condição de miséria ao redor deles. Seus olhos azuis eram convictos e tinham confiança total no que diziam. — Não há lugar mais seguro que este hotel, então, apenas me siga. Há menos que queira enfrentar sozinho os vários monstros para os quais sua mãe deve...
— Não senhor! Só vamos sair logo daqui.
Enfim, o garoto de cabelos encaracolados castanhos e olhos de mesma cor prosseguiu com sua pele pálida reluzente ao sol enquanto seguia as orientações deste parente que convenientemente apareceu em um momento de desespero. O homem velho de cabelos grisalhos, também branco de barba rala, esbanjava rugas de longa data que, inclusive, realçava seus olhos azuis. Com seu terno feito sob medida, sujara seus sapatos sociais com resquícios da lama sobre uma calçada suja da cidade. O clima nublado ajudava com este tipo de inconveniência.
— Nós estamos bem perto, tome cuidado agora. — Eles continuam andando por mais alguns minutos, até que dobraram uma esquina e chegam em uma porta dupla estilosa feita da mais pura madeira. O jovem atrás de si engoliu à seco o que restou em sua garganta, com medo do que poderia lhe aguardar. — Conheça o Hotel Califórnia, — revelou o tão esperado segredo enquanto abria a porta de entrada — um lugar aconchegante, um refúgio para aqueles que precisam de amparo ou de uma boa noite de sono.
— Porque construí-lo no subterrâneo? — Os dois entram ao local já se acomodando, retirando ambos seus casacos e colocando-os sobre o cabide na entrada da recepção.
— Eu sou apenas o proprietário. Segundo lendas antigas, ele foi originalmente um abrigo antibombas durante a primeira e segunda guerras mundiais. Agora, pode servir para muito mais que seu propósito original. — O velho senhor Veríssimo, então, senta-se no estofado da recepção, aspirando o ar familiar de sua moradia enquanto repousava por um breve momento.
— Bom, realmente parece um lugar... Interessante. — O jovem fecha a porta atrás de si e observa atentamente o ambiente completamente vazio ao seu redor.
A recepção era bem cuidada e possuía um aspectos rústico, digno da época em que fora criado, mas não possuía nenhum funcionário. Os quadros enfeitavam o que talvez seria um ambiente sem utilidade e razão para existir. Apenas o silêncio acompanhava os dois dentro daquele sufocante ambiente. Parecia que a tensão lá dentro era pior que os becos do lado de fora, mesmo que eles pudessem lhes reservar a morte à qualquer momento.
Um lustre bem desenvolvido iluminava piamente o local, enquanto os tapetes vermelhos e as cortinas de seda traziam ainda mais um ar medieval para a residência. Todo o interior era recoberto de madeira escura, talvez de pinheiros exportados até São Paulo. As paredes não eram ocas e pareciam bem resistentes, realmente como um abrigo de guerra. A falta de movimento em um hotel deste arquétipo desafiava sua mente, fazendo-o refletir o motivo para isto.
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Contos do Halloween Millenium
Historia CortaGuloseimas e malcriações, queridos Milleniuns, O que vocês irão escolher? Desse dia tão icônico, vocês pensaram que iríamos esquecer? Pois venho aqui trazer uma mensagem Vinda do outro lado, Saiba que você que está lendo Acaba de ser desafiado! A es...