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Senti meu sangue gelar dentro de minhas veias com os pensamentos assustadores que percorreram minha mente enquanto era guiada como prisioneira para o meu quarto, ou pelo que tudo indicava, minha cela.
Noah permanecia impassivel, as feições ainda sérias mas pude notar, ou talvez fosse o medo que percorria meu corpo, que havia agora nele uma pequena sombra de divertimento. Eu tinha certeza de que não gostaria de saber o porquê, e torcia para estar errada quanto as pessoas que eu havia por muito tempo considerado minha familia.

- O que fez para ser rebaixado ao ponto de vigiar a porta de convidados? - perguntei, tentando manter a voz tranquila - Você parece um bom soldado, se existe uma guerra sendo travada, você deveria ser o ultimo soldado a ser deixado dentro da fortaleza de Mike.

Ele ficou de pé no canto do quarto, olhando fixamente para a parede como uma estátua, mal se notava sua respiração. Não pude deixar de avaliar aquela figura impassivel e forte, com o olhar petrificado, e percebi que, de repente, estava com medo dele. Eu não sabia por que, e sequer havia razões para isso pois ele mal falava, e estava parado como um dos móveis do quarto, mas algo nele, me fazia tremer. Talvez fosse o olhar negro que parecia poder perfurar a parede a sua frente se ele assim desejasse, ou os cabelos que iam até seus ombros com ondas em um tom tão profundo de preto que não era possivel perceber se estavam molhados ou não.
Ele notou que eu o encarava e isso pareceu incomodá-lo.

- Você é bem menor do que eu imaginava quando contaram a historia da grande mestiça que tomou o inferno e liderou os demônios. - Ele disse, a voz grave - E bem mais fraca também.

- A liderança nunca foi sobre força. - falei.

- Certo... - dessa vez quase foi possivel notar um sorriso em seu rosto - Talvez seja por isso que seguimos Mike e não a você.

- Eu pedi que Mike ficasse no comando.

- E você acreditou que tinha realmente esse poder?

Abri a boca para responder, mas não respondi, ficando com uma cara de tonta enquanto olhava para ele, que parecia se deliciar com a minha confusão.

- Eu vou falar com Mike agora, - me levantei e andei até a porta - Você acha que pode ficar ai e me afrontar assim? Você serve a mim, e é por isso que está aqui parado de pé só para me manter segura, seu idiota.

Noah não impediu que eu saisse, andei pisando firme até a sala de Mike no andar de cima, quando olhei para trás para conferir, Noah andava calmamente me seguindo de longe, os olhos fixos nos meus, e dessa vez eu não tinha duvidas, ele estava com uma feição de divertimento.

- Eu não quero mais aquele imbecil no meu quarto. - disse adentrando a sala - Você entendeu?

Mike sorriu, me olhando como se olhasse para uma criança dizendo que não queria tomar banho.

- Mariana ainda não chegou, se não me engano a senhorita deveria estar em seu quarto.

- Claro, quero que Felipe fique comigo, somos amigos, podemos ao menos ter sobre o que conversar. - Bufei - vocês estão me tratando como priosioneira, creio que estejam um pouco confusos sobre o que estão fazendo, eu deveria estar aqui, com vocês...

Olhei para tras e Noah estava encostado na porta, olhando para nós com um ar de desdém.

- Mike, eu estou dentro da sua sala tendo uma conversa, peça por favor que ele se retire, estou mais do que segura aqui.

Mike olhou para Noah, que fez que não com a cabeça e permaneceu onde estava. Pensei que finalmente ele seria arrastado dali a força, por não acatar a ordem explicita de Mike, mas não foi o que aconteceu. Mike engoliu em seco e respirou fundo.

- Vamos resolver isso depois, por favor - Ele disse se levantando e andando até mim, - Lembre-se de tudo que passamos juntos, lembre-se do seu dever com John, lembre-se de que está em casa e não há razões para se preocupar dessa maneira... - Ele se aproximou ainda mais e beijou minha testa - Faça o que Noah diz.

Mike estava de costas para Noah e olhando diretamente para mim, e talvez fosse minha imaginação, mas por um misero segundo ele deixou transparecer em seus olhos uma sombra de preocupação e medo. Meu corpo todo estremeceu, e senti vontade de correr.

- Mike, eu não sei o que estou fazendo aqui... Na verdade, Daniel precisa saber onde estou, preciso voltar para casa - forcei um sorriso - Acabei agindo por impulso e voltei correndo para cá... Quando resolverem as coisas, ou quando eu for útil de verdade, eu voltarei.

Mike fitou o chão por um momento, a sombra de medo e tristeza aumentaram ainda mais, ele ergueu os olhos para me olhar e negou com a cabeça enquanto saia do caminho entre mim e Noah.

- Sinto muito Analu, mas você não pode ir. - ele disse enquanto se sentava em sua cadeira novamente.

- O quê? - gritei - Mike, eu confiei em você e vim até aqui, eu sou livre para partir quando quiser, ou fará de mim sua prisioneira?!

- Eu jamais faria isso, e você sabe... Mas eu não tenho escolha. - Seus olhos e voz estavam tranquilos novamente.

- É claro que tem Mike! Eu estou indo embora agora.

Me virei para sair, mas Noah permaneu como uma pedra na frente da porta, os olhos fixos em mim.

- Por favor. - murmurei.

Ele não respondeu, ao invés disso fitou Mike que voltou a falar.

- Analu, vamos esperar Mariana, certo? Você pode aguardar aqui, não veja isso como uma prisão, mas precisamos manter você aqui e segura para que nós tambem possamos ficar seguros, não é isso o que você quer?

- Eu quero estar aqui Mike, mas quero poder sair quando eu quiser.

- Isso não será possivel ainda... Mas será somente por um tempo, você pode colaborar até lá?

Me sentei na cadeira de couro preta na frente da mesa de Mike, e bufei. Esperaria Mariana, eu tinha certeza que com ela ali toda a energia do lugar ficaria melhor.
Noah saiu da porta e andou confortavelmente pela sala, até se sentar em uma das poltronas no canto, os olhos agora fitavam a parede novamente. Me peguei pensando que tipos de pensamos passavam por sua cabeça quando ficava assim distante.

Mike puxou assunto, mas suas conversas eram vazias, os sorrisos falsos, a calma de sua voz era falsa, tudo ali parecia ser. Ele não era o mesmo Mike. Aparentemente nenhum demônio permanecia o mesmo por muito tempo. Mais uma vez, como muitas em todo esse tempo, eu desejei que Daniel estivesse vindo me tirar dali e me levar para casa em segurança. Mas eu duvidava muito de que isso aconteceria. Eu não confiava em Daniel depois do que vira, eu não confiava em Mike ou Megan depois de me trancafiarem em um quarto, e para piorar, eu tinha Noah no meu pé como uma sombra por não sei mais quanto tempo.
Eu estava perdida nesses pensamentos quando a porta se abriu num estrondo, Mariana e Dominic algemados e amordaçados sendo escoltados por um grupo de demônios de Mike.

- O que é isso?! - Gritei - Soltem eles agora, soltem meus amigos agora!

Olhei para Mike horrorizada, esperando que ele tomasse uma atitude, mas ele fitava um de seus guardas.

- Eles sabem. - Um dos demonios disse.

Mike olhou para mim com raiva, e antes que eu pudesse questionar ou agir, Noah me arrastou com força o mais rápido que seria possivel arrastar alguem em meio aos meus gritos. Sei que ouvi os gritos de Mariana e Dominic por entre as mordaças por um bom tempo.
Só parei de gritar quando Noah me arremessou com força na pequena cama do quarto quarenta e quatro.

Senhor das TrevasOnde histórias criam vida. Descubra agora