Capítulo 2: Confusão, mentiras e ameaças

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-Papai, por que tem tantos homens feios na parede?

Era uma noite fria de inverno quando o pequeno Kyle fez aquela pergunta a seu pai.

Gerald era um homem comumente atarefado; vivia dividido entre estar fora de casa ou trancado no escritório perdido no meio de dezenas de pilhas de papéis e documentos, mas aquele era um dos raros momentos que compartilhava com seu filho. Os dois estavam sentados em frente a lareira, na sala de estar, tomando o chocolate quente que sua mãe havia preparado.

-Homens? -O mais velho questionou confuso, mas, ao acompanhar a direção para onde o pequeno olhava, soltou um "Oh" de compreensão. -Aqueles são seus antepassados, Kyle.

O pequeno ruivo não sabia o que eram antepassados; perguntaria mais tarde para sua mãe.

-Todos estes homens foram devotos do Natal até o fim. -Seu pai dizia após levantar e caminhar até a parede onde os quadros estavam pendurados. Kyle o acompanhou. -Todos excelentíssimos condutores de Expresso Polar.

-Ah... -O ruivinho expressou. "Então eles trabalhavam com trem, igual o papai" era o que pensava.

-Um dia você vai ser como eles, Kyle. -Disse pousando a mão sobre os cachos bem feitos do filho.

-Feio? -Os olhos verdes se arregalaram. Ele não queria ser como aqueles homens nos quadros; eles lhe davam arrepios.

-Não. -Seu pai riu. -Um condutor.

-Ah... -O pequeno soltou aliviado. -Igual você?

-Sim, e igual ao seu avô também. -Gerald dizia enquanto analisava os retratos com orgulho. -Nós vamos manter a linhagem de condutores dos Broflovski. Orgulhar nossos antepassados que nos agraciaram com a casta quatro.

Mais uma vez ele disse antepassados; Kyle queria muito ir até sua mãe perguntar sobre a palavra nova. Aliás: queria perguntar sobre as palavras novas, afinal aquela também era a primeira vez que ouvia alguém falar de casta.

-//-

Papéis voavam. Fumaça saia das máquinas de jornais. Os bancos de madeira estavam todos revirados e quebrados. A estação de trem de Royal Rabbit estava uma verdadeira confusão.

Muitos calendos haviam se ferido e a equipe de paramédicos tinha dificuldade em atender a todos.

Quem não estava com hematomas estava em estado de choque. Algumas pessoas choravam pelos cantos, outras tremiam enquanto respondiam perguntas feitas pelos policiais e algumas apenas vagueavam sem rumo, abatidas psicologicamente e tentando processar o que tinha acabado de acontecer.

O ruivo do distrito do Natal fazia parte do último grupo. Seu coração ainda batia acelerado pelo susto e suas mãos ainda tremiam quando ele se abaixou para alcançar um dos diversos papeis espalhados pelo chão.

"Boa tarde, amiguinhos

Temos o prazer de comunicar que vocês podem descansar porque NÃO VAI TER PÁSCOA ESSE ANO!

Atenciosamente, Grupo Mantequim."

O "comunicado" era estranhamente educado demais (já que se tratava de um grupo terrorista), mas isso não o tornava menos apavorante. O Broflovski agora estava branco, os batimentos sumiam gradativamente e a pouca pressão que permaneceu no sangue o deixava zonzo e a beira de um desmaio.

Como assim não teriam Páscoa? Se não tivessem Páscoa sua missão de transportar ovos teria falhado. Se falhou então não teria a chance de subir de casta. Pior: ele iria descer, iria se tornar, na melhor das previsões, um casta cinco; seus pais ficariam desolados e o nome de sua família iria parar na lama

Resgate de Páscoa -SP StyleOnde histórias criam vida. Descubra agora