Capítulo um.

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Medo.

Medo: Do latim, 'metus', é o estado afetivo suscitado pela consciência do perigo ou que, ao contrário, suscita essa consciência; temor, ansiedade irracional, receio.

Quando conheci Inês, ela provavelmente não pensava em querer saber quem eu era. Eu tinha medo de dormir no escuro e longe da minha mãe, e meus seis anos de idade vieram como uma grande onda no meu peito, me empurrando para dentro do mar, mas quanto mais eu pedia por oxigênio, mais água entrava em meus pulmões. Percebi que estava ferrada por não querer pregar os olhos e encostar a cabeça no travesseiro. Foi aí que ela apareceu, mas foram poucas as visitas, depois disso eu pensei em ver beleza na borboleta que entrava na janela do quarto toda noite, e vi nela, o menor dos meus problemas. Às vezes ela aparecia, eu sentia seus olhares no meu corpo com insônia, mas meu medo mudou quando entrei na adolescência e este, vivia dentro da mesma casa que a minha.

Depois de tanto tempo, a Cuca ganhou nome, ganhou forma, desenho e até piadas, mas eu crescida esqueci o que eu ouvia quando mais nova, eu esqueci o que era o medo e esqueci o que era adrenalina. Não me entenda mal, adrenalina eu sinto quando vou trabalhar com algum caso emocionante, quando estou à beira do perigo, mas quando estou face a face com ela, ela que explicita em mim todos os meus males e meus pensamentos, aquilo sim é adrenalina.

Quando ela exerce seu poder da melhor forma possível, pondo um arco torto em seu sorriso em que seus dentes apareçam, quando ela fica séria e eu não consigo respirar pois acho que ela irá me machucar e eu penso que aquilo será prazeroso, quando ela tem suas certezas confirmadas, ela me faz liberar uma bomba de adrenalina, por isso talvez eu não consiga sair de perto dela. Nem se eu quisesse sair de perto dela, conseguiria.

Após o ocorrido com Eric, a perda de sua esposa, a procura por respostas e a descoberta de seres folclóricos vivendo conosco, eu precisava de uma pausa, mas minha preocupação com Luna era quase materna, e meu senso não me deixava largá-la por ele, por Gabriela e por mim. Na noite que ele arrancou o corpo seco de si, acabando com a maldição ao tirar a própria vida e se tornando um deles, eu não pude ajudar, mas corri para sua casa para conferir a pequena. Ela dormia como um anjo, sem preocupações e sua bisavó descansava no sofá enquanto eu a observava serena, seu peitoral para cima e para baixo movendo-se lentamente em sincronia com seus sonhos. Eu me sentei seu lado na cama, a dei um carinho no cabelo e voltei para casa.

Na minha cabeça milhões de cenários, figuras e seres tomaram conta de minha mente: Quem o Eric seria então? Quem seria a Gabriela? E quanto mais me perguntava, mais percebi que estava me parecendo com ele. Eu estava suada, nojenta, cabelos sujos, mas estava enfim, feliz de ter o ajudado a resolver tudo, só não entendia o motivo da minha insatisfação. Por que, depois de tanta pesquisa e de tanto procurar, eu achei tudo e parece que achei nada? Em casa eu entrei no banho assim que cheguei, mesmo tarde da noite eu lavei meu cabelo para afastar as energias ruins, ensaboei-me com tamanha agressividade que fiquei vermelha, mas nada acalmou meu peito gritante. Pus pijamas confortáveis, preparei um chá, mas nada de meus olhos se fecharem na cama. Larguei a xícara meio vazia no móvel e me revirei, mas meu sono não vinha, talvez pelo excesso de informações, pelas novidades, pelos nervosismos, mas quando me dei conta do quanto eu pensava, mais percebi que estava tarde.

Um vento balançou minhas cortinas, vento frio no Rio de Janeiro é algo um pouco incomum. Vi uma sombra de asa e a luz do abajur aceso piscou, eu automaticamente já sei quem é, mas a última coisa que queria era dormir. Ela tomou sua forma no corpo humano, eu me ajeitei debaixo das cobertas, tentando pensar em músicas aleatórias do rádio para que ela não lesse o que eu pensava. Ao contrário do que eu achei, ela não veio para cima, não pôs borboletas azuis em mim ou sequer se mexeu, ela só ficou parada me olhando como se tentasse me escanear, mas sorria de lado ao ver que não conseguia muito bem.

Efeito BorboletaOnde histórias criam vida. Descubra agora