Parte I - Hefesto e Lídia:. 8

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Parte I - Hefesto e Lídia:. 8

Vampiros são criaturas reclusas tanto por quanto por falta de opção. E, graças a esse isolamento, ninguém sabia muito sobre detalhes da maldição além do básico e óbvio. Por isso, uma das surpresa para Lídia foi descobrir que seu paladar não mudara.

Embora sangue fosse seu novo alimento, e gerasse nela êxtase, o gosto metálico era o mesmo. E, para seu ainda maior espanto, todo o restante, todos os pratos e bebidas com o qual se familiarizara quando humana, também conservaram seus sabores.

Essa realização produziu em vários membros do grupo uma alteração na relação que tinham com a comida. Se quando humanos eles comiam para viver, agora saborear um prato se tornara pura e exclusivamente um ato de prazer.

Esse novo enfoque, ignorando totalmente a nutrição, acabou por reduzir o tamanho das porções, mas elevou a experiência a níveis jamais imaginados. Tanto que, aos poucos, ao perceberem que não podiam morrer envenenados, suas receitas começaram a incorporar certos ingredientes antes fatais, na busca por novas combinações.

O problema era que ao entrar, a comida teria, eventualmente, que sair. Nada que não estivessem acostumados, mas ainda era estranho para Lídia ter que buscar uma latrina sendo uma vampira.

E, como se não bastasse, quando o inverno chegou, a vampira branca percebeu novamente o quão pouco sabia sobre si mesma.

Iërth der Tuul, ou Terra das Colinas, era uma região fria que, embora não nevasse mais do que um ou dois dias por ano, produzia temperaturas congelantes capazes de uma boa quantidade de geadas. Especialmente à noite.

Enquanto o auge do inverno não mostrava todo seu potencial, Lídia se surpreendia ao ver humanos se deixarem engolir por grossos casacos, ao passo que ela caminhava praticamente nua sob sua capa. Somente na noite anterior à primeira geada foi que ela se percebeu tremendo sob a brisa antes tão agradável.

Achando que havia algo errado, não levou muito tempo para que conseguisse descobrir a causa de seu frio: vampiros tinham uma base alimentar líquida. Logo, havia líquido em seus corpos tanto ou mais do que quando vivos. Se em uma geada as poças, baldes ou qualquer pequena quantidade de água congelava, não era difícil supôr o que ocorreria caso continuasse a andar por aí com peças de roupas reveladoras.

Por conta dessa limitação tão familiar e comum, a solução também era familiar e comum: ficar dentro de casa.

E se Lídia sabia que o ócio e o tédio eram perigosos (especialmente entre vampiros) então era óbvio que isso não era nenhum mistério para a Matriarca.

Sem que precisasse explicar o porquê, vários eventos sociais e esportivos começaram a ocorrer um após o outro, mantendo o grupo de trinta e poucos vampiros constantemente ocupado.

Assim, enquanto o vento soprava do lado de fora, castigando e congelando o que pudesse do Pântano, Lídia e Hefesto, aquecidos pelo fogo da cozinha, cortavam os ingredientes para o banquete do baile de máscaras.

O espaço, com área interna suficiente para caber uma senhora casa, era equipado com não apenas uma, mas três lareiras gigantescas, com espaço suficiente para caber quatro adultos de pé em cada. E isso sem mencionar os três imensos fornos a lenha de ferro fundido, uma mesa maior que uma porta no centro da cozinha e um balcão que caminhava ao longo de duas paredes inteiras e por sobre um exército de armários e gavetas.

Além disso, ainda havia panelas de cobre e ferro decorando as paredes e coroando a mesa do centro, pendendo do teto como salames; dois barris de cerveja se aconchegando deitados em um canto, indo do chão ao teto; um poço de pedras para o acesso à àgua no vértice de duas paredes; e, preenchendo dois armários recém-reformados, potes e mais potes de todos os tamanhos e formatos, contendo todo a sorte de ingrediente, se amontoavam como se buscassem o calor uns dos outros.

Anjos e Vampiros - A Filha da VampiraOnde histórias criam vida. Descubra agora