10. Fim.

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Assim como Kate, eu também tive meu fim. 

Sou Kim Taehyung, paciente número 127 do sanatório Hope.

Crio em minha mente todos os dias, lugares onde eu sou um homem feliz e tenho Kate ao meu lado. Um lugar diferente da minha realidade, diferente do que vivo hoje. Destruído, e doente. Depois da morte de Kate, tentei suicídio pulando de um penhasco com meu carro.

Minha sorte foi tamanha, que o carro pegou fogo comigo dentro e conseguiram me salvar.

Perdi os movimentos das pernas, e tenho 70% do corpo queimado.

Tenho um dom especial.

Posso criar tudo que desejo, de fato.

No entanto, nada dura se Kate não me amar. Não sou nada sem ela. A perdi e tento todos os dias resgata-la. Minha Kate, aquela que não quer mais meu carinho e atenção.

O que serei sem ela? Como vou viver sem tê-la ao meu lado?

-Bom dia senhor Kim.

Continuei olhando  além do vidro embaçado da janela. O dia era feio como sempre. Chuvoso e frio. Minha boca deformada sempre doía nessa época do ano.

-Me conte como foi sua noite. Dormiu bem?

Escutei a enfermaneira depositar as pílulas do meu coquetel de remédios diários num copo de plástico. Eu detestava o gosto de todos eles.

-Sabe, pensei em levá-lo para passear. Mesmo estando frio, podemos andar pelo Jardim. O que acha?

Patética. Kate era patética.

Patética por se parecer tanto com ela, e por ter o mesmo nome. Kate era minha enfermeira e meu inferno. Era como conviver como uma cópia da minha Kate,  uma cópia com um pouco mais de peso e muita personalidade.

Ela é extrovertida, alegre, gentil e doce. Tudo que minha Kate desejava ser.

Não suporto essa mulher. Não suporto olhar em sua direção e deseja-la. Sinto que estou traindo a minha Kate.

-Calado como sempre. -Escutei seu suspiro. Mesmo nunca a respondendo, ela continua insistindo em puxar assunto ou manter uma conversa. -Se continuar assim, terei de ameaça-lo.

Ela me faria um enorme favor me matando.

Engoliu os remédios de uma vez, bebendo uma grande quantidade de água. Observei minha mão completamente diferente de antes. Coberta por queimaduras. Sou repugnante. Nojento.

-Quer jogar um jogo?

Fechei meus olhos pensando dez vezes se valia a pena me forçar a se jogar contra essa mulher e tentar um homicídio. Depois de raciocinar bem, aqui pelo menos eu recebo um tratamento decente, tenho água, comida e paz. Na cadeia eu não ia durar muito. Mas afinal, não é isso que eu quero? Não durar muito.

-Podemos ver um filme, não sei, ler um livro? Sou boa em leitura, e minha dicção é perfeita. Já ouviu sobre "Dor e Desejo?". Esse livro é incrível!

Dor e Desejo? Eu já ouvi falar sobre isso, só não me recordo quando.

Deve ter sido uma de minhas leituras do passado.

-É mesmo um saco conversar sozinha por sete anos. Mas tudo bem senhor Kim, não irei desistir de você. 

Tenho certeza de que ela sorriu. Não preciso me virar para confirmar. Seu reflexo no espelho diz tudo. Estive a observando desde que entrou. Cada gracioso movimento.

Me recuso a dialogar com ela. Não posso ter esse prazer. Pertenço a Kate. Somente ela.

-Me deixe apenas te dizer, não tem medo da solidão? -Ela fez uma careta enquanto retirava minha bolsa coletora. Sei como é nojento. Me sinto um ainda mais inútil por não ser capaz nem mesmo de recolher meu próprio mijo. - Pelo menos não tem sangue, é um ponto positivo.

Books boy • Sanatorium 1Onde histórias criam vida. Descubra agora