Capítulo 7

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     Nas duas últimas semanas tentei cuidar para que Hyunjin aos poucos se curasse do trauma do sequestro. A única parte boa disso é que agora ele anda bem mais atento e na hora de ir para casa pega um caminho mais seguro. Gradualmente ele está melhorando e eu não podia estar mais contente com isso. A parte ruim era que ele ainda pensava em mim, mas eu gostava... alguma coisa naquilo me dava prazer. Talvez seja o fato de estar ganhando algum reconhecimento depois de tanto trabalhar como seu guardião. E não podemos deixar de fora o fato de que foi um pouco emocionante estar em contato com ele. A vida toda eu estive ali o vigiando, mas ele nunca me viu. É quase como ver alguém pela tela do computador, você pode ver, mas não pode tocar. Acho que em algum tempo ele deve esquecer de mim, e caso eu precise entrar em contato com ele novamente, devo me lembrar de modificar minha aparência.
- Eu estou tão orgulhoso! – disse Changbin encenando estar emocionado com sua mão no peito – O seu protegido já tem um trauma! Você nunca me decepcionou, mistinho.
- Eu sei que traumas fazem parte da vida humana, mas não deixo de me incomodar com o quão pesado eles podem ser – disse Seungmin.
- Eu me senti tão culpado – constatei – Eu sei que faz parte, mas...
- Ow ow ow, você sabe que você não pode salvar seu humano de tudo né? – Minho me interrompeu – Eles não podem se safar de todo o mal, eu sei que é chato, mas é o que os torna mais fortes.
- Eu não faço isso com frequência, portanto prestem atenção! – disse Chris – o Minho ta certo!
- Já dizia Chorão "dias de luta, dias de glória" – Minho brincou fingindo comemorar o apoio de Chris.
- O seu instinto angelical deve estar fazendo com que você sinta uma grande necessidade de fazer bem ao seu humano, ainda mais o seu primeiro humano. É comum nós nos afeiçoarmos mais ao nosso primeiro antes de nos acostumar com o fato de que eles um dia devem partir. – Chris concluiu fazendo um arrepio subir pela minha espinha.
- Eu...deveria ter o deixado..? – tentei perguntar confuso.
- Não! Você fez certo em protegê-lo, era uma ameaça grande demais para a vida dele. Mas ameaças pequenas você tem que deixar acontecer – Chris explicou.
- Aliás, como você tirou ele de lá? – perguntou Changbin.
     Eu congelei no momento em que me toquei que não havia inventado uma mentira boa o suficiente para contar sobre isso. Ninguém deve saber como as coisas realmente aconteceram e eu fiz de tudo para deixar isso de fora dos meus relatórios.
- Ah, foi... do jeito de costume. – todos me fitaram confusos esperando que eu terminasse a história – eu só guiei ele para que ele conseguisse se soltar e ele fugiu.
- Mas seu humano não é meio besta? – perguntou Minho.
- Ele não é... – me interrompi ao notar que engrossei meu tom de voz – Ele é distraído, mas na hora do sufoco ele consegue focar.
     Todos pareceram aceitar a minha explicação e simplesmente mudaram de assunto. Mas antes de voltar para a terra, após me despedir deles, notei que Chris me olhava como se me vigiasse. Seu olhar parecia ser de preocupação ou confusão, mas ele ficou quieto e não disse nada até o momento que fui embora.
     Hyunjin ainda dormia quando cheguei. Me sentei na sua cômoda que fica de frente para sua cama como de costume e fiquei olhando para seu rosto sereno enquanto dormia. Seus traços são tão delicados e tão bonitos, uma pena eu não ter tido a chance de dizer isso quando estivemos em contato. Ter a chance eu tive, mas eu tinha que deixa-lo desinteressado em mim. Mas até então, ele não me esqueceu. Parecia que independente do que eu dizia ou fazia, ele ainda estava interessado em mim, ele fazia perguntas e até elogiou meu cabelo. O vi se mexer levemente em sua cama e se espreguiçar. Ele sempre faz um barulhinho quando se espreguiça e mexe no cabelo com intenção de arruma-lo, mas apenas o bagunça mais. Ele se levantou e foi em direção ao banheiro. Antes que ele fechasse a porta, notei meu rosto no espelho do banheiro e rapidamente fiz sumir o sorriso bobo que estava na minha cara. Eu preciso focar em coisas mais importantes agora.
     Hyunjin andava lentamente para a escola ainda com preguiça.
- Eu podia ter faltado hoje. – ele resmungou.
- Podia não! – respondi mesmo sabendo que ele não me ouvia.
- Eu não quero estudar hoje. Eu preciso de férias. – ele continuou
- EU que preciso de férias! – respondi.
     Ele suspirou alto e continuou andando lentamente até um momento que deu um salto ao se assustar com o barulho de um motoqueiro que passava. Ele normalmente apenas murmurava palavrões quando isso acontecia, mas dessa vez ele se virou rapidamente para ver quem era. Um senhor já idoso de bandana vermelha passava em uma moto que parecia antiga, mas muito bem cuidada. Vintage que fala, né? Hyunjin continuou andando e passou pelo motoqueiro que havia estacionado do lado da calçada, até que decidiu dar meia volta e ir até o homem.
- O que você pensa que ta fazendo? – reclamei em voz alta.
- Bom dia, senhor. – disse Hyunjin ao motoqueiro – Sua moto é muito bonita.
- Muito obrigada, jovem! – disse o senhor após um riso satisfeito pelo elogio de meu protegido.
- Você deve entender bastante de moto, certo? – Hyunjin questionou.
- Com certeza! Ando de moto desde muito jovem. – o senhor respondeu.
- Hyunjin, pelo amor de... – reclamei novamente.
- O senhor por acaso conhece um cara que conserta motos chamado Felix? – o senhor o olhou pensativo – Ele é um pouco mais velho que eu, tem cabelo longo e platinado... e gosta de cebola...
- Não, meu jovem. Não conheço ninguém com esse nome. – o senhor respondeu.
- Ótimo! Agora vamos embora! – falei encarando Hyunjin bravo.
- Mas eu conheço um cara do ramo, muito bom, tem muitos contatos. Se quiser posso lhe dar o cartão dele e você entra em contato com ele para saber se ele conhece esse tal de...
- Felix – completou Hyunjin.
- Isso! Aqui, deixa só eu achar... – disse o senhor procurando em uma pochete de couro o cartão de seu conhecido – Aqui! Talvez ele possa te ajudar a encontra-lo, caso o contrário, ele é o melhor do ramo, diga que lhe indiquei e ele pode fazer um preço mais baixo para você no conserto da sua moto.
- Ah...claro! Brigado, senhor! Tenha um bom dia.
- Você também, garoto! – o senhor se despediu.
     Minha expressão era de aflição, raiva, chateação e talvez um pouco de excitação. Agora era só o que me faltava! Ele vai passar a se envolver com motoqueiros para me encontrar? Isso era muito fofo, mas NÃO! Primeiro que ele tem que esquecer que me conheceu, segundo que ele tem que parar de se colocar em perigo. Não que motoqueiros sejam perigosos, mas alguns deles têm gangues. Hyunjin, que andava em direção da escola, parou subitamente novamente, pegou o cartão em sua mão e o leu por inteiro. Novamente ele deu meia volta e estendeu a mão fazendo sinal para um táxi que passava.
- NÃO! – gritei sozinho.
- Isso! – Hyunjin disse animado entrando no carro.

A Segunda Queda   |   HyunlixOnde histórias criam vida. Descubra agora