Depois de muitos pesadelos subsequentes, esperava dormir e dar de cara com alguém que amo morrendo ou algo assim. Mas fora diferente dessa vez.
Em um oceano gigantesco, meus pés flutuavam. As marolas passavam pelo peito do meu pé e massageavam meus músculos. Pisava um pouco abaixo do nível do oceano, afundando poucos centímetros dos meus pés na água – mesmo sem um apoio ainda ficava de pé. O horizonte era descomunal, tão grande e lindo. O céu e o mar se uniam. Pisei como se houvesse um chão, e caminhei pelo calmo oceano, sentindo a leve brisa do vento. Os raios solares afundavam na água e davam visão do fundo.
Do outro lado dessa planície azul, um barulho crescia conforme o tempo passava. O barulho de rodas sobre um trilho chiava e preenchia o ambiente, mostrando um trem a vapor andando lentamente em minha direção. Ele empurrava a água e formava pequenas ondas. A sensação que tive foi de esperar dias ali, até que ele finalmente chegasse. Não existia condutor ou passageiro, apenas diversos vagões vazios. Era tão quieto ali, tão calmo.
Andei por tanto tempo nesse trem. Me perdi diversas vezes no azul. Nada tinha fim ou começo, tudo se misturava em uma brincadeira. O céu não escurecia, nada mudava. Anos e anos naquele trem, no mesmo banco, no mesmo vagão. As mesmas coisas pela janela.
O primeiro milênio passou mais rápido que o segundo. Depois, apenas parei de contar. A vista nunca ficara feia. O som das rodas nunca diminuía. O trem nunca parava. Meus olhos afundavam à frente, como se desejasse desesperadamente despertar desse lindo paraíso. A paisagem que, por anos, deu vida aos meus olhos, fora de um banco vazio vermelho e a janela logo atrás, com o mais belo horizonte existente.
Meus pensamentos se tornaram confusos. Pensei em tantas coisas nesses últimos anos. Ria e chorava por nenhum motivo, nada fazia sentido mais. Tudo era tão calmo...
Tanto tempo.
Tanto tempo.
Tanto tempo.
O que eu fiz para merecer esse inferno?
Por tanto tempo.
Com tanto tempo.
Por que tanto tempo?
O céu nunca escurece. Em uma pouca eternidade, esqueci quem era. Meu nome se perdera há eras, centenários de milênios atrás. Ou em apenas um segundo? O céu nunca escurecia. Nunca.
Despedaçada, olhando para o nada, meus olhos cansavam de observar.
Morrer se tornou meu único desejo.
A desistência que me partiu em duas, fora o caminho que encontrei para sorrir. A esperança de morrer manteve-me viva para contemplar o destino. Depois de tanto tempo, tantos milênios, tantas vidas, virei minha cabeça para o banco ao lado.
Balançando os pés, que sequer alcançavam o chão, um garoto loiro me encarava. Os olhos entediados, entreabertos e tão escuros. Nossos olhares se encararam por pouco tempo, até ele desviar e pular no chão, caminhando até minha frente.
- Você ficou velha.
A voz era distante. Não parecia vir de sua boca, mesmo que falasse por ela. Tão calma quanto o oceano.
Eu quis falar algo, qualquer coisa. Perguntar o que fazia ali, quem era, como entrou no trem. Mas nada saiu de minha boca.
- Sinto muito por isso. – O garoto parecia triste. Analisava cada detalhe de meu rosto, que se era desconhecido até para mim
- Q...Q....Quem... – Minha garganta doía, rasgava de dentro pra fora.
- Você me conheceu há anos... Muitos e muitos anos. – Ele sentou ao meu lado
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cyberspace
FantasyInspirado em um mundo fictício, Cyberspace é um romance destinado a jovens adultos. A história ronda nossa protagonista, Soph, adentrar em uma realidade diferente da habitual. Seu destino passa a ser moldado a partir da apresentação aos coadjuvantes...