Marcas de Fé: Luar do Desespero

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Sozinha, Milshia perambulava pelos cantos abandonados de Galanthnaes. O cajado era seu único companheiro. Continuou. Mesmo agradecida por seus sentidos estarem recuperando-se, praguejava violentamente sobre quão fraca encontrava-se.

Banhada pela lua, uma pequena praça no limiar da cidade, na ponta de uma árvore lhe parecia convidativa. Lá, observou o astro celeste, tão próximo que lhe causava arrepios.

— Serei capaz de defender as vítimas que cruzam caminho com a Renascença?! — perguntou-se, nervosa

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— Serei capaz de defender as vítimas que cruzam caminho com a Renascença?! — perguntou-se, nervosa.

De suas costas, uma névoa negra emanava, tomando forma, conforme as dúvidas e receios aumentavam de modo lascivo pela sua boca. Os amaldiçoou, fervorosa, com seus brados espantando pombos que repousavam ali próximo.

Consumindo sua negatividade, um ser misterioso formou-se. Sua aparência era a de um humano, no entanto, suas unhas eram como garras, seu rosto parecia sofrer com falta de músculos, tinha olhos negros profundos, retraídos, macabros. Verde sepulcral a cor da fumaça expelida pelo enigmático ser. Notando a presença maquiavélica, Milshia contraiu as sobrancelhas.

— Você é a fonte de meus pesadelos... Desde aquele dia! — vociferou, batendo o cajado no chão. — Controla as emoções, atordoa a mente do oponente, golpe baixo esse de sua laia!

Ergueu o cajado contra o adversário. O gargalhar fantasmagórico ecoava como blasfêmia, constatando que a maga planejara a ressureição dele para o mundo material, o nutrindo com cargas negativas.

— Morte é o que traremos para o mundo — maldisse ele, numa sinfonia de desolação e angústia emitida pela boca esquelética. — O sangue derramado marcará a ascensão das trevas.

Flutuando, o inimigo retorceu-se como um animal no abate. Sua imagem e semelhança podia ser traduzida como o pecado.

— Me perguntei por muito tempo o que você era... Ingenuidade minha deixar um espectro de lich me possuir — insultou ela, aumentando a ira do adversário, que avançava.

Aprisionados em um caixão por vontade própria, em honra aos seus mestres já falecidos, os espectros de lich vetam a vida enquanto os antigos líderes mortos-vivos fundem a jaula em que a carne se encontra enclausurada, com poderes profanos. Apegados pela paixão subordinada por aqueles a quem respondem, maculam a própria alma, transformando-se em escravos etéreos, prontos para servir às vontades do mestre mesmo após a morte.

Lascivo e impaciente, ele saltou sobre Milshia, que abençoada pelo vento, esquivou-se das mãos inumanas, saltitando pelo campo de batalha com a leveza de uma pluma levada pela brisa. Perspicaz, ela modificou o fluxo do vento em direção ao alvo, formando uma esfera cortante ao redor do oponente.

Concebido pela escuridão, o inimigo tinha truques desleais escondidos por debaixo daquela pele retorcida. Transformou seu corpo em névoa e misturou-se ao vento afiado, soltando-se da prisão, reconstituindo-se fora do zéfiro.

Erguendo ambos os braços, ele conjurou dois raios negros, lançando-os contra a elfa, que defendeu-se construindo uma barreira de gelo em sua frente. Mesmo sólida, a proteção dela se desfez em milhares de fragmentos.

Aquele espectro de lich absorvia a magia da lua, fortificando-se cada vez mais. Sucumbir a estratégias simplórias significaria a derrocada de Milshia. Ciente dos fatos, ela cogitou reverter a situação, usufruindo de habilidades seladas pelo tempo.

Próximo da elfa, uma energia branca luminosa se materializou. Clara como o mármore, o poder permeava o chão, rodeando a menina, como um furacão. Lentamente, as pupilas da maga tornaram-se esbranquiçadas. Vibrando com força, o cajado estava prestes a pular da mão da menina, enquanto a esfera da ponta brilhava intensamente. Levitando, a maga conjurou uma corrente etérea que saiu de seu cajado e acertou o inimigo, que sentiu as brasas da luz o queimarem.

— Purificar o mundo de desalmados como você é meu objetivo. A Renascença se curvará perante a justiça — sentenciou ela, lançando um novo golpe.

Torrentes de fogo surgiram do chão, apreendendo o oponente, que não teve êxito em sua fuga. Labaredas divinas o dilaceraram, queimando sua essência, extinguindo-o dolorosamente.

Enquanto seu corpo fervia, praguejava contra Milshia, exclamando sobre as visões da ruína.

— Caos derrubará autoridades, vítimas se tornarão assassinos e, assim, o desespero triunfará! — pragou, desfazendo-se como pó, consumido pelo fogo.

Aniquilado o inimigo, a feição de Milshia retornava para seu estado primário, voltando ao chão. Ajoelhou-se, cansada, soltando o cajado ao seu lado. Distante, um pequeno grupo de pessoas se aproximava. Os encarou, como se procurando por alguém, soltando um leve suspiro ao reconhecer uma das faces.

Rumo ao local em que o espectro fora queimado, Emphis murmurou lamentações, analisando a área tocada pelas chamas. Mudou sua atenção em instantes, estendendo a mão para a elfa.

— Ler sua carta causou-me arrepios. Bendito seja Vanara! Devemos expurgar a Renascença de Nabolus do mundo — bradou o sacerdote, agitado.

Gentil, uma brisa manifestou-se no local, banhando-os com uma suavidade invisível, fluído harmônico. Tanto a maga quanto o sacerdote entendiam a fonte daquele vento. Partículas do espectro eram convertidas em luz, purificadas após a segunda morte, descarregando energia em forma de correntes de ar.

Cambaleando, ela andou até a beira da praça. De queixo levantado, encarou a lua enquanto o sacerdote se aproximava. O reflexo lunar em seus olhos refletia uma fé nunca extinguida. Emphis reconhecia a teimosia da garota que crescera sob sua tutela no Templo. Ele virou o rosto para contemplar o astro celeste. Suspirou aliviado, contente por saber que a menina ainda estava viva.

— Sabe... A visão das ruínas... Marcava o despencar de impérios... O fogo varria o mundo... No entanto, eu não lhe contei tudo. — Ela olhou de soslaio para o outro elfo. — Aquele não era o fim, mas a renascença, não do desespero, mas da esperança.

— De fato, o espectro de lich retorceu sua mente, drogando-a com emoções negativas — supôs o sacerdote, debruçando-se na cerca metálica que os separava do céu. — Fortificá-lo com o poder da lua foi um ato inconsequente, no entanto, lhe libertou.

— Um dia, a lua não será símbolo das trevas, da queda. — Pausou, sentindo as últimas partículas do inimigo partirem para o infinito céu. — A ressignificarei, juntarei forças e aniquilaremos nossos jurados inimigos.

— Nossa melhor chance é conseguir apoio da Elite Élfica, minha cara — cogitou o sacerdote, coçando o cenho.

Ali permaneceram, com a escolta do sacerdote a alguns metros de distância, e ambos vislumbrando a noite serena diante deles.

Crônicas de Ríthia - Vol. 1 (Pergaminhos do Multiverso)Onde histórias criam vida. Descubra agora