Massacre das Fadas: Sombras do Trauma

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Ao longo do trajeto de volta para o castelo, Jidra mencionou sobre as aptidões de Kyllene e dos demais falecidos que tiveram o privilégio de compartilhar missões. Evidenciou a vontade de solicitar a transferência da lanceira para seu esquadrão pessoal e assim reviver velhos tempos. Kyllene reconheceu a relevância das palavras da superiora, expondo as possibilidades futuras quando retornasse para o serviço.

— Vejo que não demorará. Já carrega sua lança recém-restaurada consigo — brincou a comandante, olhando a arma.

Dentro do castelo, a conversa fluía, com os acompanhantes intrometendo-se ora ou outra. Pelo clima favorável, a mulher sentia-se confiante para descarregar um pouco do que levava consigo desde o massacre.

— Todos entusiasmados. O carisma de Ulliye... — pontuou ela, relembrando minutos antes da emboscada. — Lamentável que as circunstâncias nos conduziram até o infortúnio.

— Enigmas da vida, não acha? Tudo muda, porventura, rapidamente e de maneiras bruscas — enfatizou a comandante, não se abatendo pelo ocorrido, mesmo que fosse tão covarde aquilo tudo.

Lembrando-se da animação e euforia do grupo quando convocados pela princesa, Kyllene descrevia a cena para os ouvintes. Estava todo mundo no teatro, quando Ulliye aparecera por detrás das cortinas, agradecendo a presença de todos. Em instantes ela revelaria o teor da missão, assunto confidencial, restringindo-se apenas ao conhecimento dos envolvidos.

Revelando as intenções com a criação da trupe, os integrantes vibraram com a honra que lhes fora entregue. No dia posterior partiriam rumo ao objetivo da tarefa.

Os que ouviam o relato da Kyllene não disfarçaram a aguçada curiosidade, restando à Jidra lhes espantar, balançando os braços, para se afastarem. Engraçada era a situação para a lanceira. Havia semanas desde que não desfrutava de momentos divertidos como aquele.

— Pararemos na sala de guerra para que o pessoal guarde seus armamentos — esclareceu a comandante, quando alteraram subitamente a rota.

Kyllene poderia ir na frente e encontrá-los depois, entretanto, resolveu acompanhá-los. Pretendia não se separar deles, fazia bem para si, seu humor parecia regenerar-se andando entre o grupo. Jidra aproveitou o ensejo para obter mais informações sobre a caravana e os percalços.

Próximos da sala de guerra, os soldados adentraram primeiro, Jidra depois, seguida pela lanceira.

— Negar minha ansiedade em saber sobre o inimigo seria uma mentira — declarou a comandante, colocando as mãos na cintura, aguardando todos se arrumarem.

— Sabe... O assassinato de Ulliye é nefasto. Tem algo que não mencionei a ninguém, Jidra. Fatídico é o segredo que culminou na morte deles — citou a fada, batendo a porta.

***

Uma mensagem tinha sido enviada a Phea para que se juntasse a Jidra e Kyllene mais tarde, naquela noite, quando terminasse seus afazeres. Ao chegar na taverna do castelo, estranhou a ausência dos membros do batalhão da comandante. Nem sua amiga lanceira fora vista por lá. Questionou aos frequentadores se tinham notícias sobre o grupo. Um dos militares lembrou-se de tê-los vistos desviando o caminho, rumo à sala de guerra.

Quiçá pararam por lá, cogitou a freira. Não tão distante, encaminhou-se até o local. Vislumbrar Ky se divertindo lhe alegrava, em virtude disso, não desperdiçaria a chance de vê-la vivaz novamente.

Defronte à sala de guerra, estranhou o silêncio. Talvez já tivesse partido cada um para seu dormitório. Apenas se certificaria disso e voltaria para casa.

Tocou na maçaneta, girando-a. Enquanto abria a porta, aumentava-se a claridade da lareira e um odor nauseante escapava pela abertura. Soltou um gemido ao contemplar a cena perante si.

— Ky... — seus olhos se lacrimejaram ao avistar a lanceira em pé, empunhando a arma.

Virando o rosto em direção à freira, tornou-se possível enxergar as marcas de sangue, o rosto maquiavélico e o cadáver de Jidra nas mãos da assassina das fadas.

Crônicas de Ríthia - Vol. 1 (Pergaminhos do Multiverso)Onde histórias criam vida. Descubra agora