Capítulo 9

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Pensei que ir embora me traria algum tipo de satisfação, uma sensação de alívio ou algo parecido; que seria um livramento e que eu ficaria bem com isso. Mas, para a minha surpresa, tudo o que tenho no momento é um peso no peito repleto de mágoa e raiva.

Antes mesmo de virar a esquina da minha rua, estou chorando. Tento pensar em outras coisas para segurar o choro e buscar me acalmar, mas quanto mais tento evitar, com mais força ele vem. Meu peito dói e em vários momentos fico sem ar de tanto que choro e soluço, mas não paro de andar. Não posso parar. Não posso olhar para trás. Não posso voltar.

Meu deus, eu nunca mais vou poder voltar para casa.

Esse pensamento aperta ainda mais o meu peito. Acabo de deixar minha casa para trás, a casa que foi minha por mais de dez anos, a casa onde cresci, onde morei até então. Deixei minha casa para sempre. É real. Aconteceu. Eu fugi, e Agnes sabe, e Agnes não vai me deixar voltar. Não posso mais voltar. Nem se eu quiser.

Já estou na segunda quadra longe de casa quando começo a sentir pontadas no peito e a minha respiração entrecortada, ofegante. Uma agonia que cresce pelo meu corpo, um incômodo que não sei explicar. Não consigo respirar; minhas pernas estão fracas e meu corpo ainda quer chorar e quer colocar tudo pra fora, e rapidamente fico sem fôlego e energia para fazer tudo ao mesmo tempo. Dou mais alguns passos para frente, mais cambaleando do que andando, e minha boca fica imediatamente seca, uma sensação que conheço bem. Perto de umas latas de lixo em frente a um cercado, eu me curvo e vomito.

Era só o que me faltava ter um ataque de nervos agora, penso irritada comigo mesma. Trêmula, me sento no chão ao lado da lata de lixo, onde encosto a cabeça do lado, e busco na minha cabeça todas as táticas que me ajudam a me acalmar. Contar até dez. Pensar em uma música calma. Tentar controlar minha respiração. Tateio minha mochila atrás de alguma coisa que me ajude a controlar a respiração e que eu pare de hiperventilar, mas não encontro nada. Então, coloco minhas mãos fechadas em uma concha na minha boca e espero pelo melhor.

Não sei por quanto tempo fico sentada no chão gelado da calçada, mas começo a me sentir melhor. Meu corpo agora só treme pelo frio que faz, e minha respiração está mais controlada. Espero mais alguns minutos somente para ter certeza de que vou conseguir seguir meu caminho. Tento não pensar em tudo o que aconteceu para não surtar novamente; um lampejo de Agnes me olhando faz com que a minha garganta tranque em uma ameaça a um choro. Então me levanto, e durante a caminhada busco me concentrar em coisas aleatórias, como o formato do concreto da calçada e não pisar nas linhas divisórias de uma lajota para outra, ou nas cores do tênis que estou usando.

Vinte minutos depois, avisto o ponto de táxi, mas passo reto. A ideia era pegar um táxi para economizar tempo, mas agora estou com a minha fuga em mente; se eu não quero ser encontrada, pegar um táxi não é a opção mais esperta. O taxista vai se lembrar de uma jovem ruiva que apareceu tarde da noite e pediu para ele levá-la até um galpão a quinze minutos dali, onde até poucos dias ou horas atrás tinha uma caravana de circo.

Engulo em seco e sigo meu rumo, a pé. Não posso deixar quaisquer brechas para caso Roger venha a me procurar. Eu duvido que ele faça isso — Agnes com certeza vai conseguir convencê-lo do contrário —, mas preciso me precaver. Abrir mão do táxi vai me custar mais longos minutos de caminhada, mas melhor isso do que ser encontrada em poucos dias e, talvez, condenar o Midnight Tsirk.

Porque, lógico, ninguém vai pensar que eu quis fugir de casa por livre e espontânea vontade para viver em um circo. Eu, a filha de um prefeito, cuja esposa vive mostrando pra todos a vida perfeita que tem. As pessoas vão pensar que o Midnight Tsirk me aliciou, ou me sequestrou, mas jamais que eu quis deixar minha vida boa para trás.

A garota que não pode morrer - Série Midnight - Volume 1Onde histórias criam vida. Descubra agora