- Essa viagem vai durar quantos dias? – Minha mãe pergunta quando eu a informo sobre a viagem para Morro de São Paulo.
- São cinco dias. A gente vai na quinta e volta na segun... – Alguém bate na porta. – Deixa que eu abro.
Enquanto minha mãe vai se juntar ao meu pai na cozinha, eu levanto do sofá e vou abrir a porta para Mateus. Ele insistiu em conhecer os meus pais mesmo sem completarmos sequer uma semana de namoro. Vejo que ele trouxe outro buquê de flores. O que esse menino tem com flores? É dono de uma floricultura? Meu pai vai amar porque ele é apaixonado pelo cheiro de flores mas minha mãe tem alergia, então elas vão acabar no lixo.
- Oi, Mateus! Pode entrar. – Eu o abraço e dou espaço para ele passar. - Você está bem? Está nervoso? – Eu pergunto quando percebo a cara apreensiva dele.
- Não. – Ele nega muito exageradamente para ser verdade. – Tudo bem, talvez. Um pouco.
Eu pego sua mão e o guio até a cozinha, onde minha mãe já está sentada na mesa e meu pai está do lado do forno esperando a lasanha ficar pronta.
- Então esse é o famoso Mateus! – Minha mãe diz, porém a primeira vez que meus pais ouviram falar sobre Mateus foi hoje 40 minutos atrás quando avisei que ele estava vindo. Eles sempre apostaram que eu e Cecília acabaríamos namorando.
Minha mãe o abraça e o convida para se sentar à mesa.
- Bem-vindo, Mateus! – Meu pai grita do outro lado da cozinha.
- Obrigado, senhor Márcio.
- Nada de "senhor" aqui, garoto! – "Senhor" Márcio avisa. - Nos chame de Cristina e Márcio.
- Você é novato, não é, Mateus? Está gostando da cidade? – Minha mãe começa o interrogatório.
- Sou. Cheguei aqui em Ribeirão Franco no início do ano. Estou gostando da cidade. Claro que sinto falta da minha mãe e dos meus amigos, mas acho que estou me adaptando bem.
- Qual é o nome do seu pai? Onde ele trabalha? Essa cidade é um ovo, então vai que eu conheça ele!
- João Ferreira. Ele e minha madrasta abriram uma floricultura na ali na Rua Miguel XVIII.
Nesse momento, pedi desculpa mentalmente por ter rido antes por ter achado que eles teriam uma floricultura. E eles realmente têm uma floricultura. Nada contra floricultura e quem trabalha nelas. O meu problema é com flores. Eu não gosto de receber flores. Mas nada contra o comércio, tá?
- Falar em madrasta... Além de você, seu pai e sua madrasta, tem mais alguém que mora com vocês? – Dona Cristina continua o interrogatório e eu já estou ficando sem paciência quando percebo que a lasanha do meu pai ficou pronta.
- O Pietro, filho da minha madrasta, também mora com a gente. Ele até namora com a sua sobrinha Laís. - Mateus responde e o queixo da minha mãe cai quando ela se vira para mim.
Enquanto isso, meu pai se aproxima da mesa e posiciona a lasanha no centro. Um silêncio paira no ar e ele o quebra quando se vira pra mim com uma cara de decepção e pergunta:
- Laís é... Laís é... – Ele diminui o tom de voz e chega mais perto. – ...Hétero?
*****
Essa provavelmente foi a noite mais chata da minha vida inteira. Meus pais são muito engraçados e sempre conseguem deixar o ambiente leve e divertido, mas dessa vez, não houve salvação. Nenhum assunto surgia e quando surgia acabava rapidamente. As últimas horas foram cheias de risadas falsas e sorrisos amarelos.
Estamos todos na sala. Eu estou meio deitada no peito de Mateus, que entrelaçou seus dedos nos meus e está fazendo carinho no meu cabelo com a mão livre. Meus pais estão no outro sofá, em frente ao nosso, sentados juntinhos, fofocando sobre alguma coisa. A TV está ligada no BBB e esse jantar só não tá mais chato que a festa deles.
A coisa mais interessante da noite foi quando Cecília, que tem uma cópia da chave, veio comer um pedaço da lasanha porque, segundo ela, dava para sentir o cheiro do outro lado da rua.- Thalita, essa casa ainda é sua. Vem colocar comida para a visita. – Ela diz se referindo a si mesma. – Seu carrapato pode vir também. – Agora ela está se referindo ao meu adorável namorado.
Mateus se levanta antes de mim e percebo que eu não era a única que estava achando a noite insuportável. Vamos todos para a cozinha e consigo convencer Cecília a comer a lasanha aqui, e ela aproveita para esquentar o macarrão que sobrou do almoço. Enquanto esperamos o micro-ondas, ela pergunta:
- Como está sendo a noite? Gostou dos seus sogros, Mateus?
- Eu gostei deles, mas não sei se eles gostaram muito de mim. – Ele faz uma cara triste que mais parece uma careta.
- O problema não é você. Eles só gostam mais de mim, e vamos concordar que ninguém chega aos meus pés. – A comida fica pronta.
- Será que é porque eu sou homem?
- Nem vem com esse papo, Mateus. – Digo sem nenhuma paciência.
Ficamos todos em silêncio até o celular de Mateus começar a tocar.
- É o Pietro. Já volto. – Ele diz e sai da cozinha.
Olho para Cecília e ela está com uma cara engraçada.
- O que foi?
- Nada. – Continuo encarando-a e levanto uma sobrancelha. – É só que o clima estava meio tenso, né? Vocês mal conversavam, ou sequer se olhavam direito.
- Impressão sua. – Eu digo e caminho até o seu lado.
- Não! – Ela grita quando eu tento beliscar um pouco da lasanha. – Você sabe o quanto eu amo lasanha com macarrão.
- Para de ser egoísta, garota. – Pego o garfo de sua mão e ponho na minha boca.
- Eu te odeio.
- Odeia nada.
- Odeio sim. Mas, se você me der um beijo, talvez te odeie um pouquinho menos. – Ela faz um biquinho e eu beijo sua bochecha. – Mesmo com esse beijinho mixuruca, a gente tem mais química que você e aquele carrapato.
- Para de chamar ele de carrapato. – Reclamo mas mesmo assim dou risada. – Você e eu temos mais química porque a gente se conhece a mais tempo.
- Tá. Se você acha. – Ela diz de boca cheia. – Me ajuda aqui.
O macarrão está caindo de sua boca e ela está toda lambuzada. Resolvo pegar um guardanapo e entregar a ela.
- Não tem sequer um guardanapo nessa casa. – Digo quando percebo que o pacote de guardanapos está vazio.
- Então passa a língua aqui para limpar. – Ela propõe brincando.
- Muito engraçada. – Eu reviro os olhos.
Molho a ponta do dedo e passo no canto da sua boca para limpá-la. Chego mais perto e nossos olhos acabam se encontrando.
Minha mão escorrega para sua nuca e eu começo a acariciá-la involuntariamente. Sinto seus pelos arrepiarem e vejo um sorriso se formar em sua boca quando chego ainda mais perto. Ela posiciona as mãos em volta da minha cintura e se levanta da cadeira que estava sentada.
Consigo sentir seu hálito e sua respiração lenta.
Se não fosse pelo barulho de algo quebrando, nossos lábios provavelmente encostariam completamente.
Nos separamos com um pulo.- Pietro...é... o Pietro está saindo da casa da Laís e eles vão passar aqui para me dar uma carona. – Ele abaixa para pegar o celular, que estava aos pedaços no chão, e não faz contato visual nem por um minuto. – Já vou, tá? – Fala apressado e se retira mais apressado ainda.
- Vai trás dele, Thalita! – Cecília sacode o meu ombro e me faz acordar para a vida. Decido seguir a sua ordem.
- Mateus! – O alcanço. – Mateus. Isso realmente não é o que você pensa. A gente... – Ele se vira, olha nos meus olhos e eu começo a gaguejar. – A gente só estava fazendo uma brincadeira. Juro.
- A gente conversa amanhã, tá? Relaxa. – Ele abre a porta e eu escuto seus passos, mas não vejo a luz de nenhum carro.
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Clichês de livros
RomanceAlém de ter que lidar com as complicações que envolvem ser uma aluna de terceiro ano do Ensino Médio, Thalita deve lidar com um namoro que já começou destinado a terminar e com os sentimentos que envolvem a sua melhor amiga, Cecília. A garota que se...