capitulo dois - Alice

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Faltava duas semanas pra voltar das férias escolares, e como todo ano eu passei as férias programado as aulas para a turma nova. Enquanto todos estavam de férias, eu continuava trabalhando. Gostava de programar todas as minhas aulas. Meus pais ainda não tinham ido me ver, fazia 5 meses desde a última vez que os vi. Era um domingo à tarde, estava finalizando algumas aulas quando meu telefone tocou, olhando na tela do celular vi que era minha tia Neide, a única irmã da minha mãe é a única tia que eu tinha.  Atender aquela ligação mudou tudo.

Minha tia Neide me deu a triste notícia que nenhum filho espera receber. Meus pais morreram em um acidente de carro. Ao ouvir suas palavras fiquei desnorteada, sem chão. Não acreditava. Ela me disse que eles estavam vindo me ver queriam fazer surpresa, mas um motorista bêbado acabou passando por seu caminho.

Cheguei em plenitude no começo da noite. Estavam velando meus pais na funerária da cidade. A funerária estava cheia, eles eram muito queridos por todos na cidade, vi isso no rosto de cada um que vinha me dar os pêsames com lágrimas nos olhos. Minha tia Neide e minha prima Rebeca estavam abaladas, e eu parecia estar em choque, não acreditava. Mesmo vendo eles no caixão não acreditava. Parecia que estavam dormindo e que a qualquer momento iriam acordar. Mas, não acordaram. Depois de algumas horas de velório, já era de madrugada, saí do meu transe e comecei a olhar em volta da sala da funerária, percebi duas  coroas enormes  de flores próximo aos caixões, os dois caixões estavam lado a lado como eles sempre estiveram em vida. Nunca saíram um perto do outro, e assim permaneceram até o fim. Cutuquei minha prima que estava ao meu lado e perguntei:

-Quem mandou essas coroas de flores?
- A família Andrade! - respondeu Rebeca com lágrimas nos olhos.

Continuei calada, reprimindo o choro, mas as lágrimas caiam sem que eu  percebesse. No outro dia ainda de manhã, enterrei meus pais. Voltei para o apartamento que tínhamos na cidade, o único bem material que eles deixaram pra mim. Passei o resto do dia deitada na minha cama,no meu antigo quarto que ainda estava como eu o deixei. Parecia que o tempo tinha parado ali, estava tudo como sempre foi, mas meus pais não estavam mais. E isso doía. Chorava e chorava, era a única coisa que me restava fazer. Dormi a noite toda. Acordei no outro dia de manhã com a campainha tocando.

Me levantei com as roupas que eu estava usando desde que cheguei a cidade, calça jeans azul escuro,  e uma camisa preta. Abri a porta e vi minha prima com um prato na mão coberto por um pano de prato.

-Bom dia prima. - disse ela com a voz triste e o rosto inchado de tanto chorar. - minha mãe fez bolo de laranja. Ela lembrou que é o seu preferido. - ergueu  mais o prato na mão. Não falei nada, só afastei meu corpo para que ela pudesse entrar.

Rebeca entrou e foi direto pra  cozinha americana, colocou o bolo em cima da mesa e foi para o outro lado do balcão de mármore que dívida a cozinha. Eu sentei na cadeira da mesa e fiquei olhando enquanto ela fazia um café. Ficamos em silêncio até que eu quebrei o meu próprio silêncio.

-Eles estavam indo me ver… - disse tão baixo como se tivesse dito pra mim mesma. Mas como o silêncio era predominante na casa, Rebeca ouviu, fechei os olhos e as lágrimas desciam, respirei fundo e continuei. - eles queriam fazer uma surpresa… se não tivessem ido, estariam aqui, comigo.

-Alice. Essas coisas não existe explicação você sabe… - falou colocando as duas xícaras de café na mesa e sentando na minha frente.
-Eu sei. - falei com os olhos ainda fechados.
-Você sabe o que eles queriam te dizer quando decidiram ir te ver?- perguntou Rebeca. Só fiz que não com a cabeça. - bom, eu não  sei se  é o momento para falarmos sobre isso, minha mãe pediu pra que eu não falasse nada por enquanto mas… - abri os olhos e fiquei parada a ouvindo como se estivesse repreendendo a si mesma pelo o que ia falar.- surgiu uma vaga aqui na escola primária, é a sua área, então a tia Nalva conversou com a diretora e falou sobre você,  a diretora tinha concordado em conversa com você. Eles estavam indo te dar a notícia e perguntar se você queria voltar para casa. - fiquei parada sem reação, realmente era uma surpresa. Minutos se passaram e eu não dei se quer, uma resposta para o que a minha prima tinha me dito. Até que ela puxa outro assunto. - você volta quando?

-Eu não sei. As aulas só começam daqui duas semanas… acho que fico até o final de semana não sei. - falei meio atordoada.

-Alice. Você não está só. Você tem a mim e a minha mãe saiba disso. - falou olhando firme nos meus olhos. - agora, você tem que ser forte.  - cortou um pedaço do bolo e colocou num prato na minha frente como se me dissesse: coma. Eu comi uns pedaços da fatia, não tudo, e bebi dois goles de café que estava bem forte, vi que ela parecia satisfeita por eu ter comido um pouco. - bom, eu tenho que ir, preciso fazer o almoço e levar pra minha mãe mais tarde no hospital… você quer ir comigo? - perguntou se levantando da cadeira.
-Onde?  - pergunto, não tinha ouvido direito, estava ainda pensando no que ela havia me dito ainda.
-No hospital levar o almoço da minha mãe. Vai ser bom pra você sair um pouco. E rever a cidade. - falou se dirigindo a porta.
-Ta. - respondi. E ela saiu fechando a porta atrás de si.

Eu não tinha muita afinidade com a minha prima. Quando ela nasceu eu já tinha 8 anos, minha mãe e minha tia Neide tinham se mudado para plenitude depois que minha avó morreu há mais de 30 anos, assim que chegaram em plenitude, começaram a trabalhar no único hospital da cidade. Minha mãe se casou com meu pai logo em seguida e me tiveram. Minha tia, casou um pouco depois que eu nasci e demorou pra ter a Rebeca. Quando eu tinha 8 anos ela engravidou e ainda grávida o seu marido faleceu. Minha mãe contava que ela tinha ficado muito arrasada, amava ele e estava grávida. Nunca mais se casou novamente depois que o pai de Rebeca morreu.

Me lembro de brincar com minha prima quando ela estava começando a andar. Depois, um pouco mais velha, foquei nos  estudos. Quando saí de plenitude minha prima tinha 10 anos, era uma criança. Desde então,não tinha visto mais. Minha mãe me mandava algumas fotos dela. Lembro que ela tinha me falado que Rebeca trabalhava como bibliotecária na cidade, que haviam construído uma biblioteca depois que eu saí. Mas não tínhamos contato. A distância e nossa diferença de idade, nos distanciou.

A Professora Do Meu FilhoOnde histórias criam vida. Descubra agora