Ceifador

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Duas semanas se passaram desde que Eduard morreu, foram dias agoniantes, lembro-me de cada segundo que passei naquele lugar, do corpo dele sendo retirado pela polícia e dos gritos intermináveis de tia May.

Percebo que estava em pé, apoiada sobre a janela, volto a minha cama e ao deitar as recordações retornam para me assombrar.

Eu me vejo ajoelhada sobre a grama, enquanto a polícia vinha, tinha pessoas demais, elas estavam atrapalhando e muitos tiravam foto do corpo de meu primo sem o minímo de respeito, eu queria correr e impedi-los, mas eles estavam sedentos por fofoca nova e com certeza amanhã de manhã a cidade toda estaria lotada de repórteres e equipes de emissoras de televisão. Isadora Black deveria estar cheia de trabalho agora, ela estava tentando esconder a atual realidade da nossa cidade, mas agora era tarde demais, todos sabíam e não esqueceríam tão cedo.

Uma moça me cutuca, viro e a olho, ela estava com um cobertor e disse que eu a devia acompanhar, era uma enfermeira, vestia roupas brancas. Carol estava vindo junto, um moço a ajudava e ele devia estar consolando-a, não ouço nada e nem ninguém, tudo era aterrorizante, era como se um balde de água fria tivesse caído sobre nossas cabeças, o que estava acontecendo? Eu não sabia a resposta e estava longe de saber.

Um pássaro pousa na janela de meu quarto e isso me puxa para a realidade e lembro-me do olhar de minha mãe, nele havia culpa, desespero e ódio. Outro pensamento surge em minha cabeça, mas não era isso e sim uma lembrança, algo de minha infância.

Era natal, provavelmente no ano de 2006, eu tinha cinco anos e estava sentada no sofá, uma Helenna me olhava ansiosa, pois em alguns minutos receberíamos nossos presentes natalinos. Nunca acreditamos em Papai Noel, minha mãe achava desnecessário fazer uma criança sonhar com algo que mais tarde seria revelado uma mentira. Meu pai chega e um sorriso preenche seu rosto, ele está com um pacote enorme nas mãos e este estava embrulhado com um papel vermelho, ele abraça minha irmã e lhe entrega o presente, que mais tarde se revela como uma caixa de maquiagem gigante, fico feliz e com uma certa inveja da minha irmã, mas esperava que o meu seria maior e melhor, mas quando ele chega, eu vejo que não passava de uma esperança fútil, era uma escova enrolada com um lacinho, e fico indignada.

— Papai, por que meu presente é menor?

— Helenna se comportou melhor esse ano, Bella, e agora teve a recompensa dela. – ele sorri.

Não era justo, eu me lembrava de ter feito absolutamente tudo que eles pediram durante o ano, até arrumei meu pequeno guarda-roupa, e eu odiava fazer isso.

— Tudo bem, papai.

— Não fique com inveja de sua irmã, ela não merece nada disso.

— Claro. – e sorrio com meus pequeninos dentes tortuosos.

— Bella, espero que não fique triste filha, mas precisa aprender sobre o senso de justiça. – entoa mamãe com aquele sorriso bondoso que só ela conseguia fazer.

Ela me puxa para um canto e diz algo em meu ouvido:

— Você não é invejosa, seu pai apenas não sabe se expressar direito, entende?

— Sin, entendo.

— Isabella, você tem visita. – a voz de meu pai adentra o quarto e cá estou eu nos dias atuais.

Minha mente é muito fértil e já estou cansada de sonhar acordada, dizem que os sonhos são nossos refúgios, mas acredito também que são nossos pesadelos.

Ao descer as escadas percebo quem estava me esperando, Carol e sua mãe Justine, ambas estavam com expressões levemente alegres, mas a tristeza se destacava.

Cicatriz NegraOnde histórias criam vida. Descubra agora