Prateado

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As luzes da minha casa estavam acesas quando chego, mas não apenas uma ou outra, parecia ser todas. Elas formavam uma mistura de luminosidade e aconchego, quando chego na porta, ouço um barulho e várias risadas, abro sem pensar duas vezes. Minha família e mais algumas pessoas que não reconheço, exceto Guilherme, estavam reunidas na mesa de jantar. Havia várias bebidas e comidas, todos conversavam distraidamente e alegremente que nem notam a minha presença.

— Se eu fosse o prateado já teria esfaqueado todos vocês, deixam a porta aberta assim... – reviro os olhos.

Alguns param para me olhar, mas logo voltam a fazer o que estavam fazendo, seja lá o que fosse. Subo até o quarto esperando encontrar Helenna, mas só me deparo com algumas folhas e um livreto velho sobre a sua cama que logo noto ser o de fotografias da nossa família que obviamente ela estava olhando atrás de lembranças ou reviver momentos nostálgicos.

— Helena... sempre vendo essas coisas bobas. – sorrio para mim mesma.

Mas eu não acreditava nas minhas próprias palavras, pois não era nada bobo e sim marcante. Na primeira página visualizo uma foto com três crianças sujas de lama e que faziam caretas para a câmera. Eu e meus primos. Um devaneio toma conta de tudo, e me vejo brincando com eles naquele dia e em vários outros, das tardes maravilhosas e que deveriam ser intermináveis, que saudade... A gente era feliz, inventávamos histórias de terror, fingíamos ser piratas em busca de um tesouro perdido ou super heróis salvando a humanidade do mal.

Outros pensamentos se aproveitam e invadem, o funeral de Eduard, o seu corpo estava rígido no caixão e seu pescoço era o que mais chamava atenção pelos cortes profundos causados pelo arame farpado. Ele parecia estar dormindo, e eu realmente queria que fosse apenas isso, eu segurei a sua mão tão forte enquanto chorava profundamente, perder uma pessoa já dói, agora duas... era demais.

Me sinto angustiada por não pensar em Fabian, ela já havia saído do hospital e nem a visitar fui, que péssima amiga eu sou...

Ouço alguém subir as escadas, apesar dos barulhos, fico atenta esperando quem seja.

— Como foi a viagem filha, se divertiu em Spokane? – diz minha mãe adentrando o ambiente.

— Foi interessante, conheci uma mulher bondosa e verdadeira. Uma pessoa real, se é que me entende.

— Que bom, Justine é uma boa mulher, independente de tudo.

— Como assim? – questiono.

— Deixá para lá...

— O que estão comemorando?

— Nada, estamos só em uma reunião para livrar esse tempo ruim. – declara ela.

— Estão fingindo que a morte de Kau e Eduard são irrelevantes, não é?

— Isabella, não tente ser a protagonista da dor, eles são seus primos, mas também eram meus sobrinhos... Não se esqueça disso.

Chacoalho a cabeça em negativa e me viro para a janela, escuto-a sair do quarto enquanto analiso a luz do luar tornar as sombras das árvores em grandes serpentes fantasmagóricas que balançavam com a brisa noturna. Sinto meu celular vibrar e tem uma mensagem nele:

Raynara: Bella, segue a ficha de Breno no documento abaixo, analise-o.

Era uma foto do obituário, a causa da morte foi por um galho que foi inserido diversas vezes em seu estômago, deixando uma profunda incisão. Havia uma observação abaixo, dentro do corte haviam jogado uma tinta que foi identificado como esmalte sintético de cor preta, deixando o local escurecido. Mas porque diabos o assassino fez isso? Um tipo de marca? Será que é uma recriação do assassino do zodíaco que deixava símbolos em suas vítimas? Isso é estranho... Foi como Karina disse, uma cicatriz negra.

Cicatriz NegraOnde histórias criam vida. Descubra agora