capítulo 14

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A semana depois daquele acontecimento, foi a mais pesada em toda a vida de Chloe. Durante a semana inteira, a garota acordava suada tendo pesadelos ou sequer dormia por conta da insônia e chegou a ficar quase dois dias sem pregar os olhos. Suas crises de ansiedade vieram com frequência, e Anna ficava ao seu lado o tempo inteiro para garantir que ela se acalmasse.
— Anna...
A loira estava abraçando a cintura da namorada enquanto a mesma fazia carinho em seus cabelos.
— Oi amor.
— Você sabia que eu sempre fui uma criança quietinha?
Anna sorriu. Ela percebeu o que Chloe queria, ela queria lhe contar seu passado.
— Chloe, se você está tentando me contar sua história, saiba que não precisa se não quiser.
— Não, amor. Eu quero. É minha culpa tudo isso...
— Não é sua culpa.
— Por favor. Eu quero que você saiba tudo sobre mim. Sem exceção.
— Se você insiste. Sou toda ouvidos.
Chloe respirou fundo e pensou por onde começar. E então disse:
— Eu não lembro muito dos meus pais na minha infância. Mamãe é uma estilista muito famosa, e tinha que viajar muito então obviamente eu não podia ir. Papai passava mais tempo na empresa dele do que em casa, teve uma época da minha vida que eu cheguei até mesmo esquecer o rosto dos dois.
— Eles trabalhavam o tempo todo? E você ficava com quem?
— Com a antiga governanta da casa. Ela já faleceu, mas era uma boa senhora.
— Entendi.
Anna se deitou aconchegando sua cabeça no peito da jovem.
— Quando a governanta faleceu, meus pais foram obrigados a ficar mais tempo comigo. — Chloe suspirou pesadamente. — Eles perceberam que eu não conversava muito e acharam isso bom. Porém, quando viram que eu não gostava de vestidos, bonecas e outras coisas assim, tentaram me concertar.
— Tenho medo de perguntar... Mas como eles tentaram te concertar?
A loira ficou alguns segundos olhando fixamente para a parede, se lembrando da infância.
— Eu era forçada a usar vestido até mesmo dentro de casa. Fui obrigada a aprender cozinhar, lavar, passar e ficar sempre calada. De acordo com a minha mãe, se eu aprendesse isso, eu teria sucesso na vida. E quando eu discordava, ela me batia. Não vou entrar em detalhes. Ela também falava vários tipos de coisa que me faziam sentir culpada, como se tudo que desse errado fosse culpa minha. Era uma verdadeira lavagem cerebral.
— A gente pega a sua mãe e joga na frente de um trem e tá tudo resolvido.
Isso arrancou um riso fraco de Chloe o que fez a morena sorrir também.
— Quem me dera.
Seu riso sumiu e ela continuou:
— Por sermos ricos, tínhamos que ir em muitas festas chiques e foi lá que conheci meus amigos, duas meninas e um menino. Ou pelo menos, eu achava que éramos amigos. Conheci aquelas três crianças diabólicas aos oito anos, e convivemos até os meus quinze. — Chloe começou a fazer carinho em Anna. — Eu havia criado uma personalidade completamente nova para que todos gostassem de mim. Mas aí houve um problema. Eu comecei a gostar de uma das minhas amigas.
— E ai seus pais descobriram?
— Foi pior que isso. O menino achou que era dele que eu gostava, porquê a menina estava sempre colada com ele então eu acabava encarando os dois sem querer. Esse menino tentou me humilhar na frente das minhas amigas chamando meus pais e dizendo que eu estava sendo indecente e que eu tentava seduzir ele. Óbvio que meus pais não acreditaram em mim.
— Vamos jogar sua mãe e esse menino na frente de um trem.
Um riso alto ecoou pelo cômodo.
— Para de me fazer rir! Deixa eu terminar a história.
— Tá bom.
— Ele repetia várias e várias vezes que eu gostava dele e eu tentei desesperadamente me defender dizendo que não gostava. Meus pais disseram que eu não precisava ter vergonha de gostar dele, mas que eu não podia fazer coisas "indecentes".
— Você se defendeu né?
— Sim. Mas do jeito errado. Eu fiquei desesperada naquela hora, provavelmente porquê eu estava começando a desenvolver a minha ansiedade. Então acabei gritando que que gostava da garota e não dele.
Uma lágrima escorreu pela bochecha de Chloe e Anna a secou beijando seus lábios logo em seguida.
— Eu tô aqui. Se não quiser continuar, não precisa.
— Tudo bem. Eu quero. Se a minha vida já não era um inferno antes, a partir desse momento então, parecia que eu já estava morrendo. Depois do que eu falei, papai me arrastou para dentro e começou a estapear meu rosto até que sangue saísse. Minha mãe, só assistia.
— Ótimo, agora tenho uma lista de cinco pessoas para assassinar!
— Depois a gente combina esse massacre. Continuando, não demorou um mês para que todos soubessem que eu nasci "defeituosa". E graças a isso eu apanhava todo dia. Todo santo dia. Meu pai dizendo que eu era uma vergonha e minha mãe se perguntava o que ela fez pra merecer uma filha como eu. Foram dois anos sofrendo isso, dos quinze aos dezessete eu me perguntava se eu realmente tinha nascido com defeito. E antes mesmo de eu perceber, as minhas perguntas foram de "Por que eu sou pansexual?", "Por que sinto atração por garotas?", para "Por que eu nasci?".
— Resumindo, você sofreu abandono afetivo, abuso psicológico, homofobia e agressão?
Chloe sorriu fraco sem nenhuma emoção.
— Acho que sim.
Anna se levantou abruptamente assuntando a garota que também se sentou na cama esperando a morena dizer algo.
— Chloe...
— Oi?
— Você é a mulher mais forte que eu já vi! Eu não podia ter uma namorada mais perfeita. Caramba, você é incrível. — Disse Anna se jogando na amada e a enchendo de beijos. — Eu te amo. E amo você ter superado tudo isso, eu amo tudo em você.
Chloe beijou a namorada apaixonadamente.
— Eu também te amo. Te amo tanto que algumas semanas atrás comprei algo maravilhoso!
A loira pegou uma caixa onde havia um brinquedo rosa choque. E sorriu ao ver a expressão de espasmo vindo de Anna.
— Chloe... Piedade...
— Acho que vamos nos divertir muito essa noite. Não acha, amor?
— Droga. — Falou a garota rindo.

Te conheci em meio a dor Onde histórias criam vida. Descubra agora