Capítulo III

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                   Edite estava me pintando numa manhã, eu fizera uma pose romântica e dramática abaixo da pinheira, deitado entre lençóis e livros para isso, quando eu ouvi os tão esperados uivados partindo da estrada. Eu fiquei tão feliz, mas preocupado.

— Lobos no Brasil? — perguntou Edite confusa segurando o pincel entre seus dedos.

                   Eu desfiz minha pose e fui correndo para a porteira, era Antônio e Branca, como eu imaginava, eles desceram da bicicleta. Branca correu até mim e me abraçou, fazia mais de uma semana que não nos víamos. Sua pele estava bronzeada, ela com certeza aproveitara muito Genipabu, porém eu sentia que sua empolgação não duraria muito. Ao me abraçar, ela viu, um pouco distante dali, vindo até nós, Edite. Eu ouvia seus passos na grama, ouvia os galhos quebrando, mas eu ignorei como se ela não estivesse lá, porém era inevitável, quando percebi ela estava do meu lado.

— Oi, Antônio! –– disse ela pulando nas minhas costas. — Como você está? — ela ignorou completamente Branca, por um momento.

— Eu estou bem, minha linda. — disse ele encostando a bicicleta no umbuzeiro.

                    Edite, num tom provocativo, perguntou quem é a garota.

— Meu nome é Arabela, mas me chame de Branca.

                    Elas não pareciam estar tão incomodadas como eu estava e talvez a rivalidade surgira apenas na minha cabeça. Eu acredito que era o meu medo, ele me fazia imaginar coisas que não existiam apenas para eu me preparar quando eles tomassem a realidade e não fossem mais coisa do meu mundo ansioso. Eu estava sendo um idiota, poupando minhas palavras com Edite, a menosprezando, e ela parecia tão feliz ao lado de Branca, elas duas poderiam ser melhores amigas se aquilo continuasse, mas eu custava a acreditar.

                   Chovia, porém fazia sol, casamento de raposa. Quando estávamos no alpendre, Edite saiu na chuva puxando Antônio, parecia que eles tinham a mesma intimidade que nós três tínhamos. Eles dois caíram feito porcos na lama e brincaram feito crianças. Branca não aguentou e também foi, restava eu tirar minhas roupas e ceder àquilo, e eu cedi. Estávamos apenas com as roupas debaixo, correndo um atrás do outro como filhotes de cachorro. Aquilo foi divertido, eu não podia negar, eu passei a acreditar numa harmonia entre nós quatro, mas aquele dito da minha mãe servia como uma mantra, sempre, O amor é perigoso, e se o amor por si era perigoso, o quanto perigoso poderia ser um amor multiplicado por quatro? Eu poderia amá-los da mesma forma? Eu não sabia, e aquilo me deixava angustiado.

                    Fomos correndo até a lagoa que não era tão longe dos fundos da casa e logo chegamos. A chuva parecia que cessava cada vez mais, era uma fotografia linda de se ver: raios de sol refletidos no cabelo de Edite, a água escorrendo pelo corpo de Antônio, o espectro da água na pele branca de Branca e os pássaros gemendo, gemiam como minha alma, louco de desejo, louco de amor. Quando chegamos na lagoa, a chuva já parara mas o sol parecia que brilhava como nunca brilhara antes. Eu achava que Edite seria difícil de lidar na presença deles dois, porém ela criou laços mais rápido com eles do que eu criara. Edite se permitia, diferente de mim que era desconfiado de todos à minha volta. Branca subiu no meu pescoço e Edite na de Antônio, travamos uma guerra na água. Depois que o tédio chegou e nossas mãos estavam enrugadas, por ficar por tanto tempo na água, saímos e fomos até ao alpendre onde havíamos deixado nossas roupas, as meninas iam na frente e eu e Antônio íamos logo atrás. Ele havia passado seu braço sobre meus ombros, estávamos colados, era notório saber que aquilo era mais que amizade e foi exatamente isso que Leila viu ao chegar da escola de ballet que a mesma lecionava.

— Nós precisamos ir. Eu, na verdade, meus primos estão na minha casa e meu quarto já deve estar uma baderna e só tenho a carona do Antônio, então... — disse sorrindo, aparentemente satisfeita. — Nós vamos nessa.

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