Edite estava falando com seu pai ao telefone logo bem cedo, ele avisara que não poderia comparecer à fazenda naquele dia para a festa de aniversário do meu pai que se iniciara na mesma manhã. Ele a levaria para casa naquele dia, ela já havia feito até as malas, porém teria que esperar até a segunda para voltar para sua cidade. Um dos funcionários do meu tio morrera naquela manhã, era um indigente e ele precisava organizar o velório, isso o prendeu em Santa Cássia por mais dois dias.
Já havíamos nos despedidos de uma forma mais íntima na noite anterior. Eu só queria tê-la só mais por uma noite, sentir o cheiro de seu perfume de pitanga no seu pescoço. Eu quis tanto que ela fosse embora e agora que ela estava indo, eu não a queria deixar ir. Eu estava completamente apaixonado por Edite, mas parecia tarde demais para cultivar aquele amor. Ela voltaria para Santa Cássia, onde é desejada, e encontraria alguém menos problemático que eu e que a amasse sem barreiras imaginárias como eu a amei. Tentei compensar o que não havia feito por ela, posteriormente, nos dias que nos sobrara.
Meu pai completara cinquenta anos naquele maldito dia. Ele planejara uma festa na fazenda, como fizera todos os anos. Amigos de trabalho, alguns membros da família de longe, muita bebida e bolero resumia aqueles dias. Eu perdia a conta de quantas vezes tocara Naquela Mesa de Nelson Gonçalves. Eu e Edite já estávamos entediados. Os adulto conversavam e bebiam numa mesa embaixo da enorme sombra do umbuzeiro. As crianças correriam pelo imenso terreno da fazenda, jogavam bola e se penduravam nas árvores. Num primeiro momento tive que conversar com muita gente no início da festa pela manhã. Meu pai tinha o prazer de me apresentar para alguns familiares e amigos que não me viam por algum tempo. Eu apenas sorria para que aquilo acabasse logo.
— Como ele cresceu, Cornélio!
— Meu menino virou um homem, tia Carmélia! — respondeu ele, emocionado, já um pouco bêbado.
O barulho desconcentraria qualquer coisa que eu tentasse fazer naquele momento, então eu preferi aproveitar o tempo que restara com Edite. Eu e ela estávamos um pouco longe dali, da farra, numa sombra perto do lago, alimentando os patos com bolo. Eu não sabia se podia dar bolo a eles, mas o tédio era tanto que qualquer movimento que eu fizesse já seria algo libertador.
— Eu vou sentir saudade disso. — virou a cabeça para mim, me fitando. — Muita.
— Eu também. — segurei sua mão.
— Por que você não os chama para vir esta noite? Eu ouvi sua pai dizer que iria sair.
— Quem?
— Você sabe quem.
Por um momento eu me dei conta que eu estava esquecendo de Antônio e Branca naquela altura, mas eu pensava que depois que Edite fosse embora eu retomaria a atenção à eles e poderia continuar com aquilo.
— Você sabe andar de bicicleta? — perguntou ela.
Sim, eu sabia, e quando eu me dei de conta, tínhamos roubado uma bicicleta de um dos funcionários do meu pai, devolveríamos depois. Saímos, de fino, pela porteira principal. Eu me senti como Antônio e Branca na bicicleta vermelha dele naquela estrada. Edite era leve, então pilotar não foi difícil. Ela ria na estrada, com suas mãos levantadas, deixando que o vento as levassem. Fomos até a casa de Antônio, chamamos, mas ninguém apareceu, então fomos para os fundos, onde ficava a oficina, e ele estava lá.
— Olha quem apareceu. Lembrou que eu existo? — disse ele, aparentemente chateado.
— Me desculpa. Meu pai esteve em casa esses dias, eu disse a vocês. Hoje é aniversário dele e está tendo farra. Conseguimos sair por pouco.
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Adágio
RomanceA novela retrata os sentimentos do jovem Genésio em meio ao caos do ambiente que vive e ao da sua mente. Sempre no seu limite, ele tenta amar, porém quando esse amor não é suficiente se torna perigoso, levando-o à infelicidade, seu próprio desdém e...