Capítulo 2

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POV: Nico - no banheiro 

CW// drogas

  Faço uma pequena concha com as mãos, levo a água da torneira até o rosto e esfrego com vontade. Meu verão não foi muito diferente dos quatro anteriores. Ir com a minha mãe cada dia em uma clínica de reabilitação diferente pra ver qual iria aceitar minha irmã Bianca, depois que ela foi expulsa da ultima está sendo mais difícil do que o normal. As vezes eu acho que ela não quer se livrar de tudo isso. 

  Ah, ia esquecendo, tirei minha carteira de motorista, era o que eu mais queria desde que tinha 12 anos, achei que iria poder ser livre e não depender de ninguém. Estava totalmente enganado. Meus pais me deram um HB 20 novo, (ok, isso foi até que legal da parte deles, assim posso usar o dinheiro que estava guardando para a faculdade) mas com uma condição: levar Bianca para onde ela precisasse ir.

  Eu sabia que alguma dia eu iria virar a babá da minha irmã drogada, mas não sabia que seria tão cedo.

  Sinto o cheiro de panquecas queimando, mas não ligo muito. Normalmente tento não me importar muito com as coisas pra não entrar em um colapso nervoso antes de fazer dezoito anos pelo menos.

  BAM BAM BAM

  - Morreu ai dentro seu merdinha? - Era Bianca berrando, quase derrubando a porta trancada do banheiro.

  - Já estou saindo - sequei o rosto o mais rápido que consegui. Abri a porta e desci as escadas tentando não fazer contato visual. O cheiro de maconha que senti quando passei por ela me deixou um pouco tonto.

  Minha mãe estava arrumando a mesa, e meu pai, como sempre, não tirava os olhos do celular, dei um bom dia, mas não recebi respostas. Fui até o armário e peguei uma tigela pra colocar o cereal.

  - Vai precisar que eu leve Bianca hoje? Vou ter que sair mais cedo, Jason me perguntou se eu poderia dar carona pra ele - sentei do lado da mesa oposto ao que meu pai estava.

  - Receio que sim querido, tenho que ajudar seu pai a resolver umas coisas da empresa - ela colocou o leite e umas panquecas no centro da mesa enquanto Bianca descia as escadas

  Percebi que o cabelo de Bianca ficara mais longo desde o ultimo semestre e ela também não o penteava fazia tempo, percebi também que não prestava atenção nela fazia séculos. Ela estava com uma expressão desolada, como se um pedaço dela tivesse sumido. Como se ali só tivesse seu corpo e nada mais.

  - Mãe, estava pensando se eu poderia... não ir na escola hoje.

  - É o seu ultimo ano Bianca, você não vai perder o primeiro dia.

  - Você decide, ou eu vou hoje ou amanhã - pegou três panquecas de uma vez agressivamente.

  Minha mãe olhou fixamente para meu pai, mas ele estava ocupado demais digitando que nem percebeu, só deu mais um gole em sua xícara de café e suspirou.

  - Vai ajudar aqui ou está ocupado demais para se preocupar com a família, Hades?

  - Escute a sua mãe, você tem que ir à escola - falou meu pai sem tirar os olhos do celular.

  - Sério? Só isso que você vai dizer? - ela revirou os olhos cruzando os braços.

  - O que quer que eu diga? Ela não vai escutar - desligou o celular e o colocou na mesa - olha para ela. Ela já não está escutando. Deve estar chapada.

  - Ela com certeza está chapada.

  Não achei que tivesse murmurado isso tão alto, mas depois que vi Bianca me fulminando com o olhar e minha mãe com cara de desgosto me encarando, gostaria que nunca nem tivesse dito nada. Ela levantou batendo as mãos na mesa e eu fiz o mesmo.

  - Vai se foder.

 - Vai você se foder!

  Minha mãe levantou também. Ótimo, mais um dia normal na casa dos di Angelo, e uma ótima maneira de começar o ano letivo. Por que não começávamos uma guerra de comida também pra fechar a manhã com chave de ouro? As brigas estavam ficando cada vez mais frequentes, e eu estava começando a me acostumar. Isso me assustava.

  - Eu não preciso de você atazanando seu irmão agora Nico. Isso não é nada construtivo.

   A fitei com indignação, ele causa todo o transtorno e eu ainda saio como o vilão. Abri a boca pra falar como aquilo era injusto, mas simplesmente suspirei e me sentei novamente cruzando os braços. Não valia a pena. Depois a gente sempre vai fingir que tá tudo bem mesmo, todo mundo mentindo pra todo mundo na maior cara de pau.

  - Você só pode estar de brincadeira comigo - falei abaixando a cabeça pra colocar suco de laranja no copo.

  - Além disso ela não está chapada - silêncio - Você está?! Eu não quero que vá pra escola chapada Bianca! Já conversamos sobre isso.

  - Perfeito, então eu não vou! - disse ela pegando a mochila e subindo as escadas - Obrigada mãe!

  Meu pai pegou o celular e voltou a olhar os e-mails, minha mãe suspirou e começou a recolher a louça. Ninguém disse mais nada por um tempo. Eu odeio tudo isso, ainda mais por saber que tudo isso é culpa da idiota da minha irmã. Ela nem se esforça pra fazer as coisas direito, não está nem ai, é uma puta de uma egoísta isso sim. Nos últimos anos nós viramos nossas vidas de cabeça para baixo pra tentar ajudar ela com os problemas com droga. Ela não agradeceu nem uma vez.

  - A Interestadual já está congestionada, vamos ter que sair mais cedo do que o planejado se quisermos chegar na ferrovia no horário Maria- falou meu pai quebrando o gelo.

  Percebi que até agora não consegui comer meu cereal, nem sei se ainda estava com apetite suficiente, mas também não estava com vontade de jogar a comida no lixo. Então peguei a caixa de leite, mas estava vazia.

  - Bianca acabou com o leite! - ia começar a perguntar pra minha mãe porque que ela havia trago a caixa de leite vazia para a mesa, mas ouvi ela choramingar enquanto lavava os pratos.

  Minha mãe também não estava nada bem, parece que sempre que Bianca tinha uma recaída ela caia mais fundo, seja lá onde ela estiver em seus pensamentos. Não sei como ajudar, e isso me assusta. Apenas me levantei e coloquei a tigela na pia (agora sim eu estava totalmente sem apetite) subi para pegar a chave do carro, Jason já deveria estar me esperando.

  - Se Bianca não estiver pronta vou sem ela! - gritei.



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