Ainda te (ch)amo

Só confusão

Ao chegarmos em casa Lúcia apenas falou para que eu não contasse para meu pai ainda, e completou falando que depois que assimilasse tudo aquilo falaria com ele. Fomos para a cozinha fazer alguma coisa pra comer, fiquei com medo dela perto do fogão porque estava pálida ainda. Achei estranho aquele sintoma da gravidez ser tão forte. Fiz um macarrão bem básico e carne picada. Coloquei pra ela e para mim, me sentei e ela disse:
-Tem certeza que está tudo bem? Você tem o direito de ficar bravo, eu acho...
-Tenho tia, mas vamos falar pro meu pai quando? Ele era doido pra ter uma menina, e agora ele pode.
-Alex, eu já perdi três bebês já. Esse acho que não vai ser diferente. Já perdi um do seu pai e dois do meu ex. Quando contei pro seu pai que havia perdido a gravidez ele ficou arrasado. Quero esperar mais um pouco para ver se essa vai ser diferente.
-Meu Deus! Pode deixar que não vou contar pra ele.
Eu, ateu, uso muitas gírias cristãs ou coisa do tipo. É muito irônico as vezes até. Querendo quebrar o gelo eu disse:
-Tenho um colega aqui. Na verdade em Unamar. Conheci ele tem uns dias por um jogo.
-Que ótimo! Falando em amigos, Júlia ainda me odeia?
-Um pouco... - eu disse rindo.
-Mas esse seu colega, é a pessoa que você gosta?
-Não gosto de ninguém tia, pelo menos acho que até agora não.
-Se for em Unamar esses dias, marca de ver ele. É bom ter um amigo por aqui, pra ir na praia com algum companhia.
-Verdade. Mas tenho medo que ele seja um velho de sessenta e sete anos pedofilo.
Após eu falar isso me lembrei do senhor lá no posto de gasolina. Aquele ser misógino. Tinha me esquecido daquele acontecido. Mas não liguei muito. Muitas mulheres sofrem com isso por anos, comigo foi a primeira e JURAVA que seria a última vez. Me lembrar disso me fez ter mais medo de sair com ele. Sejamos sinceros, conheci ele à pouco tempo pra sair assim "do nada".
Terminamos de comer e ela falou que iria lavar os pratos e me mandou ir comprar um açaí com tudo que tínhamos direito. Peguei meu celular o dinheiro com ela, e fui. Ao trancar o portão liguei para a Júlia e ela atendeu depois de muito tempo e disse:
-O que aconteceu? Você não me liga se não for urgente e no meio da aula de história deve ser mais urgente do que penso.
-Eita, você tá em aula? Desculpa amiga, mais tarde te ligo então... Beijos.
-Nossa uma hora dessa eu infarto. Não me liga mais na aula, tô trancada no banheiro por sua culpa. Vou voltar pra aula da Letícia, tchau.
-Letícia? Manda um beijo pra ela e diz que se eu tirar mais uma nota baixa em história por causa que errei a data que alguém descobriu alguma coisa, eu me mato.
Ela disse rindo um "tá bom" e desligou. Cheguei no açaí pedi os dois e me sentei na espera do açaí. Me chamaram no caixa, paguei e na porta do açaí vejo meu celular vibrando no bolso, pensei: "deve ser a Júlia me ligando depois de ser expulsa da sala de aula por ficar muito tempo no banheiro". Mas não era. Era meu pai. Atendi e ele disse:
-Onde vocês estão? Tô no portão aqui de casa e ninguém abre.
-UÉ! Eu tô no açaí, Lúcia tá aí. Ela passou um pouco mal, deve estar deitada. Já já chego aí pra abrir.
Chegando no portão, abri, eu e meu pai entramos. Puxei um assunto meio aleatório mas não deu em nada. Perguntei quando chegaria a mesa e ele disse que chegaria no outro dia de manhã. Entramos, fui direto procurar Lúcia, ela tava saindo do banheiro perguntei se ela estava bem, ela respondendo:
-Sim. Até agora sim. Não contou pra ele, né?
-Não, mas disse que você tinha passado mal sem querer.
-Isso não tem problema, vou falar que foi cólica.
-Ok. Qualquer coisa fala comigo. Tô indo pro quarto escolher os livros.
Saí e peguei o computador do meu pai e fui escolher os livros. Depois que entrei no site, meu celular tocou. Era Pedro e Júlia em uma chamada de vídeo. Atendi e falei pra eles que estava escolhendo uns livros e comecei a puxar assunto. Apoiei o telefone no computador e ficamos horas em ligação, falando coisas aleatórias e rindo. Pedro falou:
-Vocês escutam MBP ou Pop? Um cantor lançou uma música nova, vocês podiam dar stream?
Respondi:
-Você tá falando do Jão? Porque se estiver falando, eu e você vamos nos casar essa semana ainda...
-SIM! Nosso casamento pode ter pão de mel? Por favor, diz que sim.
Rimos e a Júlia disse:
-Meu casal! Preciso que vocês se casem pra me dar dois sobrinhos.
Ele riu e disse que ia desligar. Nos despedimos e após ele desligar ela disse:
-Você gosta dele! Aceita.
-Pior que acho que tenho uma quedinha por ele.
-Sabia!! Amém deus! Obrigado por me dar um melhor amigo do vale.
-Tô pensando em ir para a praia essa semana e chamar ele. Mas sem segundas intenções.
-Alex eu sei que você não é tarado. Na verdade você nem sabe se gosta realmente de homem. Espera mais um pouco.
-Verdade. Vai que é só ele.
Mudei de assunto e falei que ia desligar. Fui na cozinha, chegando lá meu pai estava com a cabeça baixa e parecia triste. Sentei e perguntei o que estava acontecendo ele, ele meio que chorando disse:
-Sua tia está grávida. Sei que você sabe não finja surpresa. Eu descobri pois fui ao hospital pra pegar meus remédios, e descobri que ela já tinha ido lá, e passado pela emergência. Não quero que tenha pena de mim, apenas me diz o motivo dela não ter me contado. Você conhece ela mais que eu, ou pelo menos conhecia.
-Eu não tinha o direito de ter falado isso. É sobre ela. Sobre o corpo dela. E ela me contou que perdeu algumas vezes. Eu não podia contar isso. Desculpa.
-Nossa, sou seu pai. Tinha o direito de saber por ela ou pelo menos por você. Ela tá grávida de um filho que é meu também. Eu tenho direito de saber do meu filho.
-Mas ela só queria esperar um pouco, o que tem demais nisso? Só queria ter segurança pra poder te contar. Sei que o filho também é seu, mas quem está gerando ele, é ela. Ela tem mais direito de "esconder" isso de você, do que você querer saber algo que ela não queria que soubesse. Entende?
-Não. Não entendo. Sou seu pai e pode estar grávida do seu irmão ou irmã. Você tinha a obrigação de contar. -disse ele levantando da mesa bravo. Eu levantei da mesa também e disse sem pensar:
-Sério? Quer falar de quem esconde coisas? Ponha em pauta a sua saída da minha vida e seu relacionamento secreto com ela durante quatro anos! QUATRO ANOS! Ela estava errada nessa história também, porém, você estava mais ainda. Ela era solteira, mas você era casado. CASADO! Deixou seu filho que você diz amar tanto e sua ex esposa por alguém que você nem sabia se iria dar certo.
-O ASSUNTO NÃO É ESSE ALEX! NÃO É ESSE.
-MAS EU QUERO QUE SEJA! NUNCA PUDE DIZER O QUE QUERIA PRA VOSSA MAJESTADE POR CAUSA DA MINHA MÃE. MAS AGORA ELA ESTÁ LONGE ENTÃO POSSO FALAR O QUANTO QUISER.
Após toda essa gritaria, Lúcia entrou na cozinha e começou a perguntar o que estava acontecendo eu respondi:
-Pergunta pro teu marido aí. Ele descobriu que você está grávida. Não contei, o senhor FBI descobriu sozinho.
-VOCÊ TÁ MALUCO? NÃO FALE ASSIM COMIGO. SOU SEU PAI.
-SE FOSSE MESMO NÃO TERIA SUMIDO POR UM ANO. SE REALMENTE FOSSE MANDARIA UM "OI" UMA VEZ POR MÊS OU DE SEIS EM SEIS MESES. VOCÊ PERDEU TODO O DIREITO DE SER CHAMADO DE PAI QUANDO ME LARGOU E LARGOU MINHA MÃE.
-Espera! Você acha que seu pai parou de falar com você por conta própria? Seu pai ligava quase sempre, sua mãe que não deixava ele falar com você. Sua mãe não é a Santa que você tanto venera. -disse Lúcia em um tom de indignação.
-HAHAHA! Não fale da minha mãe querida! Você é pior que ela mil vezes mais.
-Alex, desculpa mas não tenho que discutir minha vida pessoal com você.
-Pois é Lúcia, verdade é sua vida pessoal e não deveria discutir sobre comigo e sim com seu marido. Se tivesse falado com ele não estaríamos discutindo sobre quem é o ser mais deplorável dessa família.
-Alex, não fale isso da nossa família.- Disse meu pai.
-Quer saber? Cansei de vocês dois. Fiquem aí casal perfeito. Vou pro quarto e amanhã vou sair bem cedo e só vou chegar de noite. Boa noite, durmam com deus.
O que foi leitor? Sou ateu, porém educado. Fui para o quarto com muita raiva. Sei que fui um pouco grosso com meu pai. Mas tinha anos que queria falar aquilo.
Peguei meu celular e abri as mensagens e mandei para o Pedro:
"Vou em Barra de São João amanhã, quer ir comigo?"
Não deu nem dez segundos e tive a resposta.
"Sim. Que horas?"
"Umas 9:00 Tô saindo daqui. Tá bom pra ti?"
"Ok, pode ser. Leva lanche que levo bebida e protetor solar."
"Fechado. Biscoitos e uns quatro sanduíches tá bom?"
"Bom até d+. As 9:30 já devo estar lá. A praia da igreja?"
"Sim. Lá mesmo. Te encontro de frente a igreja."
"Ok, até amanhã amigo."
"Até"
Na hora vi a burrada que inventei no impulso. Liguei pra Júlia e disse logo quando ela atendeu:
-Acho que marquei um encontro amanhã.
-OI? Como assim garoto?
-Marquei de sair com o Pedro amanhã. Teve uma confusão aqui e não vai ser bom ficar aqui amanhã.
-Vish, tu tá lascado. Será que ele acha que é um encontro ou você tá muito emocionado?
-Pode ser um ou o outro. Mas se for um encontro mesmo, o que eu faço? Nem sei se gosto de garotos mesmo...
-Se acalma cão. Faz assim, vai amanhã só por amizade mesmo, se ele quiser algo à mais você vai perceber. Ele vai ficar olhando pra você e rindo atoa, ficar te admirando e etc.
-Ok. Por acaso minha mãe te ligou hoje ou mandou mensagem? Ela tá levando a sério esse SPA.
-Não, mas ela deve estar bem. Se estivesse triste ou algo do tipo já teria falado e metido o pé de lá.
-Verdade, verdade. Enfim, vou desligar. Vou tomar banho e assistir "the big bang theory". Beijo te amo.
-Beijo, te amo. Cuidado, assim que sair me manda mensagem.
-Pode deixar.
Desliguei, fui tomar banho. Ao chegar no banheiro percebi que meu olho ainda estava amarelado. Fiquei meio com vergonha de aparecer com ele amanhã daquele jeito. Tomei meu banho me deitei. Mas você sabe que eu não tenho um minuto de paz, não é leitor?
Quando deitei, meu pai entrou no quarto e disse:
-Não tá fazendo nada de estranho não, né?
-Não, credo.
-Me desculpa por mais cedo. Falei tudo no calor do momento. Sinto muito.
-Te desculpo. Me desculpa também por falar que o senhor não era meu pai. Desculpa mesmo.
-Sem problemas. Sei que você não queria falar aquilo.
-Sim, Eu realmente não queria falar aquilo. -falei isso, porém com uma tristeza porque eu realmente queria falar aquilo.
-Então, amanhã você vai sair sozinho?
-Não. Vou com um amigo pra praia de Barra de São João.
-Que bom! Quando sair me avisa. Se quiser levar o meu cartão, pode levar, só não compra muita coisa.
-Ok. Beijo, vou dormir pai. Até amanhã.
-Até.
Quando ele saiu me deitei na cama e coloquei Cecília pra tocar no celular e me aprofundei pensando no Pedro.
Sabe quando você gosta tanto de uma pessoa que seu coração pula igual pessoas em bloco de carnaval? Eu senti isso. Me sentia flutuando. Me sentia com borboletas na barriga por uma pessoa que nem tinha conhecido ainda.
Nunca teria imaginado que alguém poderia me fazer ficar tão feliz apenas com um simples "Ok. Até amanhã".