Dia Exaustivo

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    - Mas... – Falei dando uma pausa. – Por que você disse que ele mora no Texas?

    - Bom... A mãe de Lucca disse que não queria que ninguém soubesse da situação financeira deles, e falou que se alguém perguntasse alguma coisa sobre onde eles moram, era para falar que eles moram em outro estado. Eu não sei por que eu falei Texas, foi o primeiro estado que me veio à mente.

    - Mas como aconteceu o assédio, como Ivy ficou depois disso? – Perguntou Dave preocupado.

    - Lucca não me deu muitos detalhas, mas disse que o velho rico agarrou Ivy. – Respondeu Nate e eu e Dave nos entreolhamos. – E obviamente Ivy não ficou nem um pouco bem, mas quando ela ver a assinatura do Lucca na “obra de arte” que fizemos, não duvido que vai brotar um sorriso no rosto dela.

    - Calma... O que você disse?

    - Lucca escreveu seu nome antes de terminar de pichar a mansão, para que quando Ivy passasse pela rua, e visse a casa do velho, avistasse o nome de Lucca. Assim ela saberia que ele fez aquilo por ela.

    - Como ela vai ficar feliz por causa de uma pichação? Isso é sério? – Perguntou Dave inconformado. – Só uma pichação não adianta, tem que ser feito justiça. Vocês tinham que denunciar esse caso. Percebi tinha câmeras de segurança pelos postes de luz, está tudo filmado!

    - Lucca até faria isso, mas se esse caso for para a justiça, em quem vocês acham que eles vão acreditar? Numa garota em apuros, pobre com menos de 12 anos de idade, ou num homem velho e bem sucedido? – Perguntou Nate justificando a ação de Lucca. – Eles sairiam perdendo esse caso, sem contar que Lucca percebeu que Ivy ficou com vergonha depois que isso aconteceu, então com seus pais sabendo do caso, ela teria mais vergonha ainda. Por isso resolvemos pichar a casa do velho, foi a única coisa que pudemos fazer.

    - Mas por que ela teria vergonha? A culpa não foi dela.

    - Exato, a culpa não foi dela, só que as pessoas que sofrem esse tipo de coisa, pelo menos algumas delas, acham que foi culpa delas, sabe? –Perguntou Nate e eu fiz uma expressão de medo. – Esse mundo é muito cruel.

    - Precisamos falar com Lucca, precisamos dar apoio para Ivy, pelo momento horrível que ela está passando. – Falei e Nate se virou para mim, ficando assim, de frente para mim e para Dave.

    - Que parte de “não contar nada a ninguém” vocês não entenderam? Não é para falar nada para ninguém sobre o que aconteceu aqui e agora. Foi por esse motivo que a família de Lucca ficou naquela rua desconhecida, ninguém conhece essa parte do bairro, por isso eles moram lá. Mas vocês não devem contar a ninguém, muito menos irem até lá. Do jeito que o ser humano não aprende com os seus erros, vocês podem ter o azar de também sofrerem a mesma coisa que Ivy sofreu.

    - Mas a frase é “aprendemos com nossos erros”. – Disse Dave e Nate começou a se afastar de nós.

    - Mas esses tipos de ações, na real não são erros, são crimes, e crime não é um erro, crime é um crime. – Respondeu Nate, se aproximando do ponto de ônibus mais próximo.

    “Esses tipos de ações, na real, não são erros, são crimes, e crime não é um erro, crime é um crime”, essa frase que Nate disse, ficou na minha cabeça, nunca pensei que o atleta mimado fosse tão humano, após perceber o que Ivy tinha sofrido.

    Dave me acompanhou até minha casa. No caminho, ficamos num completo silêncio. Chegando a minha casa, Dave resolveu quebrar aquele gelo:

    - Eu queria poder fazer alguma coisa. – Disse Dave e eu levantei as sobrancelhas. – Mas, às vezes tenho um pouco de medo do Nate. Não sei do que ele é capaz, se eu for à casa de Lucca, e Campbell ficar sabendo, ele pode me bater ou alguma coisa assim... Você também às vezes tem um pouco de medo do Nate? – Campbell é o sobrenome do Nate, mas só chama ele assim, quem não tem muita intimidade com ele.

   - O quê? Não, não tenho... Acho que a única pessoa que tem medo dele é você... – Respondi dando uma risada baixinha. – Também queria poder fazer algo, mas se Nate disse que é para manter em segredo, e eu concordei com a ideia, não vou deixar de fazer isso. Vou manter em segredo, sei que pode ser errado, mas também pode ser o certo a se fazer. – Falei me aproximando da porta da minha casa.

    - Mas então, se não fizermos nada, vamos estar ignorando... Eu não vou conseguir dormir sabendo que isso pode acontecer com Ivy novamente ou com outra garota.

    - Não podemos fazer nada, Dave. Eu pelo menos vou ficar na minha...

    - Mas se fizermos isso vamos ignorar completamente o que aconteceu! Não podemos ignorar isso! – Disse Dave, me interrompendo.

    - Eu sei que você está inconformado, Dave. E eu estou também, mas... Não podemos fazer nada.

    - É como se tivéssemos visto o que aconteceu e não termos feito nada, iriamos ignorar do mesmo jeito.

    - Mas não vimos o que aconteceu, então não somos testemunhas de nada.

    - Eu juro que não te entendo, Millie, de verdade... Mas eu vou fazer isso.

    - Fazer o que? – Perguntei preocupada.

    - Eu vou até Lucca e falar tudo que aconteceu hoje!

    - Está ficando doido? Se Nate descobrir vai te matar! Não pensou nessa consequência?

    - Eu não estou nem aí para as consequências, só quero que Ivy e outras garotas fiquem seguras no bairro onde moram.

    - Vai dar um de super-herói agora?

    - Vai ignorar isso?

    - Não estou ignorando, mas Nate disse que não podíamos falar nada a ninguém. Se Lucca perguntar quem te disse isso, que desculpa você vai inventar? “Um passarinho me contou essa história”?

    - Posso usar essa desculpa sim, não é algo impossível de acontecer. – Respondeu Dave com tom de voz sarcástico.

    - Isso é sério? Lucca iria ligar os pontos, ele não é burro. Ele iria ligar o “passarinho” ao Nate, porque ele é o único que sabe disso, ele é a única pessoa à qual Lucca falou sobre o que aconteceu, e assim, eles dois iriam deixar de serem amigos. Você quer estragar a amizade de alguém? – Perguntei e Dave ficou em silêncio. – Ah, sim, foi o que pensei. – Falei, abrindo a porta de casa. – A gente se vê semana que vem.

    - Não finja que nada aconteceu Millie. – Respondeu Dave, se afastando de mim.

    Após essa discursão com Dave, entrei em casa, e minha mãe estava a minha espera:

    - O que foi isso? – Perguntou ela preocupada, se referindo a discursão que tive com Dave.

    - Você ouviu tudo? – Perguntei confusa.

    - Ouvi uma parte da conversa... Vocês estão brigados?

    - Não... Não, foi só uma briga entre amigos, amanhã estará tudo bem – Pelo menos é o que eu espero. – Hoje foi um dia exaustivo, só isso. Quando estamos cansados é normal ficarmos mais irritados. – Completei, subindo para o segundo andar e me trancando no meu quarto.

    Deitei-me na minha cama e fiquei um tempo pensando em tudo que tinha acontecido hoje, na conversa com Nate, na minha discursão com Dave... Acabei pegando no sono depois de pensar nesses acontecimentos.

Meninas Vestem Azul & Meninos Vestem RosaOnde histórias criam vida. Descubra agora