Capítulo 21

352 45 4
                                    

As minhas mãos tremem tanto que não consigo desviar o olhar delas. Não sei em que momento é que a minha perna esquerda começou a tremer também mas é desconcertante de ver. Mais desconcertante ainda é não conseguir parar. Passou meia-hora e ainda não consegui falar mais do que as palavras "Estou bem" até as pessoas desistirem de me perguntar.

Tento desviar o olhar das minhas mãos para tentar entender quem está ao meu redor, mas não consigo. Não quero encarar mais perguntas e por isso fascino-me com um pavor tremendo em ver o meu corpo em convulsão. Azriel trouxe-me até ao escritório de Rhysand, onde estou sentada neste sofá desde que ele o foi procurar. Sei que, no mínimo, mais duas pessoas estão aqui mas não consigo concentrar-me o suficiente para entender quem são, ou para levantar os olhos e simplesmente ver. Estou tão concentrada em mim próprio que não me apercebo quando eles voltam até Az se ajoelhar à minha frente e me agarrar nas mãos. Não consigo parar de tremer e agora, também as mãos dele estremecem ao ritmo da minha perna. Ele não pressiona nem me força a parar, mas aproxima-se mais. Ninguém diz nada ou falam e os meus sentidos estão todos desligados. Azriel aproxima-se tanto que tapa a minha visão das nossas mãos. Quando o encaro, sinto o olhar vazio que lhe lanço e começo a chorar. Não consigo evitar. Não tenho qualquer domínio pelo meu corpo: não controlo quando tremo ou não, não controlo as lágrimas que me deslizam pelos olhos ou até mesmo a concentração para ouvir o que me rodeia. Fecho os olhos com mais força e cerro os punhos, mas nada resulta, tudo continua igual.

- Está tudo bem. – Azriel sussurra e eu percebo que ele estava a falar, antes de eu conseguir prestar atenção. – Abre os olhos, Kate. Por favor. – Um suspiro profundo quando sinto a pressão dele encostar a testa na minha e dizer: - Estou aqui, abre os olhos. Está tudo bem.

Abro os olhos. Tão de repente que é um choque de luz e cores. A minha visão está repleta de água mas consigo encontrar os olhos dele, foco-me nisso e nas mãos dele sobre as minhas. Estou viva. Estou bem. Estou bem. Estou bem. Estou bem. Repito tanta vez que não sei quantos minutos passaram até deixar de tremer – não por completo, não sei se conseguirei deixar de tremer por completo nas próximas horas. Azriel afasta a sua testa da minha, mas continua próximo na mesma. Seguro na mão dele quando digo, por aquilo que acho que deve ser a vigésima vez:

- Estou bem. – Ele não se mexe nem um pouco, talvez por ter dito isto tanta vez que já ninguém acredita. – Az, estou melhor, a sério.

Ele levanta-se da posição ajoelhada mas só para se sentar ao meu lado, deixando-me a visão livre para toda a gente na sala. Rhysand, Cassian, Nestha, Amren, Feyre e até Elain estão no escritório. E todos olham para mim e encolho-me um pouco.

O meu irmão olha para mim e sorri, mas consigo ver o pavor nos seus olhos, não imagino como devo de parecer. Limpo as lágrimas e tento endireitar-me o máximo que posso. Estou bem. Estou bem. Estou bem. O silêncio é ensurdecedor mas é Rhysie que o quebra.

- Kate, o que aconteceu? – O tom é tão querido e meigo que por momentos parecemos de novo crianças e eu estou triste por algo tosco.

Encaro-o, respiro fundo. – Eu não sei, estávamos a treinar com espadas e o Devlon estava a ajudar-me com as indicações e eu perdi-me nos comandos e parei... E... Num momento estava á, no outro estava de volta naquela noite com a mãe em Illyria e... Eu senti, Rhysand, eu senti a espada. Eu senti o sangue no meu peito... - Páro para respirar e Azriel volta a apertar-me a mão. Inspiro e expiro. Novamente. – Foi real, eu... Eu senti tudo.

Estremeço só de pensar. Rhysand fita Cassian e Azriel mas nenhum fala. É Nestha que responde à pergunta silenciosa.

- Ela caiu no chão e começou a gritar. Sombras à volta dela e ela só gritava. Azriel conseguiu entrar nas sombras e passados uns minutos, parou de gritar. – Nestha engole em seco e volta a olhar para mim. – Quando as sombras se foram, ela sangrava pelo nariz e os olhos estavam vermelhos vivos.

Corte de Poeira e SombrasOnde histórias criam vida. Descubra agora