Capítulo 23

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- Aqui não, Kate. Não assim.

As palavras de Azriel continuavam a ricochetear na minha mente ao fim de quatro dias. Quatro dias sem o ver, a evitar todos os assuntos e a criar novas situações de máxima urgência que requisitavam a minha presença e que, estranhamente, coincidiam com todos os treinos em que Az me costumava acompanhar. A mais nova urgência: Cassian queria um smoking todo, ênfase no todo, preto, sem qualquer tipo de cor para a tão acalmada Queda Das Estrelas. Embora me sentisse vitoriosa por convence-lo ao fim de quase duas idas intensas a lojas illyrianas de que couro illyriano não era - de todo! - uma boa escolha para aquela noite, o facto de ele não colaborar no mínimo, em vestir algum tipo de camisa claro, nem que fosse cinza, estava a levar tudo de mim.

- Não entendo qual é a tua aversão a preto. - Ele voltou a afirmar quando lhe estendi um novo smoking com acabamentos azuis escuros. - Azul não é a minha cor.

Revirei os olhos e quase que tive uma visão total do meu cérebro.

- Cass, adoro-te mas se não queres nenhuma sugestão minha porque é que me pediste ajuda? - Era a milésima vez que perguntava e ele respondia-me sempre com um encolher de ombros.

- Boa pergunta. Se formos a ver bem escolheste o illyriano menos bonito.

E la estava. O súbito lembrete sobre Az. Não sei o que Cass sabia nem até onde a minha rejeição era do seu conhecimento e não me atrevia a perguntar nem que me pagassem. Durante os últimos dias ele acabava sempre por voltar a tocar no assunto para provavelmente estudar a minha reação ou, simplesmente, porque gostava de me irritar. Não sei. Ignorando Cassian, voltei a afundar em pensamentos e sentimentos.

As tardes que passava com Azriel tinham tornado o meu retorno muito mais fácil e todos os nossos encontros na taberna eram a melhor parte dos meus dias. Sentia a falta dele mas não podia considerar a possibilidade de me continuar a iludir quando, nitidamente, os meus sentimentos não eram recíprocos. Ele rejeitou-me quando eu, finalmente, estava disposta a abrir o meu coração para ele.

Uma risada tirou-me do transe.

- Estavas a pensar nele, não era? E não ouviste uma única palavra do que eu disse. - Ele fez uma pausa para rir ainda mais. - lindo. Totalmente lindo.

Fiz uma careta e tentei mudar de assunto não de uma forma tão subtil como pretendia.

- E se fosse uma camisa branca com um casaco e calça preta? Talvez pudesses colocar uma gravata da cor do vestido da nestha, não há coisa mais lamechas que essa.

O rosto de Cassian iluminou-se como se tudo no seu mundo se alinhasse - o que honestamente poderia ser verdade considerando o quão fácil era deixá-lo feliz: mencionar Nestha.

- Isso parece-me bem. Descobre a cor do vestido dela e eu visto a tal camisa branca que gostas tanto.

- Pergunta tu, Cass. Sabes, moram juntos não é verdade?

- Sim senhora. Mas ela não me conta nada. - Ele olhou para mim e um sorriso se formou na cara dele. - Porque não vens jantar connosco hoje à noite? Vocês mal se conhecem e acho mesmo que se iam dar bem.

Uma vontade enorme de esperar o meu punho na cara dele invadiu-me. As vezes não sei se ele faz de propósito ou se apenas é tão alheio à vida dos outros que me faz comichão. Nestha e eu nunca seríamos amigas. Ela odiava-me - era quase palpável nos últimos dias e eu suspeitava que tinha algo a ver com Gwyn - a sua melhor amiga e também amante de Azriel. Amante? Não sei. Mas qualquer envolvimento romântico acontecia entre eles, envolvimento esse que eu estava, totalmente, aquém.

- Ótimo. Espero-te daqui a uma hora ok?

Cassian claramente tomou o meu silêncio como uma espécie de concordância.

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