Open Letter

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Olá. Me perdoe pela ausência. Esses dias foram cinzas para mim, devo admitir. Se estive ausente foi porque não tive forças de escrever, pois sequer tiver forças para pensar no que escrever.

O que gostaria de saber? Imagino que você deva ter algumas dúvidas, que eu talvez não sane agora, mas garanto que um dia você entenderá.

Meu primeiro dia ausente foi depois da festa do Malik, e acho que ele não lidou muito bem com nossa briga, pois decidiu que se vingaria de mim. Como fez isso? Bem, ele contou ao meu pai que me viu saindo de mãos dadas com um garoto da escola. Já parece ruim o suficiente, mas fica pior quando você está ciente de que ele sabia as consequências que esse ato proporcionaria.

Quando cheguei em casa, fui recebido com dois tapas na cara, um de cada lado, seguido de um "viado" tão alto que ecoa em meus ouvidos até agora. "Filho meu não é viado" pra ser mais exato. Isso só por causa de mãos dadas. Tive vontade de responder que de fato, eu preferia não ser seu filho, na verdade eu preferia sequer ter nascido. O que doeu não foi necessariamente o tapa, mas as palavras que tive que ouvir. Saber que você causa nojo à uma pessoa não é uma das notícias mais agradáveis que você pode receber.

"Ser nojento é apenas quando você dá as mãos pra um homem, ou também quando toca em alguém sem permissão?" - Me arrependo de ter dito, pois tenho três roxos espalhados pelo meu abdômen por reflexo de falas mal pensadas.

Eu subi pro meu quarto devastado, me enfiei debaixo do chuveiro e me permiti sangrar, a água levaria ralo abaixo, de qualquer forma. Tive vontade de arrancar minha pele fora e vestir uma nova sem machucados. Eu queria apenas gritar quando vi que a maçaneta estava sendo forçada enquanto eu chorava nu no box. Por Deus, não foi preciso.

O anúncio da viagem me foi prazeroso de ouvir - Mesmo com medo de mamãe ficar sozinha com ele.

Eu sabia que meus hematomas seriam facilmente curados pelas mãozinhas apaixonadas de Louis, mãos essas que aparentemente me tornavam um pecador. Pode ter certeza de que eu adorava pecar, mas o que eu mais precisava naquele momento era de apoio divino.

Eu estava sóbrio, pela primeira vez em muito tempo, e foi meu primeiro dia sofrendo nesse nível, em muito tempo.

Naquele dia na casa de Louis eu o fiz fazer coisas que tive medo de traumatizá-lo. Mas eu precisava buscar uma forma de acabar com aquela dor. E fiz errado: A empurrei pra ele.

Eu fiquei imprestável. Entupi minhas veias de álcool, de bebidas que eu mal poderia pronunciar o nome, totalmente sozinho em casa. Vomitei mais do que eu tenho coragem de admitir, e limpei minha garganta com mais álcool em seguida. Se eu não tive uma overdose, foi porque meu anjinho da guarda estava muito empenhando neste dia.

Eu ainda me culparia pelo que fiz na noite que dormi na casa de Louis. Na verdade, eu culpadia o setor do meu cérebro que produz sonhos, ou melhor, memórias. A noite em que perdi a minha inocência há três anos, que eu bloqueei da minha memória por todo esse tempo, e veio à tona por que o destino não perde a oportunidade de me foder um pouquinho. Naquele dia, eu senti o peso das mãos sujas em mim. Senti a dor insuportável, como se me rasgasse, e rasgasse minhas cordas vocais de tanto gritar. E bem, quando eu acordei e senti as mãos de Louis, não as associei com ele, mas sim com o sonho.

Meu corpo nunca foi meu realmente. Foi tomado de mim cedo, e agora, sinto que eu precisava de outro alguém para tomá-lo. Alguém que cuidasse, e quando achei um corpo apaixonado precisando de algo para amar, ofereci o meu. Assim, a dor não seria de fato minha. Migraria provisoriamente para o novo dono, que colocaria curativos nos machucados.

O prazer era consequência. Eu queria pertencer a ele, e queria que tudo que doía em meu corpo fosse apenas isso: dor física. Minha alma não tem culpa de nada.

Mas às vezes, eu sequer visava o prazer. O tesão é uma descarga muito alta de serotonina no cérebro, e te força a sentir alguma coisa, qualquer coisa, por algum tempo. E era disso que eu precisava.

É difícil de entender? Pode ser. Mas estava funcionando, eu estava rendido à uma pessoa. Minha alma estava rendida, e meu corpo por hora pertencia a ele, e por hora, estava envolto a um corpo semelhante ao meu. Carne e osso, pele, pelos, órgãos - incluindo um coração pulsante e dois pulmões cheios de ar; e coincidentemente, genitais masculinas. Poderia ser um problema para alguns, mas para mim era apenas um corpo - lindo, diga-se de passagem - Em que eu descarregava minhas dores, meu amor e todo o meu tesão, de vez em quando.

Era a primeira vez que eu me doava querendo me doar. Compartilhava querendo compartilhar. Foi um processo complicado, visto que eu nunca pude escolher com quem eu compartilharia, pois meu corpo não me pertencia. Fora tomado de mim - três anos atrás.

Exatamente por isso que eu não cortei e rasguei esse corpo e deixei minha alma vazar. Não iria doer em mim, mas sim em outro alguém, que é o lado ruim de amar, principalmente quando a vítima do amor é alguém frágil, porque eu particularmente lido bem com a dor.

Dilemas: Sentir dor é necessariamente ruim? Não. Eu gosto, até. Me chame de masoquista, eu não me importo, mas me importo menos ainda com descargas de dor passageiras.

Beber era outra forma de escapar. "Você está se matando", sim, e está sendo ótimo. Dá uma sensação de adrenalina indescritível, mas não recomendo que você prove. Recomendo que apenas leia meu relato.

Sentir o coração desacelerar e então acelerar com tudo, seu corpo gelar e esquentar, sua pele arder e queimar, suas juntas doerem, davam uma falsa sensação de lembrar que eu tenho um corpo, e que ele deveria pertencer a mim. Deveria.

Uma coisa é fato: Chegar até os 20 anos não é pra todos. Não creio que será pra mim. Mas o tempo corre, e passar essa semana ausente foi um preço a se pagar pelos próximos 3 anos em que pretendo aproveitar ao máximo. Ou pode ser que eu viva até os 80, deixando essa uma semana mais insignificante ainda.

Quando eu disse sobre luto, eu não menti em nada. Você já ouviu falar dos 5 estágios do luto?

O primeiro estágio é a negação e o isolamento. Ou seja, não se conformar que alguém partiu, e se isolar, por consequência. E bem, eu parti. O segundo estágio é a raiva, talvez o mais presente na minha vida. O terceiro estágio é a barganha - Que era o que estava fazendo: Trocas. Me doar, e receber em troca. O quarto estágio é a depressão - muito presente, inclusive, ainda sonho com o dia que sairei dela, e infelizmente, também sonho com o dia que a ganhei. E penso quem matará o outro primeiro, eu ou ela. O quinto e último estágio é a aceitação. Quando você não liga mais. Apenas aceita: Se foi. Eu fui. Eu parti. Na verdade, eu estou aqui. Um novo eu, um novo Harry. A dor da perda às vezes é positiva. Às vezes mudanças são necessárias. Eu aceitei isso. Eu estive passando por todas as fases do luto, e superei.

Você pode fingir que não leu isso daqui pra frente, até porque, não tem mais motivo para isso. Eu disse que estou melhor, não disse? Na verdade, é o que eu quero que você faça, supere também, por favor.

Ficaremos bem, não ficaremos?

Enemies - Fanfic LarryOnde histórias criam vida. Descubra agora