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Vinícius conseguiu o celular do pai dele. Do nosso. Eu pesquisei uma coisa no Google quando Vini foi beber água. Foi rápido, meu coração batia acelerado por ter o celular de Ailton nas minhas mãos tão de repente. Mas pesquisei sobre Wilde. A primeira coisa - e a única que consegui ver - foi uma frase dele que escrevi na agenda. Vinícius chegou logo depois da frase aparecer e pediu o celular de volta, e eu dei.

A frase é: Viver é a coisa mais rara do mundo. A maioria das pessoas apenas existe.

Nunca pensei que fosse ler tanta verdade em uma frase só. No começo pensei que viver e existir eram a mesma coisa, são sinônimos, não são? Então a frase apareceu e disse, na-na-ni-na-não, presta atenção! Que loucura lembrar das aulas de português agora. Mas é isso mesmo. Viver e existir são como obrigação e diversão, se você pensar bem.

Sábado. O que eu fazia no sábado no orfanato? Simples. Fazia as mesmas coisas que na segunda, terça, quarta, quinta e sexta. Tirando as aulas. Mas agora ainda estou deitado e já são 10:30h. A casa está silenciosa há essa hora. Todos ainda dormem.

Fico encarando a tela do meu relógio que não é de ponteiro, graças a Deus. Faço uma nota mental das coisas que tenho que fazer hoje e chego a conclusão que só preciso varrer a casa já que Roberta e Ailton estão em casa comigo. Será que será um daqueles finais de semana familiar? Podemos ir à algum lugar especial ou só ficar no sofá assistindo a algum filme besta. Seria interessante ficar no sofá com eles, olhá-los e pensar: essa é a minha família.

***

Ailton saiu. Roberta está concentrada em alguma coisa no próprio celular. Algumas vezes ela dá risada, outras vezes fica séria. Vinícius me chamou para brincar com ele, aproveitei o momento para reforçar que ele não podia contar aos nossos pais que ontem eu o deixei esperando do lado de fora.

— Não vou contar. Prometo de mindinho. Aonde vocês foram? Posso ir da próxima vez?

Contei só o que achei necessário contar.

Brincamos com os brinquedos de pirata de novo, ele me deu as opções de escolher entre o tubarão e o pirata de novo e escolhi o que ele queria que eu escolhesse. Passamos horas brincando, passamos horas rindo enquanto eu desmontava aquela ideia de momento família feliz. O momento ainda não aconteceu; mas esse momento com Vinícius é melhor do que qualquer coisa.

Tomei banho antes de almoçar. A água foi boa e ajudou a clarear alguns pensamentos. Lembrei do sonho que tive à noite que foi com Saulo e Pentelhos. Os dois discutiam quase agressivamente e eu estava observando tudo até saber que a discussão era por minha causa. Ao entrar no meu quarto com a toalha na cintura e cabelos molhados tomei o maior susto quando vi Saulo sentado na minha cama. Abafei um grito cobrindo a boca com a mão e com a outra segurei a toalha para um acidente que me mataria de vergonha não acontecer. Minhas costas e pés tiveram o dever de fechar a porta e me apoiar nela.

— Oi, Rapunzel.

— Saulo... Que droga! Como você conseguiu... Você pulou a janela de novo?

- Pulei. E agora você vai ter que trocar de roupa na minha frente não é? — É loucura minha pensar que ele está ansioso por esse momento.

As pessoas não podem estar ansiosas para me verem trocar de roupa, porque sinceramente, o que tem demais em um corpo magro e meio nojento? A única coisa que gosto no meu corpo é minha pele negra que é macia.

Pego as roupas que preciso e vou para o banheiro. Não demoro muito porque ainda tenho meu vizinho na cama. E o mais estranho, não dormimos juntos, ele surgiu pela manhã!

Volto ao quarto.

— Que golpe baixo. — Saulo murmurou e deitou na minha cama. Tranquei a porta à chave. Escutar Roberta bufando lá na sala me deixou apreensivo demais para conseguir respirar do jeito certo. A visão de Saulo na minha cama também contribuiu para isso.

Pontos Prateados em um Céu Azul Escuro (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora