Esperei Saulo aquela noite. Ele não veio. Esperei que meus pais aparecessem e de novo, nada. Comecei a suspeitar quantas pessoas estariam no meu lado amanhã, quer dizer, eu poderia morrer amanhã ou depois e quem eu procuraria quando estivesse sentindo que estava me afundando, não no mar, mas em uma droga de poça de lama ou petróleo grudento? Eu iria querer a mão de alguém e por mais que eu tenha fé em Deus, sinto em dizer, não posso deixar a fé me levar para a ilusão. Não posso, é simples. Mas meus relacionamentos tem ficados tão distantes de mim que me pergunto se eram de um meu que assumia o controle enquanto o eu de agora, triste e pensativo, adormecia como aquela princesa amaldiçoada. A folha que dei para meus pais responderem está no meu colo. A primeira pergunta era se eles aprovavam que eu me tornasse escritor. Não dos dois lados, mas Roberta colocou uma carinha feliz piscando. A segunda pergunta era se eles aprovavam que eu namorasse, os dois puseram sim, mas aposto que mudariam de resposta quando eu dissesse quem estou namorado. A terceira e última pergunta era a que eu estava mais ansioso para que eles respondessem.
"Vocês me amariam independente de qualquer coisa? Quaisquer circunstâncias?"
Nos dois lados da folha tinha um sim. Isso foi a única coisa que me fez sorrir.
Me assumi numa terça-feira.
Mostrei a folha para eles e disse com todas as palavras "eu também gosto de meninos" e foi libertador dizer tais palavras. Pelo menos por oito segundos antes que meu pai tentasse me bater. Ailton levantou o punho, furioso demais para que eu pudesse registrar o que estava acontecendo, ele havia ganhado supervelocidade e eu era apenas um mero humano medroso. Entretanto, não me bateu. Seu punho ficou erguido por menos de oito segundos e depois ele respirou tão fundo que eu senti que roubou o meu próprio ar. Olhei para minha mãe e o que posso dizer que vi em seus olhos foi medo. Não sabia porque ela estava com medo de mim. Ou seria por mim? Não sei colocar do melhor jeito agora mas... aquilo doeu. Doeu tanto que eu pensei que começaria a chorar porque estraguei meu plano perfeito de ser um filho perfeito, o filho que eles precisavam.
Contei isso tudo a Saulo em tempo recorde. Mas estava tudo bem, o sol nem sequer tinha surgido e estávamos no quarto dele... senti que o meu não era mais o mesmo depois de ter ficado lá por duas horas chorando e me odiando por ter colocado aquelas palavras para fora. Porque não escrevi num papel e depois o joguei na privada? Eu devia ter guardado para mim porque ninguém é obrigado a...
—Tente dormir.
—Não vou conseguir. Eu queria que eles viessem falar comigo.
—Eles virão... Como você se sentiu assim que falou?
—Bem. Muito bem. —Muito mais do que me senti há dias, eu queria dizer.
—É isso que importa, Samuel. Você deveria estar orgulhoso de você por ter se assumido quando poderia ter deixado para depois e depois... Eu admiro sua coragem. Faz tempo que quero dizer isso a você.
—Dizer o quê? —Sussurrei contra sua boca. Eu queria me perder nos lábios dele para fazer o resto do mundo sumir, porque os lábios dele tinham que estar sempre dispostos e rosados? Convidativos, quero dizer.
Porque eu sempre que o olhava queria perguntar se ele queria me beijar? Tinha que perguntar porque vai que não, e se a resposta for não iria morrer de vergonha.
—Dizer o quê? —Repeti.
—É sempre você por você mesmo. Admiro que tenha passado tanto tempo só tendo você para usar como apoio; é sua própria fonte de energia.
—Eu tinha David. Agora tenho você e Gisele e Marcos, eles...
—Quero dizer, seu besta, que sua coragem sempre veio de você. Como uma fonte de energia. Houve dias que você fez algo sem precisar do conselho de alguém, foi lá e fez. Como hoje. Houve dias em que chorou e não buscou ninguém?
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Pontos Prateados em um Céu Azul Escuro (Romance Gay)
RomansaSinopse no primeiro capítulo!