O Acidente - Parte 3

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Minha primeira experiência com a morte foi aos sete anos, quando testemunhei a morte de minha avó materna. Eu estava cuidando dela em seu leito no quarto dos fundos de nossa casa, no geral, parecia tudo bem, ela dormia como um anjo que era. De repente, suas singelas pálpebras enrugadas se ergueram, revelando as escleras repletas de microvasos hemorrágicos e sua pupila miótica, quase que desaparecendo no oceano esverdeado de sua íris. Os músculos de suas costelas carcomidas se estiravam e contraíam abruptamente, ela tentou levar a mão esquerda ao peito e talvez queixasse de um grande desconforto, porém, foi detida por uma tosse sibilante aguda associada a uma baba espumosa roseada.

O som de sua voz se tornava mais fraco a medida que sua boca se enchia de espuma mortal. Antes de virar para mim e fazer um último gesto de despedida, teve seu corpo envergado numa posição de opistótono. Então gemeu como um grunhido suíno ao ter seu pescoço dilacerado pela lâmina da morte, e parou. Permaneceu naquela mesma posição, com o olhar distante e infeliz de uma pobre velha morta sozinha, não podendo se despedir de qualquer um.

Nota do autor: ilustração de opistótono

Naquele momento, me perguntei algo que ainda não passara pela mente

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Naquele momento, me perguntei algo que ainda não passara pela mente. Essa tal de morte, doía? Ninguém havia comentado aquilo comigo. Era possível que depois de tanta dor e misérias enfrentadas na vida, nosso último sopro de existência ainda seria acompanhado de uma agonia sufocante que nos contorceria em espasmos? Será que morrer realmente dói? Quando aquele ônibus capotou e a escuridão tomou conta de mim, eu não senti sequer uma friagem no peito.

...

Não foi um clarão divino ressoado com liras angelicais que senti, mas uma luz amena, por ora fúnebre e bastante fria que desceu sobre os olhos e me fez abri-los. O ônibus havia sumido, juntamente com meus colegas e o motorista.
Queria saber de Aline ou mesmo onde eu estava, mas me senti como acordando de um sono profundo de uma noite mal dormida: confusa, atordoada e impotente. Fiquei estática, deitada em qualquer solo e de olho num céu enublado e coberto por galhos longos e finos que trepavam uns nos outros e formavam uma rede aracnídea, preenchendo a paisagem do que parecia ser uma floresta morta.

Tentei inspirar o ar.
Os movimentos foram os mesmos, mas não pude sentir a corrente aerífera percorrendo minhas vias aéreas, nem mesmo meu coração acelerando ao compasso do medo que me subia o espírito. Essa é a morte? Se sim, que lugar é esse? Inferno ou purgatório? Não poderia ser o Paraíso. Fechei as pálpebras e permaneci aguardando minha mente se estabilizar, e ficaria daquele jeito o tempo que fosse necessário, se não fosse por aquilo.

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