Capítulo 26 - Coroa. Não Editado.

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      Quando eu era criança, tinha pesadelos horríveis. Em maioria, ouvia gritos, via fogo, sangue, como se estivesse em um campo de batalha, ficava paralisada com muito medo de ser atingida pelo o que quer que fosse. Me sentia pequena e insignificante diante o horror. Gritava e não era socorrida. Diversas noites acordei aos berros, o que me resultou em castigos das cuidadoras que me acusavam de perturbação. Embora tenha apanhado muito e sido submetida a castigos pesados, não conseguia controlar.

      Logan, que dormia na cama ao lado, passou a ter o sono mais leve. Certa noite, ele fora mais rápido, tampou minha boca com o fino pano que chamávamos de lençol para abafar o grito estridente. Deu certo. Nunca mais apanhei por acordar o orfanato inteiro de madrugada.

      Se tornou algo tão habitual que meu primeiro impulso ao acordar era o abraçar, não mais gritar. Com o tempo, os pesadelos foram se tornando cada vez mais raros, os abraços noturnos de Logan foram se tornando memórias da infância.

      Mas naquele instante, eram tão familiares quanto naquela época. Seus braços, muito mais robustos que antes, me cercavam de modo que me escondiam, meu choro era abafado em seu peito.

     Não demorou para que ele entrasse assim que ouviu o som cortante de meu desespero. Não precisou de explicações para se ajoelhar em meu lado e me abraçar.

      Talvez, tivessem passado apenas alguns minutos, talvez horas. O tempo já não fazia sentindo para mim assim como nada ao redor. Me sentia perturbada demais para me dar conta do que acontecia no espaço. Margareth, sempre fiel, se juntou a nós, acariciava meus cabelos enquanto eu soluçava ruidosamente. Quando enfim consegui coordenar meus movimentos, pois sentia todo o meu ser paralisado até então, erguia com a mão muito trêmula a foto para que Logan visse também.

      Ele suspirou com certo sorriso ao comparar a imagem e eu. Leu o verso e não aparentou surpresa. Era tácito sua reação.

― Você é idêntica a ela ― falou com a voz cheia de doçura. Margareth, ao seu lado que aproveitava para ver mais uma vez a fotografia, concordou com a cabeça.

      Por um instante senti certo orgulho naquilo. Me parecia com minha mãe. Logo as confusões voltaram a me cercar. Eu era idêntica a rainha, o que significava que meu pai... e isso fazia de mim... Tudo voltava a rodopiar com muita força. A brutalidade daquilo me torturava.

― Lua... ― Logan segurou minhas mãos. Pelo tom de sua voz, precisei olhar para ele que por sua vez parecia constrangido. ― Me perdoe.

― Do que está falando? ― Minha voz soou como um leve suspiro, quase ilegível.

― Eu... Desconfiava há certo tempo... ― meu irmão encontrava dificuldades em me encarar. Muito dificilmente ele olhava nos olhos de alguém, naquele dia, isso parecia uma missão impossível ― Meu pai era chefe de guarda, fomos abandonados juntos e todo o resto, sobre o seu casamento, as perguntas que nos eram feitas quando estávamos no cativeiro...

― Por que não me disse nada? ― O nó em minha garganta quase não me permitia falar.

― Tudo o que eu tinha era uma coleção de suspeitas, mas nenhuma prova. Você já parecia tão assustada com tudo, não queria te colocar mais coisas que nem mesmo podiam ser provadas. Eu procurei qualquer coisa, quando tivesse pelo menos qualquer prova que fosse concreta, te contaria, porquê apenas falar sobre parecia tão...

Absurdo ― completei seu raciocínio. Apertei suas mãos como se jamais fosse capaz de solta-las. ― Tudo isso é um grande absurdo. Mas se você me falasse que o céu está roxo, eu acreditaria sem precisar olhar para cima.

      Logan sorriu. O calor que aquilo me irradiava era o bastante para me acalmar. Ele era minha família. Eu podia ser filha de um rei ou um ladrão, mas fora Logan que me acompanhou em meus primeiros passos. Ele era minha família no fim das contas.

A Grande MonarcaOnde histórias criam vida. Descubra agora