CAPÍTULO 30: Evidente - Parte II

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Era como se tudo fosse transformado num abismo que o cercou num segundo.

Tudo estava distante no alto, enquanto a escuridão o envolvia e suas reações desaceleravam com o choque. Ele mal podia sentir a imposição da gravidade sobre seu corpo, ou a pressão do vento, ao cair num vale de memórias obscuras.

Foi transportado para um dia gelado. Nas Tundras Geladas de Dafeng, em seu último ano antes da desertificação total.

E ali, estava com essa mesma sensação. De seu coração estagnado e seu espírito esmagado, tomava conta de seu corpo então humano.

Seus olhos azuis cristalinos se arregalaram e se fixaram num ponto vazio da parede mais próxima, no interior da Torre Vizinha das Estrelas. Os ânimos já estavam bastante cinzentos com a crescente devastação de Dafeng, todo o povo comum da cidade já tendo deixado a região, restando apenas os poucos membros do Clã Dong, um punhado de discípulos, e Yue Chi, isolado em sua torre.

Bem, agora não mais tão isolado.

Naquele momento, duas pessoas o acompanhavam dentro da torre, os semblantes sombrios fracamente iluminados pela luz longínqua do sol pelo teto aberto da torre em pagode. Um homem, e uma mulher. O homem, de vermelho, cabelos castanhos. A mulher, em azul e rosa pastel, cabelos negros. Ambos empunhando leques de kung-fu, e expressões de total seriedade em seus rostos.

"Ma-Zhangmen, Tong-Zhangmen..."

A voz de Yue Chi saía falha de sua garganta, mal podia respirar com um nó grande e apertado ali dentro. Seus dedos envolveram com força o cabo de um de seus sabres, descansando em seu colo, enquanto o outro se apoiava na cadeira.

"... Vocês sabiam disso há muito tempo?"

Os dois líderes de seita se entreolharam por um segundo, e essa foi a única resposta necessária para Yue Chi. Ele soltou outro suspiro, fechando seus olhos e franzindo as sobrancelhas acinzentadas.

"Ele deixou Mestre Tuhai morrer, então?"

"Ao que tudo indica." Ma Lan respondeu, crispando os lábios, e também apertando seus leques próximos ao peito. "Ele foi para me proteger, então tudo parecia apenas um sacrifício nobre... mas havia muito mais por trás."

Yue Chi encolheu seus lábios, as pálpebras claras se apertando, parecia segurar nelas um misto de ódio e tristeza. Ele respondeu com seu timbre sempre gentil, mas sua entonação era desprovida de qualquer sentimento ou familiaridade:

"Eu irei até lá."

"Iremos com você." Ma Lan imediatamente se levantou, o olhar determinado criando longas sombras em suas bochechas com a luz estranha.

"Não. É melhor que eu vá sozinho." Yue Chi retrucou. Seu rosto era como o de uma coruja ferida e ressentida, pronta para enfiar as garras em qualquer um que tentasse perturbar sua paz e recuperação após a tempestade.

Engolindo em seco, pensando no significado das palavras que estava prestes a dizer, Yue Chi acrescentou:

"Um Dong só revelaria suas reais maneiras diante de outro. Eu verei a verdade."

"Mas se nunca revelaram a verdade a você... por que ele revelaria suas reais maneiras agora?" A voz grave e resoluta de Tong ChangKai soou em indagaçãp.

Ele pendeu a cabeça um pouco para o lado, e a trança que tinha apoiada no ombro caiu para trás do encosto da cadeira. Dos três, era o único ainda sentado e totalmente envolvido nas sombras, um reflexo vago de luz delineando um traço ou outro de seu rosto, mas reluzindo principalmente o vermelho de suas vestes e da seda de seu leque.

Coruja Voando Alto [XIANXIA ORIGINAL] {BL & GL}Onde histórias criam vida. Descubra agora