Não sei se isso é normal, mas desde quando eu passei a morar com os meus avós, acordar cedo virou rotina. Não consigo e nem gosto de acordar depois das seis da manhã.
Sempre acordo mais cedo do que deveria e fico pintando enquanto espero a hora de me arrumar para escola.
Sair da minha zona de conforto nunca é fácil, mas pintar pessoas ao invés de paisagens não é tão complicado, só mais demorado. Tive um sonho meio doido hoje, só não consigo me lembrar direito o que estava acontecendo, mas me lembro de um rosto. Algo familiar e diferente ao mesmo tempo, é como se eu conhecesse aquele rosto, mas nunca o tivesse visto.
Então estou desde quando acordei tentando desenhar, com a maior exatidão possível, o rosto que sonhei, o rascunho do formato do rosto já estava pronto, quando voltasse da aula só precisaria pintar e torcer para lembrar de cada detalhe do rosto além dos que estavam no pequeno desenho de rascunho.
— Querida, está quase na hora de ir para escola. Não vai tomar café da manhã? — minha avó aparece na porta do meu quarto e só assim que paro para ver a hora.
— Quase perdi a hora, vó — digo me levantando da mesa correndo para me arrumar — Vai me levar hoje?
— Não, querida. — Sinto ela fazendo uma pausa antes de continuar — Sua mãe está aqui para levá-la a escola.
— O que? — Saio do meu closet rápido com a raiva já subindo pelas minhas veias — O que ela pensa que está fazendo aqui?
— Querida, eu sei que não quer vê-la, mas você não a vê desde setembro do ano passado, no seu aniversário. Sabe que se não falar com ela...
— Ela vai encher a paciência do meu pai — termino a fala da minha avó voltando para terminar de me arrumar.
Não adianta tentar discutir, ela não vai embora até me ver e falar comigo.
Não entendo o porquê dessa insistência dela por me ver sempre que pode, ela nunca se importou ou se preocupou, todas as vezes que fiquei doente ela me deixava de lado até eu ficar péssima de saúde e precisar urgente de um hospital e desde quando vim morar com meu pai, ela nunca nem perguntou se alguma coisa estava faltando para mim, se eu estava bem de saúde, qualquer coisa.
Agora aparece de tempos em tempos se fazendo de mãe perfeita para quem olhasse de fora e sempre faz questão de estar em público quando vem me ver. Pelo menos dessa vez ela não trouxe o babaca do marido dela.
Desço as escadas o mais devagar possível, não me importo se vou me atrasar, quanto menos tempo eu passar na presença dela, melhor.
Chego na sala de estar e lá está ela, sentada no sofá como se fosse bem-vinda aqui.
— Ainda bem — ela diz enquanto se levanta — Sabe que mais dois minutos e estaríamos completamente atrasadas.
— Vou tomar café da manhã, pode esperar lá fora — digo indo para cozinha, mas ela me interrompe aparecendo na minha frente.
— E correr o risco de se atrasar? — ela pergunta enquanto vai até a fruteira que fica na porta da cozinha e pega uma maça — Pode comer isso no caminho.
— Ela precisa comer, Sabrina — interrompe minha avó com a voz de quem não quer ser contrariada.
Elas nunca se deram bem, nem mesmo quando ela, supostamente, era uma boa pessoa. Depois de tudo ter acontecido e eu vir morar aqui, minha avó parou de não gostar dela e começou a sentir um ódio mortal.
— Uma maça é mais do que suficiente. Ela pode comer enquanto conversamos e não se atrasa para escola. — Sabrina já começa a andar em direção a porta com aqueles sapatos de salto que avisam onde ela está — Filha minha não se atrasa para escola, principalmente no primeiro dia de aula.
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Nossa verdade.
RomanceDizem que um segredo nunca é mantido assim por muito tempo. Sempre alguém conta. Por raiva, amor, preocupação ou até maldade pura. Por isso sempre devemos guardar os segredos somente com uma pessoa, nós mesmos. Talia sabia disso mais do que ningu...